sábado, 24 de agosto de 2019

Cadê minha liberdade de expressão?

Tem dias que a criatura passa dos limites e não consegue evitar uma confusão. E, além de bêbado, fica transtornado a tal ponto que ignora a possibilidade de no final, diferente das novelas e filmes, os conflitos não cessarem e todos (até os “bons”?) serem infelizes por um tempo. 
Foi o que aconteceu com o Beiço esses dias. Ao mesmo tempo em que desejava abraçar todo mundo, queria que eles fossem à puta que o pariu. Andava tão trágico como certo personagem de Gabriel García Márquez no livro Crônica de uma morte anunciada. Numa noite transtornada, deixou-me arrepiado diante do “trágico” e da “morte”. 
No bar do Geni, cheio de casais e adolescentes, entrou cambaleante falando a plenos pulmões em “xoxota”, “bundinha” e “trepada”. Na hora o Geni, forte como um pit bull, se coçou detrás do balcão. Aí eu disse: 
- Cara, fala baixo e não diz tanto palavrão. 
E ele: 
- Cadê minha liberdade de expressão? 
Então apontei na direção do balcão do bar: 
- Sabe o que o Geni esconde ali, ó? Um enorme taco de beisebol! 
E ele: 
- Ai que gostoso, adoro um taco!
A besta não sossegava, dirigia-se às mesas onde umas garotas bebiam e conversavam. Eu me perguntava se ele as conhecia. Dali a pouco retornava pra nossa mesa e comentava que aquelas garotas eram mal resolvidas, que não passavam de umas histéricas.
Passou a narrar seu plano de suicídio. Seria com uma moto de pelo menos mil e cem cilindradas. 
- Veja, Cadelão, como é fácil me matar. Em dez segundos, no máximo, chego a uma velocidade de duzentos quilômetros por hora, numa reta, e quando surge uma jamanta no sentido contrário miro bem no meio do para-choque e, numa fração de segundo, tudo estará resolvido. 
Disse isso e cantarolou “voar, voar, subir, subir, ir pra onde for...”. 
Eu falei: 
- Meu, você anda trágico. Brigou com a namorada?
Então ele cantou pra todo mundo ouvir: “Garçom, aqui nesta mesa de bar, você já cansou de escutar, centenas de casos de amor...”. Logo depois ele debochava: “O bobinho acreditou que penso em me matar hehehe!” E não sossegava: “Agora ficou claro para mim: o sentido da vida está nas putas”. Depois de outra dose de tequila: “O grande sentido da vida está numa putinha gostosa agarrada em meu pescoço sussurrando toda melosa ‘amore, amore, amore’”.
Nunca tinha notado o Beiço assim, tão TRÁGICO. Se de um lado ele dizia pra todo mundo no bar “obrigado”, “perdão” e “com licença”, de outro ele berrava “exijo respeito”, “você ofendeu minha honra” e “vamos duelar e um de nós vai morrer”. Então, em vez de começar uma luta mortal com o garoto de cabelo comprido e rabo de cavalo, sentado na mesa ao lado e que decidiu se intrometer, o beiçudo parecia implorar por um beijo. 
Depois de alguns minutos de sossego, devorando uma porção de batata frita, Beiço voltou à carga, isto é, disse num tom de voz que fez com que todo mundo se voltasse na nossa direção: “Hoje não quero o coração das putas, eu só quero a perereca!”.
Então eu providenciei nossa imediata retirada do bar. Foi um milagre o Geni, aquele enorme pit bull, não sair detrás do balcão empunhando seu bastão de beisebol.
(B. B. Palermo)

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