terça-feira, 28 de março de 2023

Pé de cana

 


Fazia um bom tempo que eu vinha

com o pé afundado no acelerador, 

aí fiquei puto comigo mesmo 

e decidi ouvir os conselhos do Cadelão. 

"Zé, saia da sombra desse pé de cana,

foge da zona de conforto, 

dance com teu Urso, pega o violão, 

vá pescar e te inspire,

o mundo aguarda ansiosamente 

o teu talento florescer ".

Bom mocinho, decidi pescar com o Marcão, 

expert dos movimentos da areia, 

dos peixes e dos ventos,

de política, história, música, poesia 

ou seja lá o que for.

O molinete estava agarrado ao chão, 

anzóis aguardavam ansiosamente 

a mordida do peixe grande.

Marcão evaporou todo apressado,

foi atrás de vodca, matambre e costela 

pra um assado.

Assumi o comando do molinete,

mas logo me distrai e fui bater papo 

com um grupo de senhoras marisqueiras,

que sonhavam deliciosos pastéis 

enquanto cavoucavam na areia.

A distração cobrou seu preço. 

O molinete balançou e vergou e foi arrastado

feito flecha para o mar.

Seria o sonho se realizando?

Finalmente fisguei o peixe tão desejado.

Bem do jeito como acontece nos meus sonhos,

eu cheguei atrasado,

a mim só restou a base que sustenta molinete, linha e anzóis. 

Gritei pra elas, com o troço na mão:

"Senhoras, vocês viram o que aconteceu?

Hoje fisguei o peixe sonhado,

mas não estava preparado!"

Não lembro se elas ficaram tristes

ou choraram de tanto rir. 

Bobinhas, passam a vida curvadas 

tirando da areia

toneladas de mariscos,

nunca viverão as aventuras 

de um velho pescador 

que duela com o mar.


(B. B. Palermo & Zé)

sábado, 25 de março de 2023

A genuína overdose

 


pingos me vinham

das calhas e

dos céus

e formavam córregos

e rios

correndo feito loucos 

até os oceanos


mas só havia pedreiras

pântanos 

e peraus 

dentro de mim


bêbado ou sóbrio

certo dia captei 

alguma beleza

amanhecendo 

e anoitecendo 

triste triste


hoje engatinho atrás 

da próxima dose 

e de alguns pingos 

que sejam o elixir 

da genuina 


overdose 


(B. B. Palermo & Zé)


terça-feira, 21 de março de 2023

Vem tormenta por aí

 


Ridículo ou engraçado, não sei.

O casal de velhinhos me viu na praia

meio curvado 

(movimentos suspeitos?)

anotando algo num papel. 

Espantaram-se, quando comentei:


ESTOU CAPTANDO IDEIAS NO AR.

VEM TORMENTA POR AÍ!


Pobres criaturas, 

logo partirão. 

Não terão o privilégio 

de cuspir 

pra bem longe

minha literatura. 


(B. B. Palermo)

terça-feira, 14 de março de 2023

Não é preciso tacar fogo na casa

 



Eu poderia estar contemplando a paisagem

pela janela de um avião 

a caminho da ilha de Fernando de Noronha, 

mas aqui estou me digladiando com a senhoria do cafofo. 

Tento vários disfarces pra entrar e sair 

com os latões de ceva.

Ela sabe tudo, 

é uma caninana cheia de truques. 

Me distraio mirando sua filha, 

uma baixinha com pernas bem torneadas. 

Ah, que pena, pouco tem ido à praia, poxa, o sol precisa retocar o seu bronzeado!

Tento manter relações amistosas com a senhoria.

Elogio as plantas "milagrosas" que ela cultiva junto ao prédio, 

próximas das janelas do cafofo.

À tardinha ela embriaga as pobrezinhas com uma mangueira,

e aí está um bom motivo pra correr pro boteco. 

Falando em plantas, o que me vem 

é o chá de Boldo,

o garotinho dá uns golpes abaixo da linha de cintura 

quase que diários 

na minha ressaca.

Tentei ser um bom homem,

nada de brigas com a dona,

instrui as minhocas que cavoucam na cabeça 

a focarem nas pernas tentadoras de sua filha.

Hoje o clima está ameno,

a senhoria prometeu me ensinar a apanhar mariscos na praia 

e preparar deliciosos pastéis, 

que ela jura serem tudo de bom.

Rapaziada, se me permitem um conselho,

nunca batam de frente com essas poderosas. 

Negociem, negociem...

Avancem 2 passos e recuem pelo menos 1.

Acredito que não é preciso 

tacar fogo na casa 

pra se livrar do cupim.


(B. B. Palermo)

quinta-feira, 9 de março de 2023

Não me chames em cima da hora



Meu bem, até parece que tu 

não delirou na adolescência, 

nem se dilacerou com algumas 

paixões. 

Até parece que tu não leu 

O Pequeno Príncipe, 

não copiou em letras de forma 

nos cadernos de escola 

as frases ditas pela raposa ao garoto, 

o personagem do Exupéry. 

Se queres me cativar, 

não telefone em cima da hora,

não estarei preparado, 

serei mais um dos tantos 

cadelões 

errando pelo mundo. 

Sem os dias agendados

à espera de tua doce mensagem,

estarei embriagado 

contando histórias engraçadas 

porque absurdas

pra outros bebados 

naquele bar de esquina,

voltado para o sol 

e o mar.

Baby, o amor quer 

ser fisgado 

por rituais,

até acontecer o milagre:

um sentir saudade 

do outro. 


(B. B. Palermo)

terça-feira, 7 de março de 2023

Lar

 


Foram 9 horas num ônibus,

e no caminho remoí o prazer

e o cansaço dos reencontros 

com amigos,

e também  as novidades,

fofocas e perplexidades.


Flanando por uma avenida 

do Texas

em direção ao lar

e ao mar,

respiro fundo 

e agarro a vida,

as alegrias e tristezas 

que terei 

pela frente.


Passei diante do cantinho 

onde se instalava o Arthur,

um amigo morador de rua,

e experimentei estranha dor -

não havia mais um lar.


Perdas são tsunamis,

e duvido que alguém esteja 

preparado.


Certo dia seu Arthur 

prometeu  

contar sua história

e por que ainda insiste 

que seu lar

sejam as ruas.


(B. B. Palermo)

quarta-feira, 1 de março de 2023

O intelectual orgânico

 


- Beiço, como minha literatura 

não rende likes,

pensei compartilhar vídeos 

no Tiktok

botando a mão na massa.

Sei lá, vou passar pra galera 

a imagem de que um intelectual 

de primeiríssima 

também deve sujar 

as mãos

nas batalhas 

do dia a dia. 


- Cadelão,  pelo visto 

tu não tem a mínima ideia 

de que existe uma linha 

que separa 

o ser ridículo 

do ser 

sublime.


(B. B. Palermo)

O PATIFE tá enrolando de novo

Quando fui acertar a conta no bar, pendurada nos últimos dias, o bolicheiro não encontrou, no caderno, o meu nome. Ao repassar a longa l...