quarta-feira, 14 de maio de 2025

Não quero mais uma porra de terreno


 

Você venceu, garoto.
Arrancou o diploma da parede,
construiu uma carreira que cheira a sucesso,
encheu a coisa toda de tecnologia,
anda num carro que brilha mais que tua alma

(sei lá, acho que vale uns 200 mil).

Enquanto isso,
tem gente derretendo no inferno –
e não falo da bíblia,
falo da vida como ela é:
ônibus lotado, aluguel vencido, ansiedade crônica,
remédio genérico e café frio.

Você tem psiquiatra,
tem plano de saúde,
tem tênis de corrida com amortecedor,
mas fuma dois maços por dia
e ri igual um defunto ameaçando

dançar.

Eu também tô doente,
mas não preciso construir mais porra de prédio,
só queria coragem
pra abrir o próximo livro
e ver se dentro dele tem um bilhete:
“O sentido da vida tá aqui, seu desgraçado!”.

Hoje sentei num lugar qualquer
e vi a água lambendo umas pedras.
Era só isso:
água e pedra e eu.

Sem meta, sem meta, sem porra de meta.

Por uns segundos
tudo fez sentido.

Depois, lembrei:
meu fígado tá meio fudido,
meus pulmões também,
o coração já não gosta muito de mim.

Um dia tudo isso vai pifar -
os órgãos, os álbuns de família,
as promessas de ano novo,
as mensagens não lidas,
os terrenos,
as construções.

e vai ser bonito, eu prometo que vai!

 

(B. B. Palermo)

Lau ao Palermo (ou algo que ele acha que ela diria)

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