terça-feira, 15 de setembro de 2020

Todo mundo vomitando


Uma bolha no calcanhar dói menos
do que me deparar com a foto de uma senhora, no Face.
Eu e Ela compartilhamos algumas performances na cama,  
há meia dúzia de anos.

Fotografia premiada com rigor,
muitos cliques até chegar à imagem perfeita.
Pobre moço, em vez de tirar lindas fotos,
eu busco a palavra ideal,
aquela que sempre me escapa,
basta enquadrar a mão,
a caneta e o papel,
e tentar capturá-la.

Maneta frita uns pastéis
e eu mesmo abro o freezer
e sirvo minha cerveja.
Creio ter algum tempo de vida "útil",
pois sempre lembro quanto fiquei devendo
no seu bar.

Toda semana astrônomos emitem alertas
de aproximação de meteoros em nossa órbita,
mais um motivo pra reforçar o estoque de alimentos.
Nunca antes tive tantos ovos em bandejas, na geladeira.
Nunca comi tão bem, e isso me deixa à vontade
para experimentos etílicos.
Substituo o arroz por batata e mandioca
e evito a falta de tão precioso cereal.
Nada de opinião sobre política e economia.
Se disser algo que vá na contracorrente,
serei chamado de comunista.
Nunca se falou tanto nessa simpática
paroxítona,
e a cada dia aparecem mais co-mu-nis-tas
- deve ser efeito das crises.

Qualquer idiota acredita ter a palavra exata
para explicar as sandices que acontecem no mundo.
Tudo o que eu procuro é uma frase de efeito,
antes que transborde o efeito do álcool
e me sinta familiarizado
com tamanhas babaquices.

O final de tarde de sábado se arrasta,
e eu tenho pressa pra jogar no mundo
minhas verdades.
A palavra que procuro precisa ser a flecha certeira,
mas ela sempre foge, então me agarro nuns adjetivos
moradores de rua, passivos, simpáticos,
carentes de tudo.

O som dos carros que passam estremecem os ouvidos.
O mundo é refém do nonsense,
como o são os figos em compota.
Não apenas as conservas,
nós também estamos formatados,
depois do banho maria.

E o traveco novinho também mostra
(à comunidade católica, apostólica e romana
e aos demais curiosos do bem) suas fotos na Internet
naquela sensualidade cada vez mais feminina.
Peitinhos tenros e, a cada mês, novo corte e tintura no cabelo.
Verdades reveladas a cada dia.

"Cadelão, tu devia te preocupar com as mudanças climáticas
e o futuro do planeta, em vez de ser mais um boboca
que se enreda nessas picuinhas cotidianas".

Concordo.
E até acrescento:
quando tu abrir a boca,
quando tu vomitar teu fel,
cuidado com a direção que o teu peido vai tomar.
Não piche os muros virtuais com tanta bosta,
sempre haverá um espertinho
que defenderá suas "verdades"
com unhas e dentes,
dizendo pra meio mundo que tu
é um jegue pit bull.                                                  

Eis a nossa redenção:
cada um vai jogar
na cara do outro
a sua titica.
E ninguém vai ouvir

ninguém.

(B. B. Palermo)

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