sábado, 28 de março de 2020

Daytripper - Leitura da semana


Daytripper, uma lição sobre a vida


Quais são os dias mais importantes da sua vida?


Todo dia acordamos sem saber se ele será o último. Muitas vezes nem pensamos nisso e deixamos a vida passar diante de nossos olhos sem fazer nada, sem rir nem chorar, sem aprender nem ensinar, sem viver, só a existir.
É a nossa vivência que nos permite experimentar coisas que jamais teríamos a oportunidade se caso simplesmente ficássemos isolados delas. É vivendo que aprendemos, não só sobre a vida, mas também sobre nós.
É sobre tudo isso que essa maravilhosa graphic novel vai nos mostrar, mas sobre a vida (e a morte) de Brás de Oliveira Domingos, um escritor de obituários que, a primeiro momento, tem 32 anos e também tenta escrever seu livro de romance, igual a seu pai. Isso é só uma iniciativa para toda a história por trás. Todas as reflexões e todas as lições da vida em todos os momentos, seja na infância, na juventude, na velhice e até na morte de Brás.

Antes de começar a ler essa maravilhosa história, talvez seja importante ressaltar o significado de Day-tripper: um viajante de um dia só, um turista que vai a algum lugar e no mesmo dia volta à sua origem.
Ao começar a ler, tenha paciência. É normal você se perder ou não entender logo de cara, mas não feche o livro, não ache que Daytripper será mais uma história qualquer que ficará jogada na sua estante. Ela será muito mais que isso, será uma reflexão, uma pequena visão da vida.
Logo no primeiro capítulo, nos deparamos com a morte do protagonista, estranho não? Pois se acostume, já que veremos todas as suas mortes em diferentes momentos da vida. E não, isso não é um spoiler, é a base do livro.
No decorrer do livro, dividido em 10 capítulos, nos envolvemos cada vez mais com Brás, tornando suas mortes cada vez mais tristes, mesmo sabendo que ele estará vivo no próximo capítulo.
Levamos um choque na sua primeira morte, na segunda ficamos confusos e daí em diante ficamos tristes. Vemos o auge da vida de Brás a cada capítulo, mas também vemos seu fim.
“A vida é como um livro, filho. E todo livro tem um fim. Não importa o quanto você goste do livro, você vai chegar na última página e ele vai terminar. Nenhum livro é completo sem o fim. E somente quando você lê as últimas palavras, você vê como o livro é bom.”
Como já disse para alguns que me perguntaram sobre, Daytripper não é uma história feita para ser explicada, mas sim uma história feita para ser sentida, vivida e explorada em seus mínimos detalhes.
Como disse Fábio Moon (um dos escritores): “Com o pé calçado na realidade, o mais difícil não seria criar algo que PARECESSE real. Não, o difícil foi criar um mundo que você se SENTISSE real.”
Ao ler o livro, nos parece que eles não tiveram dificuldade alguma. Cada cor, cada personagem, cada referência e até expressões foram inseridas de forma a reproduzir um sentimento. E conseguiram, nos passaram todas as emoções de Brás e dos personagens a volta em cada detalhe. Acredito sem sombra de dúvidas que, mesmo sem o texto, entenderíamos a história.
Fábio Moon e Gabriel Bá são irmãos gêmeos nascidos em São Paulo, onde vivem até hoje. Eles vêm contando histórias de quadrinhos há quase 15 anos, e seu trabalho já foi publicado em diversos lugares do mundo além do Brasil, bem como França, Itália, Espanha, Grécia, Japão, Alemanha e Estados Unidos.
Segundo o livro, gostam de café bem preto, sem açúcar, com sabor forte e memorável. Acreditam que as histórias devam ser igualmente fortes e memoráveis. E conseguiram. Daytripper passou a ser meu livro preferido exatamente por isso, pela história inesquecível e pela reflexão mais ainda.
Em suma, Daytripper me fez questionar sobre o quanto a vida é efêmera, dando-me uma visão diferente do mundo. Quando você percebe isso, seus dias mudam, você passa a querer aproveita-los da sua maneira, tonando-os especiais e únicos. Não deixe a vida passar diante dos seus olhos, abuse do verbo viver, viva cada dia como se fosse os último, porque um dia será.

Não vou mais ler obituário de jornal


Montar a asa delta dos pulmões,
percorrer outros lugares, sonhar
avistar novo amor, novo lar,
novo pet, e repelir, com sofrimento,
velhos sonhos e vomitar 
em banheiros fétidos dos botecos 
aqueles medos. 
(Ah, diriam vocês,
lá vem ele com Nietzsche
 e o velho eterno retorno...).
Fodam-se, todos.

Deixei de lado papel e caneta
e poemas e caminhadas,
tive atração por flores e
garotas de maquiagem farta e,
nessas bebedeiras,
uma recaída romântica
levou-me de encontro
ao impulso automático
do imbecil Cadelão.

Restou o previsível,
o de sempre,
e agora as mãos se atrapalham
e tremem
na companhia agitada
de etílicos baratos.
Foi o suficiente pra dama
literatura
se afastar e me trair e apostar
noutros boyzinhos.

Ideias em quarentena,
pé fora do lugar,
coração despido,
num misto de fome e sede,
vou pela avenida
e me deparo com esse carnaval
fora de época,
isso depois de grampear e
lacrar minha pobre arte
nuns envelopes
e entupir a caixa do correio.

Homem que ultrapassa as nuvens.
Asas coladas com cera
o conduzem até pertinho do sol
para então despencar.
Nenhuma linha, nem cartas
para amigos ou editores
ou leitores imaginários.
Nenhuma inspiração,
a imaginação já era.

É o que dá não suportar o verdadeiro
e relativo amor e o medo de morrer
sem realizar o que não sei ao certo.

Não posso parar
vou parar de morrer
não vou mais ler
obituário de jornal.

Belchior não morreu,
e estou vazio de ideias.
Neste momento estou morto,
não passo de prédio em construção.
Sou todo tijolos e ferro e massa e
som e movimento e...
um radinho pendurado
num guindaste, no sétimo andar,
desse prédio qualquer, me chama.
A música toca e embarco num sonho.

Sigo meu caminho,
porém, em sua alucinação,
Belchior grita de lá:
"Você não sente nem vê
mas eu não posso deixar de dizer,
meu amigo, que uma nova mudança
em breve vai acontecer..."

Estou sóbrio e trêmulo e,
portanto, de mau humor,
então grito de cá:
"Foda-se, Belchior,
deixe-me respirar e silenciar e
me afastar desses vermes e vírus e
imagens e vozes que despencam
desses abismos de concreto...".

Eis que o FDP grita de volta:
"Relaxa, Cadelão,
aprenda comigo,
'tenho sangrado demais,
tenho chorado pra cachorro,
ano passado eu morri,
mas esse ano eu não morro'".

(B. B. Palermo)

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