quarta-feira, 14 de abril de 2021

Não há vagas - Ferreira Gullar

O preço do feijão
não cabe no poema. 

O preço do arroz

não cabe no poema.

Não cabem no poema o gás
luz e telefone
a sonegação
do leite
da carne
do açúcar
do pão

O funcionário público
não cabe no poema
com seu salário de fome
sua vida fechada
em arquivos

Como não cabe no poema
o operário
que esmerila seu dia de aço
e carvão
nas oficinas escuras

- porque o poema, senhores,
está fechado:
"não há vagas"

Só cabe no poema
o homem sem estômago
a mulher de nuvens
a fruta sem preço
O poema senhores,
não fede
nem cheira

Adeus, meu rabo de cavalo

  O chão, de repente, é um cemitério de fios. Meu rabo de cavalo, breve como promessa de verão, caiu inteiro no colo do João, barbeiro rindo...