quinta-feira, 27 de abril de 2023

O cara do anzol

 


Ontem à noite demorei pra dormir.

A respiração seguia o ritmo do dedo latejando,

antecipando o pesadelo:

no mar, estava sendo fisgado por gigantesco anzol, 

peixes aguardavam na praia

pra me esfolarem e fritarem 

num panelão de óleo fervente.

A causa do pesadelo, só pode, foi que desde domingo testemunhei uns caras pescando dúzias e dúzias de peixes enormes, tudo com linhas de mão. 

Como vinha cheio de tédio dos últimos dias de abril, não vi outra saída senão pescar.

Ontem de tarde, depois de uma sesteada 

de mais de uma hora, preparei meu equipamento.

Como tinha observado daqueles pescadores, 

eu devia arremessar o troço a uma distância mínima de uns 80 metros, 

afastado das ondas próximas da praia. 

Claro que não dominava técnica nenhuma. 

Arremessei do meu jeito,

e foi um bom arremesso,  

mas um dos anzóis ficou cravado no dedo mindinho da mão esquerda. 


Na UPA, formou-se fila de enfermeiras e auxiliares.

Tentavam lembrar da última vez que um imbecil 

conseguiu se autofisgar. 

O  médico cravou a agulha 

pra anestesiar a região

e eu berrei:

"Aiaiai... caralho!" "Pqp... como dói!".

Disse a enfermeira:

"Senhor Palermo, já imaginou a dor que o peixe sente ao ser fisgado?".

E o médico:

"Querido, nada de álcool por 3 dias.

Agora é anti-inflamatório e antitetânica".

E brincou, mostrando-me o que restou do anzol:

"Tu não quer levar essa joia?

Use como piercing na orelha ou no nariz!".

Sussurei:

"Enrola num guardanapo, vou levar".


Entrada da noite, fui ao bar mostrar o machucado 

e justificar minha ausência pelos próximos 3 dias.

Amigos malvados, encorajados pelas doses de vodca 

e uísque baratos, praguejaram:

"Arranca fora esse curativo, Cadelão!

Faz como eu fazia nas minhas pescarias desde piá: mija em cima!

Deixa de ser cagão, pescador de meia-tigela!"


(B. B. Palermo)

O PATIFE tá enrolando de novo

Quando fui acertar a conta no bar, pendurada nos últimos dias, o bolicheiro não encontrou, no caderno, o meu nome. Ao repassar a longa l...