sábado, 15 de junho de 2024
Ela levou minha carteira
terça-feira, 11 de junho de 2024
Sua alma está anos-luz à minha frente
Encontrei-a na praça.
Seu filho tomava sorvete
e escalava os brinquedos
e fez uma cara de surpresa
quando sua mãe me abraçou.
Todo encontro é um nascer ou pôr do
sol...
ou deveria ser.
Não a via há 3 meses.
Foi o suficiente para noivar,
conhecer outro sujeito
e rever o que sentia pelo noivo
e romper com ele e engatar nova
história...
até que o cara meteu-lhe o pé
no traseiro.
Ela ri de suas loucuras,
e saquei que isso é fundamental
para suportar a rotina insensível.
Vejo sua alma
anos-luz à minha frente.
Quis saber como anda minha vida.
Mais dramático do que cômico,
falei que não tenho medo de morrer,
mas tanta gente boa e talentosa nos
deixando
me traz um desejo ansioso
pra que meu livro saia logo.
Era o momento da despedida,
antes do papo ficar sem graça.
Beijei sua testa,
desviei do seu rosto
que explodia de vida e tesão
e segui, melancólico,
o meu caminho.
(B. B. Palermo)
quinta-feira, 6 de junho de 2024
Poesia Nelore
Relaxa, Cadelão!
Você não está escrevendo
o último poema ou história
de tua vida.
Vem mais por aí.
Não pense antes,
deixe o fluxo rolar
e a mão correr leve
e solta
como se fosse um boi
Nelore
às vésperas
de escapar
do brete.
(B. B. Palermo)
domingo, 2 de junho de 2024
Adeus papai
Garota, nossos destinos têm pernas bambas
e percorrem umas trilhas
nada paralelas.
Veja bem, você não leu Schopenhauer
nem Hannah Arendt, e você fala do Nietzsche
de um jeito até engraçado,
mas pede pra que repita N vezes
histórias das “Mil e uma noites”.
Você diz que os comunistas são estranhos,
mas não leu uma página sequer de Marx e Engels.
Não cheguei lá, no máximo sou masturbador
compulsivo e anarquista,
mas eu tenho bom coração - podes crer -,
penso em salvar muitos garotos do crack
e princesinhas da gravidez precoce,
e consigo comprar, no mercado paralelo,
alguns tubos de oxigênio.
Garota, liga não.
Sou uma figura que às vezes se surpreende
com suas milongas pirotécnicas ou –
sendo mais direto – seus fiascos.
Hoje tentei convencer um garoto, torturado pelo pó,
a matar seu pai, inspirado no Complexo de Édipo.
Logo me dei conta de que poderia ter acionado
uma bomba-relógio.
Então, disse-lhe que Édipo é um mito antigo,
e foi usado pelo sacana do Freud para explicar
os conflitos entre pai e filho, na infância.
Não sei não. Talvez, dia desses,
seu pai já era.
(B. B. Palermo)
Se você quiser, eu viro monge
Pra me conquistar, baby,
você devia me devorar
com outra afinação.
Teus gritos numas notas
previsíveis
ainda vão me hospedar
num mosteiro.
Leia poemas da Adélia,
contos da Clarice
e esfregue na minha cara
canções do Chico e do Vinícius
e diga pra todo mundo
que sou poetinha
decadente,
um pecador
e punheteiro.
Tu só fala de gatos
e cachorros
e tios e avós
e bisavós e tataravós
e suas epopeias de imigrantes,
e eu tenho certeza que eles
não conseguem
ser ao menos
fantasmas
disfarçados
de faróis
a me guiar.
(B. B. Palermo)
sexta-feira, 5 de abril de 2024
O PATIFE tá enrolando de novo
Quando fui acertar a conta no bar,
pendurada nos últimos dias,
o bolicheiro não encontrou, no
caderno, o meu nome.
Ao repassar a longa lista de devedores,
encontrou um nome
que não servia de chapéu pra ninguém.
Era, simplesmente:
PATIFE!
Questionou o seu garçom adolescente,
e ele me apontou.
Todos no bar tiraram onda comigo.
Fiquei chocado.
