terça-feira, 15 de outubro de 2024

Viagens


 


– E aí, Cadelão, novidades?

– Sim. Estou grávido do terceiro filho.

– Kkkkk. Que viagem, maluco!

– Tu não entendeu, Beiço. Estou gestando o terceiro livro.

– E qual vai ser o nome dessa p**ra?

– Pensei num título, e tenho umas 4 dezenas de histórias

que precisam de muita poda, desbaste e replantio,

tu sabe como é.

– Título??

– Ah, talvez VIAGEM A PALERMO.

Só não sei como vou juntar grana

pra botar isso em prática hehehe.

– Simples, Cadelão: investe tudo

nas tuas viagens

imaginárias!

 

(B. B. Palermo)


sábado, 12 de outubro de 2024

Eterno retorno


Eis o mundo real em sua marcha lenta,

pacífica, rimada e bem comportada.

Ele ri e cochicha ao observar

o palerma voltar ao lar de madrugada

flanando pelas ruas como um bailarino bêbado

amparado por umas pernas de pau.

 

 

Confuso, ouço muitas vozes,

às vezes familiares,

às vezes bizarras:

 

“A SALVAÇÃO ESTÀ

EM CUIDAR DO TEU JARDIM.

Não liga pro rosnado dos animais

que riem de ti!

Repara, Cadelão, ferve por todo o lugar

o eterno retorno  – regras planas,

comportamentos carimbados,

todos cópias de outras cópias!

Filhos imitam pais, pais repetem os avós...

E vão sendo costuradas

ridículas árvores

genealógicas”.

 

Saquei a coisa.

Não há salvação se imitarmos uns fanáticos

pichando versículos e provérbios

nos muros e paredes e calçadas.

Não há salvação, mas sim (talvez) um singelo

caminho:

ouvir com sinceridade pequenos budas

que me acariciam como chuva de verão,

lembrando do bom e velho dever de casa:

 

“Fique alerta, Cadelão!

Não perca as rédeas

do teu EU interior!”.

 

(B. B. Palermo) 

quarta-feira, 9 de outubro de 2024

Vendendo sonhos


Na traseira do ônibus da frente,

visualizo a publicidade:

 

“No meu Rio Grande

também se sente só”.

 

Fico espantado, até admirado,

com uma boa sensação.

Mas não pode ser – a publicidade vende sonhos...

Olho de novo:

 

“No meu Rio Grande

NINGUÉM se sente só”.

 

Vida que segue o fluxo.

 

(B. B. Palermo)


terça-feira, 8 de outubro de 2024

Te prepara, irmão

 

De uns tempos para cá, sonhos estranhos

me fazem companhia.

Agoniado, contei pro Beiço, enquanto brindávamos

umas e outras.

– Velho, o sonho que tive noite passada foi sinistro:

um amigo, que partiu desta há um punhado de anos,

me apareceu todo faceiro usando uma daquelas jaquetas (de napa ou de couro? Não faço ideia...) exalando um perfume

de quem não sai do armário faz uma eternidade.

Meu, nossa conversa foi animada, um belo encontro

de amigos que não se viam há anos.

Aí o Beiço, eloquente porque meio embriagado,

ou embriagado porque eloquente, me interrompeu

e relampejou retórica:

– Cadelão, eu admiro as tuas viagens transcendentais – veja bem,

não falei TRANSCENDENTES!

Acho que tu percorre caminhos nunca antes trilhados no universo

e, olha só, pouco importa se entornando um Santo Daime,

chá de cogumelo ou fumando maconha.

De carona com os sonhos, a mente atravessa caminhos fodásticos.

Parabéns! Mas fique ligado, maluco!

– Cara, espera aí. Ainda não terminei de te narrar o sonho.

Falta a parte mais chocante.

No meio do papo com o finado, eu perguntei:

“Que novidades tu traz do outro lado?”

Aí ele se virou pra você, que se aproximou

e se intrometeu na conversa,

e falou:

– Te prepara, irmão, logo tu não estará mais aqui!

 

(B. B. Palermo)


segunda-feira, 7 de outubro de 2024

Mantenha a calma e me ensine a viver

Facas me atravessam

e acordo com o surto

de um alarme

no freezer do açougue –

basta ouvir os noticiários

e os zurros na internet.

Saudade dos tempos do coaxar

dos sapos e pererecas,

mesmo convencido

de que boa parte eram

vôos imaginários.

Sequestrado por folhas em branco

e latas de cerveja,

hoje sou patrola desesperada

gritando diante do abismo

dum pântano

cotidiano.

 

Espero ser adotado por uma dúzia de gatos

que me ensinem a viver do seu jeito:

em natural e espontânea liberdade.

Não mais me atraso no café da manhã.

O que importa, meu brother,

é manter a calma e ser tolerante e paciente

com as armadilhas bestas

que surgem no caminho.

