quinta-feira, 17 de fevereiro de 2022

Porko, o menino malukinho

Dia após dia Porko faz sua peregrinação,

da obra onde trabalha até o bar.

A cerveja liberta suas verdades e eu pergunto:

você quer que ele fale sobre remédios

ou de suas ações edificantes?

Ele é o proprietário das construções

que ajudou a erguer como servente de pedreiro.

É o pai da mesa no jogo de sinuca.

Foi um grande centroavante,

e só não jogou no Internacional porque seu joelho estourou.

Porko foi o primeiro sapiens astronauta a pisar na lua,

e será o primeiro a fincar a bandeira da pátria amada

nas lonjuras de marte.

É preciso levar a sério nossa higiene pessoal, ele diz,  

depois de outro gole de cerveja.

Veja bem, todo mundo perdendo o cabelo

só por frequentar essas barbearias de quinta.

Veja bem, pra tudo existe o remédio certo,

e pra queda de cabelo o melhor remédio

é o recomendado pelo Cristiano Ronaldo.

 

Porko mora há décadas no mesmo sítio,

mas sua cabeça viaja aleatoriamente por incríveis lugares,

até se deter nas tristes lembranças de sua vida amorosa.

Sua mulher fugiu com outro, mas isso foi bom,

porque não gostava mesmo dela.

O processo do seu divórcio foi uma batalha jurídica,

mas não teve medo de enfrentar a fúria da ex e de seu advogado.

Amor e ódio se dão muito bem, tanto é que sua ex-mulher

mora num puxadinho, nos fundos de sua casa.

 

Você é bom de discurso?

O discurso do Porko ziguezagueia, como um bêbado,

começa regular, depois parte pela diagonal, mas logo derrapa.

Viver é, também, remoer experiências doloridas.

 

Ouço sua fala e dou conselhos, em silêncio:

Porko, emita sons e palavras que façam brotar as flores daquele jardim.

Seja o menino malukinho, o menino do dedo verde,

seja o pequeno príncipe dos becos,

seja o motoboy que distribui pelos lares da cidade abraços e beijos,

seja o garoto ordeiro que recolhe nosso ódio e rancor

das lixeiras transbordantes de nossas calçadas.

Por favor, Porko, seja o psicólogo dos bairros,

a língua mais solta e afiada.

Espalhe aos quatro ventos que alguns amigos são drogados,

outros são alcoólatras, outros batem nas mulheres...

(Não podemos esquecer que isso é dito no calor das ondas etílicas,

a verdade não pode se fazer presente, estava viajando,

não foi chamada para confirmar ou negar.

Mas quem confia na verdade, num mundo de fake news?)

 

Você, eu, Porko e tantos outros malucos somos a prova evidente

de que é hora de escancarar as portas dos manicômios.

Em vez de estarmos presos lá, sugando os pobres recursos do Estado,

vamos instituir como lugar dos loucos os bares e os ambientes de trabalho,

porque é nesses lugares que a malucada mostra o seu valor.

 

Jogamos palavrões ao alto, semeamos maldades desnecessárias,

se pensarmos nas ações que tornariam o mundo melhor.

Porém, tanta aberração é compreensível.

Reproduzimos por aí aquilo que está instituído em nossos lares,

a tal da fofoca, real ou virtual...

  

(B. B. Palermo)


O PATIFE tá enrolando de novo

Quando fui acertar a conta no bar, pendurada nos últimos dias, o bolicheiro não encontrou, no caderno, o meu nome. Ao repassar a longa l...