sexta-feira, 7 de maio de 2021

Autoexílio

 

O inverno se aproxima

como um bicho estranho e imprevisível,

você mergulha numas reflexões profundas

que transcendem raciocínios ordinários,

e acredita que o sentido vai emergir

do fundo do poço,

é que um seu amigo está deprimido faz uma semana,

trancou-se dentro de casa

na companhia dos etílicos mais sacanas.

Você chama vizinhos e amigos,

sente-se um corajoso voluntário da Cruz Vermelha,

você acredita que tudo voltará à normalidade,

bons empregos, renda razoável pro povo,

crianças em boas escolas e em tempo integral,

ninguém vivendo ou pedindo esmolas nas ruas,

bichos abandonados sendo acolhidos

por lares aconchegantes.

Você é utópico...

Até acredita no  equilíbrio entre Eros e Tanatos,

você nunca vai deixar de apostar

na capacidade cognitiva e moral dos humanos,

você até faz orações e meditação,

está há uma semana longe dos bares,

você conseguiu, depois de décadas,

curtir hábitos decentes.

Você insiste, deseja crer

com toda a sinceridade,

mas o clima não é de primavera,

não há sol estupendo

nem flores maravilhosas.

O inverno está chegando

e você se depara com a fumaça rasante e fedorenta

que vem de mãos dadas com o anoitecer.

Os irmãos das vilas miseráveis,

com seus motivos estranhos,

tacam fogo em tudo o que lhes é descartável,

e castigam os olhos assustados de suas narinas.

Agora, e de novo, tudo queima,

seu coração, seu estômago,

plásticos, pneus e tantos trecos,

então você volta a pensar no seu amigo

que faz uma semana se autoexilou dentro de casa,

na companhia dos etílicos mais sacanas.

Finalmente, tudo faz sentido.

 

(B. B. Palermo)

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