terça-feira, 26 de novembro de 2019

Pagando os boletos de uma princesa



As lâmpadas da boate da Janete eram pequenas, pareciam preservativos broxas, mal penetrados por cacetes diabéticos. Janete ligou, ligou e enviou mensagens, e em meia hora pousou do meu lado uma putinha linda, repleta de tatuagens e barriguinha charmosa e boletos pra ontem.
Ela não bebia minha cerveja. Ela sugava. Alcançava o copo, eu derramava até a borda, ela entornava e dizia Profinho, enche pra mim. E salivava, murmurando, Profinho, como tu é bonito, profinho, como tu é cheiroso, profinho, como tu é carinhoso!
Que droga. Todo mundo elogiando os professores. Todo mundo explora e enche de trabalho e paga mal e atrasa o salário e fode e fode os tristes dos profinhos. Eu pensava, Eita país de bosta esse nosso! Dia desses arrumo um trabalho decente, junto uma grana e viajo pra Itália, pra tentar compreender minhas raízes.
Um corpo lindo, vinte e poucos anos. Mas eu percebi uma pancinha meio desproporcional ao restante de sua anatomia.
Logo deixou-me a par dos boletos atrasados. Eu era um garoto lindo - ela dizia - de olhos azuis da cor do mar. Então eu me empolgava, tirava da carteira uma nota de 10 reais e escolhia na máquina minhas canções preferidas. Uma nostalgia meio pop, meio romântica. Era o Roberto Carlos, da "Amada amante", era o Tim Maia, de "Azul da cor do mar", era o Raul Seixas, de "Tente outra vez", era "Malandragem", da Cássia Heller... Ela lambia minha orelha e dizia Que músicas lindas! Perguntei Tu conhece esses caras? Ela disse Não.
Meus trocados no bolso estavam contadinhos. As putas da casa brindaram umas carreiras e eu falei Pra mim uma só, senão meu coração não aguenta. Elas riram, Cadelão, tu não tem coração e muito menos fígado.
Puta que pariu, bastou uma carreira daquele pó pros meus dentes trincarem.
Já que seus boletos eram pra ontem, pechinchei um desconto no preço do programa e partimos pro meu cafofo. Assim que descemos do táxi, ela correu pro banheiro e eu corri pra caixinha de remédios que estava num armário e despejei um sachê do pó do amor num copo com água pela metade. Preciso ganhar um tempo - pensei - até o afrodisíaco fazer efeito. Disse-lhe que precisava de um banho. Caprichei. Demorei. Ao voltar pro quarto vi ela deitada, peladinha, e aquelas tatuagens nas pernas e coxas e ombros, e aquele barrigão. Caralho - pensei - estou meio bêbado, mas isso é muito estranho!
A garota estava louca de tesão, quis que a lambesse por inteiro. Eu falei, Nem tudo, meu bem, nem tudo.
Boa parte das putas tem pressa, e isso contrasta com a duração de minha performance. Meio alto, tenho dificuldades pra chegar ao orgasmo. Moral da coisa: a garota se foi com o resto de meus trocados, e eu ali paralisado, tentado distrair meu infeliz pau duro.
Ao acordar no final da manhã do dia seguinte eu tinha uma pequena lembrança de que sonhara que havia comido uma garota estranha, e que antes de partir ela disse Nossa, tua camisa é linda! e então eu alcancei, dizendo Leva ela pra ti.

Vasculhei todos os cantos do cafofo e nada daquela camiseta.
Percorri o olho sobre a mesa da sala, observei a fruteira e minhas anotações e livros que estou lendo... Estranho, cadê as bananas e tomates e maçãs e mangas e cabeças de alho? Pra onde foi todo mundo?
No final daquele dia a Janete me ligou. Estava transtornada. Cadelão, tu é muito bobinho, foi na conversa de uma piriguete que está no quinto mês de gravidez. Em seguida a cafetina enfiou o dedo no tumor da questão: Ela está proibida de frequentar minha casa! Um pouco mais calma, ela perguntou: Tu vem aqui hoje de noite? Tenho uma novinha que tá a fim de te conhecer.
Toda vez que topo uma carreira, no outro dia baixa uma cruel deprê. Então eu disse pra ela: Hoje não, meu bem, estou fazendo as malas, vou passar uma temporada em Palermo.

(B. B. Palermo)

O PATIFE tá enrolando de novo

Quando fui acertar a conta no bar, pendurada nos últimos dias, o bolicheiro não encontrou, no caderno, o meu nome. Ao repassar a longa l...