domingo, 30 de junho de 2019

Abriu um brechó no bairro



Carol estava entusiasmada com as dicas de uma amiga. Abriu um Brechó no bairro, com muitas peças incríveis.
Chegou a primavera, hora de repensar o visual.
Fisicamente generosa, peitos e coxas o bunda, loira que adora foder e ser o centro das atenções. Precisa de olhares pro seu corpo e ouvidos pro seu papo. Quando bebe, e olha que Ela bebe, não vacila e aceita cheirar o pó dos carinhas. De vez em quando se empolga e desenvolve textões meio poéticos ou meio reflexivos no Facebook, parecendo garota que sabe o que quer.
Poderia não ser uma maria vai com as outras. Não suporto o consumo exagerado, e isso tem a ver com minha pouca vontade de trabalhar. Ora ora, que se fodam, meia dúzia de farrapos e não sinto falta de muito mais.
Meu, sabia que estão surgindo muitos brechós por aí?
Mesmo?
Uma galera que pratica o consumo consciente.
Hum... Acho que consumo consciente é consumir pouco.
Ah, é bom variar, se sentir admirada.
Sabe o filósofo americano, Thoureau?  Já na metade do século XIX ele era um crítico do que chamava de consumismo viciante e vicioso.
Esses brechós têm roupas de segunda mão, mais baratas e com história.
É?
Lá você pode encontrar verdadeiros tesouros.
Deus do céu. Tenho dois tesouros de camisas, um tesouro de calça e três tesouros de bermudas. Ah, um tesouro de sapatos esfarrapados e um tesouro de sapatênis.
 A Dirce me falou que tem muitas peças da década de 1980. Já pensou? Posso partir pra um look mais chamativo.
Sei, sei.
Devia ter notado as botas horríveis, o casaco de pele de coelho que comprou numa viagem pra fronteira com o Uruguai. Ela tem um belo corpo, é jovem, o nariz até que está em harmonia com o restante do rosto, belas pernas, o quadril ainda está nos trinques. Mas pra que tantos brincos e cintos e bolsas? Ela podia se livrar de tanto acessório.
Acho que você não precisa exagerar na maneira de vestir. Vamos curtir outras coisas.
Eu sou assim. E o jeito como me visto é a minha cara. Palerma,vive enchendo o saco! Você é um babaca fino da bossa.
Sei, sei.
Se faz de escritor. Vive de fazer tipo. Fica com essa cara de sonso.
Verdade.
Que foi? Alguém comeu tua língua?
Sei lá.
O que foi?
Pra que repetir o de sempre?
Saco. Não escreve nada.
Verdade.
Não sabe beijar.
Mesmo?
Pra lá e pra cá, como um animal enjaulado. Nunca vai perceber o quanto é superficial. “Eu não tenho regras, eu não tenho destino, vivo entre profanos e anjos decaídos...”.
Essa droga de inverno que nunca acaba.
Pra lá e pra cá, aquela bunda, deve estar doida pra variar na fodeção.
O inverno logo se vai, meu bem. “Mudaram as estações... nada mudou”.
O quê? Fala mais alto.
Nada. Tudo o que começa um dia termina.
Se vai falar pra dentro é melhor ficar calado.
Carol, qualquer coisa que eu disser vai te deixar ainda com mais raiva.

Vem comigo no show de umas bandas legais na taberna do Maluco Beleza?
Você tá cansada de saber que não tenho saco pra aquele rock pauleira e aqueles carinhas.
Você não suporta o som que eu gosto nem curte meus amigos.
Bonito, teus amigos nuns carrões de duzentos mil reais, roupas de grife e ouvindo umas merdas de som.
Nessas festas aproveito pra tirar dezenas de fotos.
Por que você não coloca o dedo na xoxota? massageia o clitóris, isso dá muito mais prazer.
No meio da festa?
Claro, meu anjo. Esquece essa paranoia de pau de selfie. Isso é falta de orgasmo.
O barril de pólvora apanhou sua bolsa de brechó e caiu fora, sem antes, claro,  quase arrebentar a porta.
Manda um beijo sabor agrotóxico pros teus amigos.
Creio ter ouvido um rosnado, ao longe:
Fique aí enchendo a cara e escrevendo as merdas de sempre.
Hora de relaxar, beber outra dose e partir pra um plano B. Adoro essa doida mas sempre me esforço pra deixá-la furiosa e decidida a partir, mesmo sabendo que poderá passar a noite com outro cara. Não a quero totalmente comigo, nada de exclusividade, é como se um dia tivesse uma carta na manga pra poder saltar fora.

Alô? Carine?
Cadelão! Quanto tempo. Tudo bem?
Tudo. Melhor agora.
E as novidades?
O mesmo de sempre. Batalhando numas histórias.
Sinto falta das histórias que você lia pra mim.
Sozinha?
Estou sozinha. Vem pra cá.
Ok. Vou pegar umas cervejas e passo aí.

Cinco da manhã, sinto uma coisa estranha, um desejo de voltar pra casa. Deve ser a necessidade de experimentar uma traição.
Ela dorme com a roupa que saiu. Nem as botas ridículas despiu. Bêbado, escorrego no tapete da sala, brigo com um bonsai que está próximo da janela e chuto o urso de pelúcia que dorme no sofá. Ele se encolhe, esfrega os olhos e me observa, apavorado.
Você é um ridículo.

(B. B. Palermo)

O PATIFE tá enrolando de novo

Quando fui acertar a conta no bar, pendurada nos últimos dias, o bolicheiro não encontrou, no caderno, o meu nome. Ao repassar a longa l...