quarta-feira, 6 de novembro de 2024

Dia de mudança


 

Era um dia especial, então fui cedo pro bar.

Desejava contar pros bacanas a novidade:

depois de alguma espera, deixaria a pensão

pra morar no meu apê.

Ao chegar, vi que o Marcão e o Zé

acompanhavam a Lau, no violão –

cantavam, daquele seu jeito, o “Faroeste Caboclo”.

Depois de um mês mamando alguns tipos de chás,

Marcão baixou a guarda e voltou pro Natu Nobilis.

Fase bem louca, essa dos chás:

ele parecia uma dama inglesa

tagarelando suas incríveis experiências

longe do álcool, amparado

por umas burguesinhas de 70 anos.

Não me encorajei em acompanhá-los.

Faceiro, Marcão se atirava nos palavrões,

rimava “eiro” com “puteiro” e tals.

Não tinha jeito, Lau afastava o violão

e reclamava:

– Tu tá drogado, menino!

 

Quando cheguei na pensão,

dona Juju me aguardava

numa perua importada.

De cara, puxou as orelhas deste palerma:

– Tu anda bebendo com o Zé e o Marcão, não é?

Cuidado! Eles entornam pra caramba

e fumam maconha!

A esse respeito, ela tinha toda a razão –

já que trabalhava com adolescentes

infratores.

 

Minhas mudanças nunca foram grande coisa.

Dessa vez, tinha umas 4 ou 5 caixas com livros

mais alguns badulaques e sacolas com roupas.

Entramos no apê e dona Juju explicou

tintim por tintim como tudo funcionava –

nunca tive forno elétrico, chaleira elétrica,

micro-ondas e etc. e tals.

Me senti em casa quando ela abriu

uma gaveta do armário da cozinha

e explicou como guardava os talheres,

para escapar da presença de certas criaturas.

Maravilha – pensei.

Em todos os lugares em que morei

sempre tive a grata companhia das baratas!

Para brindar o negócio do apê e da nossa amizade,

no dia seguinte fizemos um churrasco.

Convidei alguns andarilhos, parceiros do bar.

Todos apareceram – e foi um senhor porre!

No outro dia, eu mesmo subscrevia

um abaixo-assinado contra a minha presença

no ambiente!

 

(B. B. Palermo)


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