 

(B. B. Palermo) 

quinta-feira, 3 de outubro de 2024

Confessando umas cachorradas


De um lado para o outro – ora vendo TV, ora fuçando nas redes sociais. Tudo muito chato. No Facebook, quase só maravilhas, é muita felicidade pra envergadurazinha dos humanos. Lembrei do Nelson Rodrigues: “Ou a pessoa confessa uma baixeza, ou não está confessando nada”.

Baixezas ou CACHORRADAS, tenho uma ideia de como são, pensando em minhas andanças com Bárbara, que tem uma profissão cujo nome é pra lá de bacana: SEX GIRL.

Um carro estaciona bruscamente ali na rua. É o velho e querido doctor Biza. Cheira a álcool, mas está ligado. Abro a geladeira e apanho uma cerveja, alcanço-lhe e retiro da bandeja alguns ovos. Ele me observa, enquanto se esparrama no sofá:

– O jeito como tu coloca os ovos na bandejinha diz muito de tua personalidade. Como tu faz com o feijão?

Antes que esboce uma resposta, ele diz, meio que zombando:

– Tem que deixar de molho durante a noite. Senão, a feijoada vai produzir muitos gases – na verdade, ele disse muitos p**dos –, e tu sabe como é sério o problema do efeito estufa!

Não queria a companhia de alguém. Mesmo contrariado, fico na minha, mas penso: Sim, doctor estrambótico, cada movimento que meu corpo faz mostra a essência do meu ser, inclusive na hora dos fogos. E tu, nobre sábio, desenvolveu a verdadeira ferramenta para compreender isso.

Ao deitar o verbo, solta no ar gotículas avinagradas, e sempre começa com um "tu sabia que...". Matutei: Bobinho, esse conhecimento que tu tanto apregoa vaza água no final. Tantas teorias e tratados – que se mostravam a solução dos problemas – hoje não passam de ridículos ensaios cômicos. Doutor, não te apegue a tanta coisa que tu escuta por ai!

Mais relaxado, Biza esparrama pela sala suas aflições, e eu sou agora o psiquiatra.

Bastou 5 dias longe dos drinques para evaporar meia dúzia de quilos. Afastou-se também da carne vermelha e dos refris.

– Cadelão, prometi aos deuses que, de vez em quando, vou dar um stop nos líquidos e colocar meu fígado num SPA. Meu guia espiritual me elogiou: “Agora tu tá bem melhor! Continue assim!”. Profetizou num jeito paternal, e intuí que me livrei de algo pesado, tipo um câncer ou cirrose. Sem meu guia por perto, sou um gênio indefeso. Com ele, sou um ser especial e que necessita de uma vida sóbria e que isso será determinante para aprumar a humanidade.

Vai despejando a coisarada, enquanto eu murmuro "aham... aham...".

Agora o Biza fala do sítio que sua mulher herdou. Eu seguro as lágrimas, tantas vezes desejei morar no meio do mato, afastado da correria e dos gritos urbanos. Criar porcos e galinhas, pescar lambaris à tardinha num córrego de águas tranquilas. Transpiro sensibilidade quando ele diz que está medicando algumas árvores – as pobrezinhas foram atacadas por cupins. Aduba, mija nelas, fala, canta e abraça suas amigas, e elas estão reagindo bem!

É muita emoção, gurizada. Não posso me queixar. Consegui uma graninha para repor e manter o estoque de bebidas. Vivemos "em um mundo sem esperança, mas sem desespero" –, foi o que disse Henry Miller na década de 1930. Agora, em 2024, parece que estamos na mesma.

Biza continua fodão. Tudo porque a mulher o botou pra correr. Passou os 3 últimos dias fornicando com umas putas sacaninhas – como é que se chamam, hein? Ah, sim, sex girls.

Em alguns dias fará a síntese dos conhecimentos adquiridos numa pluralidade de cursos online e jogará retórica pra cima da mulher e ela deitará enfeitiçada e viverão uma invejável lua de mel.

 

Que fim levou a Bárbara? Vocês querem saber.

Não sei por onde anda, só sei que me reserva um lindo lugar no reino da fantasia (ou será da anarquia?). Não sei se sou de alguém, ou se tenho alguém, ou se vagueio pelo mundo. Quando a procuro, nalguma boate, carrego a dúvida: ela ainda me quer, ou algum pilantrinha com mais grana se afeiçoou e demarca o seu território?

 

 (B. B. Palermo)

segunda-feira, 30 de setembro de 2024

Eu sou zen

 


Perguntaram-me:

– Você é colorado ou gremista?

Fiz um gesto largo e demorado e calmo,

apontando vales e montanhas imaginários,

e sussurrei:

– Sou budista!

 

Pessoas entram e saem dos campeonatos diários

meio mortos, meio putos:

sobreviver, sobressair, competir,

ser visto ou lembrado,

ser amado ou odiado.

A natureza é espontânea e sábia:

a lua cheia dá lugar pra minguante

que por sua vez dá lugar...

ela quer muito nos ensinar...

porém mas todavia nós humanos, bestas,

dizemos que sabemos o que queremos,

e subimos e descemos de balanças

das farmácias

e apostamos todas as fichas nos centros

espíritas e igrejas e ofertamos as pobres

reservas econômicas nos jogos de azar.

