quinta-feira, 11 de julho de 2019

Acorda, meu amiguinho, acorda



Na sinuca do bar, quando nos viu chegar, o Maneta se alegrou. Logo buscou um copo. Disse que passou o final de semana vomitando e o Dr. Biza olhou para o seu ventre inchado de tanta cerveja e imediatamente emitiu o diagnóstico: problemas com o duodeno.
O dono do bar, carrancudo, informou que fecharia daí a pouco, teria um exame logo de manhã cedo, e só tinha um litrão de polar mas quando viu punhados de notas de cem na carteira do Dr. houve de súbito o milagre da multiplicação dos litrões.
Estava conosco o Boni, bom garoto, de opiniões bem comportadas sobre qualquer assunto. Me alegrei quando ele segredou que, se eu criar um perfil noTinder, vai chover garotas. Confesso que tenho inveja desses jovens amigos, de ereções fáceis e duradouras mandando ver nas putinhas.
Óbvio. Vivo dilemas da meia idade. Ou bebo baldes de cerveja e não trepo, ou abro mão dos baldes e mando ver no sexo. Admito. Os tempos são outros. Já não me considero, já não pergunto pra garota, maravilhada pela minha performance, "que que achou, Baby?".
Uma e meia da manhã, disse aos amigos que precisava descansar, pra cedinho me concentrar num conto que estava pela metade e precisava inscrever para um concurso. Dr. Biza fez um emocionado discurso, "amigos não deixam amigos na mão, etc.". Então fomos pras gurias.
Na casa havia outro amigo, de vinte e poucos anos, hábil e nas carreiras. Vejam só, meus brothers, uma loirinha escrota, que não deve ter mais de vinte e três anos, riu o tempo todo de minha cara, me humilhou diante dos olhares curiosos dos presentes, só porque estava bêbado e cansado e meu mimoso não despertava.
Ela sabe quem eu sou? Sabe com quem está lidando? Tá bem, tá bem, um chinelo, porém discreto, sem nem conseguir acompanhá-la numa dança de músicas bregas. Tá bem, tá bem, vou ficar quieto no meu canto, mamando uma Heineken que o gigolô cobra trinta reais, deixando a loira escrota inventar histórias sobre minha respeitável pessoa.
Foi tanta a humilhação de parte da loira, que eu fui diminuindo de tamanho, como um boneco, menor que um anão. Ela ria e falava que se lembrava de mim, me reconheceu numa festa, e que eu estava rodeado de umas bichas-loucas, imagina, sou hetero convicto, eu negava e dizia que não conhecia tal lugar, e ela contava pra todo mundo que o cara que ela viu tinha a minha cara, os mesmos olhos, e os mesmos papos. E então, gente, eu era achincalhado e silenciava e me encolhia e já não era um anão, eu era um boneco de uns trinta centímetros que a loira manuseava e debochava e virava de ponta cabeça (ela me sacudia e dizia "quero ver o pingolim") e me exibia  numa bandeja, como se eu fosse a cabeça do profeta João Batista. Vejam bem, meus amigos, todo o meu glorioso passado, sólido pensador debatendo com meus brothers alunos sobre "o que é o amor", sobre "o que é a felicidade". Agora reduzido a um lixo.
Eu me sentia um João de Deus, o cara que fazia milagres, deixava as pessoas de alma leve. Coitado, agora anda amparado por uma bengala ou uma maca, um saco de merda escoltado pelos caras da Federal. Seu prêmio de consolação foi permanecer manchete nos jornais pelo menos por um mês. Pra mim não sobrou nada.
A loira vociferava "me rasga, me bate, me vira do avesso, me come agora!", e eu olhava pro meio das minhas pernas e implorava "acorda, meu amiguinho, acorda". Eu, um pobre diabo, humilhado até as entranhas de minha dignidade por uma loirinha bonitinha mas ordinária.
Que merda, a que ponto cheguei, aqui respirando o ar mijado desse puteiro, enquanto a cidade com seus valores superiores descansa e revigora pra logo de manhã cedo colocar em prática sua missão mais sublime, seguir no rumo certo do progresso do país.

(B. B. Palermo)

O PATIFE tá enrolando de novo

Quando fui acertar a conta no bar, pendurada nos últimos dias, o bolicheiro não encontrou, no caderno, o meu nome. Ao repassar a longa l...