sexta-feira, 26 de dezembro de 2014

Cada qual com sua quimera - Baudelaire

Até que ponto nossas felicitações de "Feliz Ano Novo!", muita "saúde e paz", "sucesso", etc., não são repetições do mesmo (de todo ano), lugares comuns que disfarçam uma vida escrava da rotina, sem emoção e criatividade? O texto abaixo, poema em prosa repleto de metáforas, provoca nossa reflexão sobre o que fazemos e buscamos em nossa vida - sendo que, sai ano, entra ano, até que ensaiamos alguns questionamentos sobre a nossa condição humana, e também sobre se há e qual seria o nosso "destino"...

CADA QUAL COM SUA QUIMERA

Sob um grande céu cinzento, numa grande planície poeirenta, sem caminhos, sem gramados, sem uma urtiga, encontrei vários homens que andavam curvados.

Cada um deles carregava nas costas uma enorme Quimera1, tão pesada quanto um saco de farinha ou de carvão, ou os apetrechos de um soldado da infantaria romana.

Mas a monstruosa besta não era um peso inerte; pelo contrário, envolvia e oprimia o homem com seus músculos elásticos e possantes; grampeava-se com suas duas vastas garras no peito de sua montaria; e sua cabeça fabulosa sobressaía acima da fronte do homem, como um daqueles capacetes horríveis com os quais os antigos guerreiros esperavam acirrar o terror inimigo.

Interroguei um desses homens, e perguntei-lhe aonde iam assim. Respondeu-me que de nada sabia, nem ele, nem os outros, mas que evidentemente iam a algum lugar, já que eram levados por uma invencível necessidade de andar.

Coisa curiosa de se notar: nenhum dos viajantes parecia irritado com a besta feroz pendurada em seu pescoço e colada em suas costas; dir-se-ia que a considerava como fazendo parte de si mesmo. Todos esses rostos cansados e sérios não demonstravam desespero; sob o céu, com os pés mergulhados na poeira de um solo tão desolado quanto este céu, eles caminhavam com fisionomia resignada daqueles que estão condenados a ter sempre esperança.

E o cortejo passou a meu lado e afundou na atmosfera do horizonte, no lugar em que a superfície arredondada do planeta se esquiva à curiosidade do olhar humano.

E, durante alguns instantes, teimei em querer compreender esse mistério; mas em seguida a irresistível indiferença se abateu sobre mim, e me deixou mais duramente oprimido do que eles próprios por suas esmagadoras Quimeras.


1 - QUIMERA- A Quimera, na mitologia grega, era um monstro que cuspia fogo, dotado de cabeça e peito de leão, tronco de cabra e cauda de dragão.

BAUDELAIRE, Charles. "Cada qual com sua Quimera" in: Pequenos Poemas em Prosa (O Spleen de Paris). São Paulo: Hedra, 2009. p. 47

quinta-feira, 25 de dezembro de 2014

Teu olhar


Borboleta tem a lâmpada
asa delta tem o sol
abro a janela
ganho o mundo
quando tenho o teu olhar
- teu olhar é meu farol!

(Tiradas do Teco, o poeta sonhador)

terça-feira, 23 de dezembro de 2014

Meditação transcendental - David Lynch



Disseram-lhe: "A verdadeira felicidade não está lá fora. A verdadeira felicidade está aqui dentro. Mas não lhe explicaram onde está o 'aqui dentro', nem como chegar lá".

sábado, 20 de dezembro de 2014

Baixa o som, bucéfalo!



Quanto a esses sujeitos que circulam pelas cidades, com o volume do som do carro a mil, Mario Quintana cita o velho filósofo Schopenhauer: "A soma de barulho que uma pessoa pode suportar está na razão inversa de sua capacidade mental".

sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

Pessoas-fantasmas



Segundo Mario Quintana, hoje em dia é difícil encontrarmos "as pessoas presentes", por causa da TV, rádio, celular e internet. Vivemos, sempre e sempre, "em comunicação com uns distantes fantasmas". O problema agora "não são os fantasmas do outro mundo, mas sim os fantasmas deste mundo!" (M. Q. Caderno H).

domingo, 14 de dezembro de 2014

No tempo das cavernas




No tempo das cavernas uivos e guinchos davam conta das palavras. Cavalo da chuva ninguém tirava. Não havia freezers bichos embalsamados e açougues. Era dos sentidos, nada era embutido. Todos reinavam e não havia cativeiros. Nem sempre o grande comia o pequeno. Quem podia mais fugia menos. Não havia correntes e prisões-canis de alguns metros quadrados. Hoje a anatomia do açougue esquarteja o sonho do boi. Congelamos sentimentos e somos escravos do tempo. Me espanta o ritmo do caranguejo. Meu ritmo mais ousado é andar para os lados. Nunca vi bicho psicopata. Bicho não mata por prazer. Bicho não se alegra ao ver outro bicho sofrer.



(TIRADAS do Teco, o poeta sonhador)


domingo, 7 de dezembro de 2014

Caprichos & relaxos - Paulo Leminski


a árvore é um poema
não está ali
para que valha a pena

está lá
ao vento porque trema
ao sol porque crema
à lua porque diadema

está apenas

Novo homem!

  Grãos de areia interditaram meus olhos nesta quarta-feira de tarde, bastou umas calcinhas no varal tomarem banho de sol e ousarem ...