domingo, 20 de janeiro de 2019

Essa vidinha sem graça

Aguardo a noite chegar,
como uma criança que teme voltar pra casa
e sofrer um castigo por causa de uma travessura qualquer.
Assim, estou livre de esbarrar num desses chatos,
boa parte gente conhecida, que leva uma vida reta.
A vida perfeita desses caras me deixa com dificuldades
pra compreender o que realmente pensam.
Amam mais ou fingem amar,
disfarçando com gentilezas seu ódio aos outros?
Gostam do que fazem?
Curtem a rotina diária de canalizar boa parte das energias para manter seu status
e serem bem-vindos no circo social?
Às vezes tenho a impressão de que, dado o atual estado de coisas,
o número de suicídios anda meio baixo.
Mas não se preocupem.
Estou sendo simplório.
Boa parte das coisas que vejo se dá de maneira estrábica.
Tenho feito exercícios pra combater a miopia.
Não sou aluno disciplinado.
Muitas vezes rolo na cama, ao acordar,
sem encontrar qualquer motivação pra cumprir meus turnos
de guarda nesse canil.
Não tenho certeza se sou guarda que observa de fora,
ou se faço parte da alcateia feroz.
O que compensa é o tempo pra fazer algumas leituras.
Por exemplo, li esses dias o livro "Relato de um náufrago",
de Gabriel García Márquez.
Enquanto eu fico aqui contando pra todo mundo minha vidinha sem graça,
o personagem do livro sobreviveu durante dez dias a um naufrágio,
sem água e comida, num pequeno bote em alto mar.
Esse cara sim levou a vida no limite
e herdou boas histórias pra contar.
E, constato, boas histórias poucos vivem.
Os mais velhos replicam o mesmo filme
"no meu tempo"... "no meu tempo era assim...".
Coitados.
Não percebem que a plateia escasseou.
Seu cinema e roteiro estão falidos.

(B. B. Palermo)

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