A vizinha é a coisa mais linda!
(E deve ser por isso que vai me matar)
Tudo igual no fim do mundo.
As caturritas gritam planos de investimento
Nas ruas, adolescentes rebolam em shorts que desafiam a gravidade
e a paciência dos casados.
Fim e recomeço da civilização em câmera lenta.
Quero sexo, caos e talvez uma internação involuntária.
Tô com saudade de arte,
mas aí lembro dos artistas que conheci e fico tranquilo.
Bebo feito um condenado em liberdade,
dou umas risadas sem motivo - é o cérebro fritando em tempo real.
Os homens falam de negócios como se estivessem salvando o planeta:
“Comprei barato, vendi com 300% de lucro.”
Uns gênios da multiplicação do tédio.
Eu só penso em sexo
e nas sementes que nunca brotaram,
nem as naturais, nem as metafóricas.
Fico de pau duro e sem metáfora.
Talvez seja a cerveja, talvez seja carência,
talvez seja burrice genética.
As palavras certas me abandonaram
igual à minha ex.
Enquanto isso, a vizinhança fala de fusões empresariais
e divórcios amigáveis - duas formas diferentes
de perder tudo o que tem.
Nem sempre tem morte, mas sempre tem drama barato.
Hoje, por exemplo, mais uma discussão com a Lucy:
gritos, copos voando e eu ganhando no grito
porque perdi no argumento.
Daí vem a vizinha - a linda, a profética -
e me deseja “saúde” com aquele olhar de quem viu coisa errada.
Contou que sonhou comigo morto. Enforcado.
Fez o gesto. Botou drama. Eu, claro, fiquei excitado.
Fui caminhar tentando entender o que Freud chamaria de "recado do além".
Talvez ela goste de mim.
Talvez queira me matar.
Ou talvez seja só uma mulher normal
que teve o azar de morar ao lado do Palermo.
Mas vejam só:
eu e ela dividimos algo raro,
o impulso misterioso de fornicar ou assassinar.
Talvez as duas coisas.
E, sinceramente, qualquer uma seria mais interessante
que uma reunião de condomínio.
Meia-noite.
Cerveja quente e a geladeira ronronando
feito um transformer cansado.
Máquina filha da puta - não pensa, não sente, e ainda assim
geme mais que eu no sexo.
Olho pra ela e penso:
Pelo menos essa não sonha com minha morte!
Valha-me, Jesus, Freud e Bukowski.
Eu só queria entender a cabeça da vizinha,
ou ao menos sua bunda.
Palermo, tu podia ser alguém na vida.
Mas aí descobriu o bar da esquina e uns shorts justos demais
passando pela calçada com cheiro de suor e fim de tarde.
Aí pronto.
Foi tudo adiado.
Ou melhor:
arquivado sem previsão de retorno.
(B. B. Palermo)