Amanhã – eu prometo – dou entrada

num mosteiro!

 

(B. B. Palermo)


domingo, 29 de setembro de 2024

Cadê o café?


 

Caminhava pela calçada e bati de frente com um velho solitário, jeito de transtornado. Falava alto e – mesmo que estivesse a poucos metros de distância – não deu por mim.

O final do dia, além de abafado, anda estranho – pensei.

Quando era criança, cenas como essa impressionavam:

– Nossa! Um louco! Cuidado, gurizada!

Mas quem liga pra isso hoje em dia?

Algumas vezes, ao retornar pra casa do bar – meio que levitando – também falo sozinho. Porém, tomo o cuidado de o fazer um pouco tarde da noite, quando a comunidade assiste TV ou está num sono profundo.

Se é noite de luar ou o céu está estrelado, converso animadamente com as estrelas e a via láctea – representantes de Deus aos nossos olhos, dizem.

Aos 18 anos, quando servi o exército – numa cidade que ficava a uns 700 quilômetros de onde morava –, trocava cartas com uma garota adolescente. Depois de despachados pelo correio, os suspiros amorosos demoravam mais de uma semana pra tocarem seu coração.  Recebia a resposta da garota – contida, racional, se comparada aos meus delírios poéticos – mais de 2 semanas depois.

Podia ter escapado de servir o exército, mas disse ao comandante, na entrevista derradeira, que queria ficar. O que fiz aos dezoito anos eu faço até hoje: gosto de sofrer, gosto de sentir saudade – morando longe das pessoas mais próximas. Quanto a isso, psicanalistas e psiquiatras têm o conceito na ponta da língua para "classificar" meu tipo de neurose. Fodam-se!

Ou esses experts diriam que foi uma atitude louvável de minha parte: a busca pelo novo; não me acomodar ou me prender à aldeia em que nasci e cresci.

Se eu não sabia o que queria, parece que já sabia o que NÃO queria. Insistiram para que fizesse carreira no exército – mas, realmente, não nasci pra isso.

E tu nasceu pra que, então, seu bucéfalo? – perguntariam vocês...

Pelo menos durante década e meia, escrevia muitas cartas. Não sei como as garotas suportavam páginas e páginas daquelas "viagens" – será que elas guardaram as cartas ou as rasgaram ou queimaram ou as depositaram numa lixeira?

Acho que esse é o ponto: talvez o exercício da escrita salve, liberte ou evite que o ridículo reboleie pelas ruas falando sozinho.

Ao recordar minha juventude – mais do que fominha ou patético – até acho engraçado. Tinha aspirações literárias. Sonhava me imortalizar como poeta hehehe. Não fazia ideia de que todo esse sonho cairia por terra, bastava me apaixonar por alguma garota. Foram várias paixões. O malukinho amou e a arte evaporou.

Juvenil, não tinha qualquer maturidade e noção de que poderia "reencarnar" almas criativas de outros tempos, que me presenteariam incríveis histórias – e o caminho para isso eram as leituras de muitos (e bons) livros.

Quando a inspiração surgia, o espírito (líquido) se desviava dos caminhos criativos ou insights. Com certeza, não tive um mínimo de "café" para compreender e decifrar essas histórias e desenvolvê-las no papel.

E hoje?

 

(B. B. Palermo)


quinta-feira, 26 de setembro de 2024

Ele é visível, finalmente

 

Nadava de braçada e tinha a sensação

de que não saía do lugar,

aí conheci uns caras da política

e aconteceu:

as eleições abrem as portas

e o Palermo ficou visível.

Quem sabe ele consegue lançar seu livro

na feira daqui?

Duvidas, ou estás em dúvida?

O poeta – mais doido que seus amigos andarilhos –

anda com um pé atrás do outro

nessas praias infinitas

e até acredita em tudo,

inclusive nos saltos da baleias

neste final de setembro.

 

(B. B. Palermo)


sábado, 21 de setembro de 2024

A maluquinha do 303

 

Ela se mostra e se esconde

e não sabe (ainda?) que eu topo uma historinha a 3,

desde que não dure mais do que 1 ano e meio,

no máximo 2.

Depois disso, os capetinhas das garotas, e também os meus,

entram em campo e bagunçam o jogo.

Ela é mãe e pai do namorido,

mas eu também sou, e até os meus melhores amigos

e outros mais, fantasiam a sua mamãe.

Faz parte – soube depois de ler nuns romances

que tratam da psicologia dos humanos –

preste atenção no Nelson Rodrigues,

inspirado em Dostoievski.

A maluquinha do 303 se esconde e logo me ataca,

e suas investidas, claro, ficam no “quase”,

e é por isso que eu me frustro e sou possuído

por uns sonhos eróticos e masturbações

às 4 horas da manhã.

 

(B. B. Palermo)


Distribuição de renda

  De uns dias pra cá as vacas ficaram magras. Restaram algumas notas de 2 reais e poucas moedas e nenhum trampo no horizonte. Como passei ...