Sou o psicólogo, o psiquiatra e
orientador vocacional
desse bando de maluquinhos
desnorteados que bebem
sem saber por qual
motivo, e eles me veem assim?
PQP!!
Eis que o Ninja ‒ um
andarilho que junta sucata ou, diga-se,
que não se importa
em recolher a merd* de lixo
que todo o santo
dia nós depositamos nas ruas ‒
foi ao banheiro e,
ao retornar, olhou fundo nos meus olhos,
e indagou:
‒ Palermo, hoje tu
vai falar de filosofia ou de poesia?
Desenvolvi uns
argumentos dignos de sua vida cotidiana
e me pareceu que
ele embarcou na minha viagem (pelo menos
ficou uns 2 minutos
me escutando...).
Pra conduzi-lo a um
espaço aonde o ar é mais leve,
arrematei:
‒ Garoto, cada um de nós ziguezagueia
às vezes chutando e
às vezes tropeçando
nas perdas do caminho.
Numa rotina
solitária, vamos bater de frente
e aprender com a
resistência do ar:
os beijos e
cusparadas e tapas
que levarmos da
realidade.
No mais, caro
Ninja, são cálculos, métodos, conceitos e fórmulas
criadas pra nos
encurralar e encaixotar e jogar numa vala comum
num cemitério
qualquer.
Ali por perto, ouvindo
a minha falação,
o imprestável do garçom
(que pede ajuda pra calculadora
até pra somar 7 + 7)
comentou, num riso indisfarçado:
‒ Esse PATIFE tá
enrolando de novo!
(B. B. Palermo)
sexta-feira, 29 de março de 2024
Algo aleatório
Foi incrível ouvir a moreninha segredar:
‒ Quando perco o sono, às 3h da
manhã,
abro aleatoriamente o livro
“Chutando as pedras da calçada”
e começo a viajar!
Perguntei-lhe então se essa experiência
se parecia com a de fumar uma canabbis
pra logo voltar a dormir,
e ela caiu num ataque de risos.
Bastou dizer-lhe, de um jeito meio agoniado
‒ Obrigado, anjo, por me enxergar! ‒,
que os copos dançaram sobre na mesa
e se espatifaram no chão.
(B. B. Palermo)
quarta-feira, 20 de março de 2024
O crepúsculo de Van Gogh
As nuvens eram criaturas selvagens
e ‒ ao mesmo tempo ‒ gatos,
cães, jacarés e lagartos,
perfilados no horizonte
próximo.
piscaram-me o olho
exibindo umas gravatas
que pareciam hieróglifos
enfeitados com figuras
geométricas.
Intuí que a paisagem
aguardava tintas, pincéis
e cavaletes
do Van Gogh,
mas o gênio se entorpecia
de Absinto na taberna,
e nuvens escuras vertiam de seus
olhos,
chorando
o entardecer.
Quando implorei
‒ DEUS, FAÇA ALGO! ‒ ,
espremendo meus olhos contra o
infinito,
ele advertiu:
‒ Menino, NÃO SE PODE fazer nada,
esquece!
É só mais um crepúsculo,
a ordem e o caos amando,
a luz e as trevas duelando!
(B. B. Palermo)
quarta-feira, 13 de março de 2024
Novo homem!
Grãos de areia interditaram meus
olhos
nesta quarta-feira de tarde,
bastou umas calcinhas no varal
tomarem banho de sol
e ousarem me decifrar
com seus olhares
insinuantes.
As libertinas acertaram o coração
do meu Calcanhar de Aquiles
e despejaram em lixeiras os meus
planos e promessas
de mudar de vida.
O slogan, era:
Agora vai! Atividades físicas
regulares,
boa alimentação e emancipação das
bebidas!
Aposto que as diabinhas não ocupavam
o varal
por acaso!
Fito-me diante do espelho
e ouço a gargalhada ‒ parece uma
caturrita
comemorando um prêmio de loteria.
O som é o mesmo da máquina de lavar
roupas,
batendo, pulando...
Imediatamente, lembro do Padre
Alfredo,
nos tempos da adolescência, nas
missas de domingo.
O pirotécnico mirava os olhos da
garotada
e erguia o tom,
profetizando:
“Novo homem!
Novo Homem!
Novo homem!”.
