segunda-feira, 25 de março de 2019

O uso gramatical e sexual da língua



Duas da manhã de um sábado longo e chuvoso e frio de final de março. Eu chegava em casa do bar e da sinuca e vi estacionado por ali um Ford 1986, um carro pesadão, símbolo de status há uns vinte e poucos anos. Era o carro do namorado ou marido ou amante da vizinha e eu simpatizei com a atitude de o cara pousar com ela, depois de algumas semanas afastado.
O gesto romântico me fez pensar na diferença entre os verbos "pousar" e "posar". Baixei o dicionário Aurelião da estante e estabeleci uma triste ponte entre o uso da língua (gramatical, diga-se) e nosso apetite sexual. É que esses dias o Beiço comentou, num tom de sinceridade triste, que ia ficar com uma garota. Mas desistiu. Ela pediu pelo WattsApp se poderia passar a noite com ele no seu apartamento, isto é, "posar". Antes de responder a mensagem o Beiço refletiu sobre o uso que a garota fez do verbo "posar" e concluiu que ela queria passar a noite ao seu lado fazendo pose.
Beiço imaginou a garota com aquela lingerie especial, numa noite especial, diante de um cara especial, desfilando até encher seus olhos.
- Visualize a cena, Cadelão: eu sentado na cama e pousando meu olhar nas curvas da garota, naquelas carnes e estrias e sobras e faltas e tals... e, claro, não esqueça do seguinte detalhe, quando estamos sob o efeito do álcool a nossa visão é de fotoshop, o que poderia ser horroroso torna-se divino.
Fiquei pensando... Como pode o uso equivocado de um verbo, numa simples mensagem pelas redes sociais, transformar o Beiço num broxa dos bem melancólicos?
Meu amigo queria muito fazer sexo, mas depois repousar, isto é, ter tempo para dormir, pousar. Quem não gostaria, depois de uma viagem cansativa, ter um ótimo repouso numa pousada agradável?

 Voltando ao carro estacionado na rua, em frente de casa. Não havia passado mais de cinco minutos e o sujeito deu a partida no carro e nada. Deu a partida e... nada. Então eu refleti se devia ser solidário com aquele homem estranho que comeu minha vizinha e que não quis "posar" ao lado dela. Minha rua é plana, não tem subida e nem descida e o carro é pesadão. Me preparava para ir lá empurrar... mas, na quinta tentativa, quando a bateria parecia sem falta de ar e o motor andava meio afogado, o carro pegou. Então apanhei uma cerveja da geladeira, coloquei um blues pra tocar  e escrevi essas ****** que agora vocês leem.

(B. B. Palermo)

O PATIFE tá enrolando de novo

Quando fui acertar a conta no bar, pendurada nos últimos dias, o bolicheiro não encontrou, no caderno, o meu nome. Ao repassar a longa l...