Aqui no banheiro, o padre já não
esbraveja.
Apenas ri, feito caturrita de batina.
Ri com vontade, até minha imagem
embaçar.
(B. B. Palermo)
domingo, 10 de março de 2024
Máquina
Muitos encharcam com gasolina até as bordas
de suas máquinas.
Troco tamanho esforço e rego com cerveja esta
carcaça.
Não sou máquina, não tenho tamanha pressa.
Humano ‒ mais pessimista do que otimista ‒ ainda
dou manivela nos dias com o tal do livre arbítrio.
Poderia canalizar energias pra ganhar dinheiro,
ou passar cera e polir meu carro pra conquistar um brotinho. Mas não sou máquina modelo: saio por aí no piloto
automático, e não faço grande coisa se ninguém der a partida.
Tenho sede do caralho, como se fosse Camaro ou
Fórmula Um.
Porém, tenho outras sedes. Escutar ‒ pelos
cantos do mundo ‒ bêbados, traídos, travestis e prostitutas. Saber tintim por
tintim os motivos do traficante e do dependente, do lazarento e do alcoólatra.
Das velhas e velhos devassos, que à luz do dia tudo sabem sobre o tempo, a
moral e os bons costumes, esportes e loterias, e à noite dormem pesado após uma
trepada servil.
Quero ouvir as ninfas, tão jovens e carentes de
orgasmo. Sem apelo científico, digo que o gozo é divino, que b* não é órgão, e
sim porta de entrada ao jardim do Éden, e nos acolhe e afaga e aquece muito
mais que droga ou bebida.
Tenho muitas outras sedes.
Hoje bebo num cantinho escuro dum posto de
gasolina. Frentistas, com total simpatia nas calças legging, se esforçam pra
dar conta do recado.
Próxima do chão, na banda oeste, sorriso voltado
pro alto, vejo a carinha da lua. Não sei se ela é nascente ou minguante, sei
apenas que é cúmplice com esse jeitinho inocente.
Li que aumentou neste ano nossa dívida com o
planeta. Seu esgotamento é irreversível. Sofro pelo futuro de meus netos. E a
internet está uma festa, fala, fala e repete dos meteoros que descerem e
daqueles que virão.
Acabou a distração. Uma garotinha, p* metida a coach, me ordena pra que saia da
zona de conforto, mas não embarco nessa, não, meu irmão!
Putz... Eis que surge um amigo tristinho, diz
que vai mal o seu amor. Como não sou máquina, sua história me derruba, dá
vontade de chorar.
Me chamam Cadelão porque gosto de ouvir. Minhas
orelhas estão pra cima, como cachorro atrás de fêmea no cio, louco pra saber o
que todos gostariam de contar, das aventuras e tragédias, do antes, durante e
depois.
Pareço com todo mundo: boto fé, mas desconfio,
da humanidade e do amor.
(B. B. Palermo)
segunda-feira, 4 de março de 2024
Kafka entre nós
Estava num desses bares e
vi, pela calçada, passos inseguros, ofegantes...
‒ Caramba! É o Kafka!
Vinha num estado lastimável,
acho que bem pior que o meu.
A bichinha olhou-me nos
olhos e, ágil, mudou de rota, libertando-me do embaraço da troca de olhares.
Num lampejo, um pensamento
estranho ‒ que surgiu não sei de onde ‒ me perguntou:
‒ A POESIA NÃO MORREU?
Nisso, um casal e um menino
saíam do bar e quase pisotearam a criatura repulsiva que ousara atravessar o seu
caminho.
Não consigo entender, e isso
desperta uma puta inveja:
como pode o Kafka continuar
mais vivo do que nunca, mesmo sabendo que já faz 100 anos que ele partiu?
(B. B. Palermo)
Sonhe alto
Apressado, entrei num banheiro químico junto à praça e aos bares e levei um susto: quem me encarava, de lá debaixo, era o abismo...
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Nada a ver, menino! Baratas, sobreviventes neste planeta há 6 milhões de anos, passeiam pela sala cantarolando um samba do “Demô...
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Garota, nossos destinos têm pernas bambas e percorrem umas trilhas nada paralelas. Veja bem, você não leu Schopenhauer nem Han...