Uma garota cruzou de bicicleta
com sua filhinha na garupa.
Pedalava em direção ao sol
do entardecer.
Ia serena e esperançosa,
e a menina segurava
uma flor.
(B. B. Palermo)
Uma garota cruzou de bicicleta
com sua filhinha na garupa.
Pedalava em direção ao sol
do entardecer.
Ia serena e esperançosa,
e a menina segurava
uma flor.
(B. B. Palermo)
Cambaleantes, latões numa mão,
a outra segurando a caixa térmica
das bebidas,
os caras retornam da praia à tardinha.
Suas esposas enormes e sérias
e narizes empinados
debulham ladainhas
e seguem na frente,
indicando o caminho.
As crianças, bem nutridas
e com algum tédio,
caminham lentamente.
Diante dos sujeitos embriagados,
empurrando seus porres
e casamentos e férias,
é impossível não me perguntar:
Será que um dia eu chego lá?
(B. B. Palermo)
Seja leve, 2023,
como um garoto
zen budista
que ensina
a esperar
o que era pra ter sido
e quase foi.
Seja bom garoto, 2023,
continuo
a esperar.
(B. B. Palermo)
Dizia pro garoto:
Tu é 30 e poucos anos mais jovem
do que papai,
e tem mais juízo do que ele.
Tudo bem.
Cada um percorre e constrói
o seu próprio caminho,
mesmo que habitemos
o mesmo hospício.
(B. B. Palermo)
Quando as panturrilhas doem,
o coração não vai bem.
O fígado, ah, esse pobre coitado, deve estar num farelo,
preciso dar uma olhada nele.
O médico falava dos meus órgãos,
como se fosse mecânico falando de carburadores,
vazamento do radiador ou qualquer outra peça desregulada.
Cretinos invadem nossa vida
como se fossem moscas em dias de calor e umidade
e copos de cerveja pela metade
azedando sobre a mesa
de um dia para o outro.
Tantos pitacos,
vontade de fugir,
e não suporto bares vazios,
é terrível encarar a mim mesmo
diante do espelho
do banheiro.
Beira a doentio ouvir velhos papos,
futebol,
política,
negócios...
o mesmo de sempre.
Algo está errado.
Não consigo me afastar desses cretinos previsíveis.
Deve ser a idade ou força do hábito,
que nos leva a perguntar do coração,
rins,
próstata,
fígado e tals...
como se perguntasse da saúde dos cães e gatos e das amantes.
Escrotinhos, eu sei o que se passa:
temos medo de morrer.
(B. B. Palermo)
O povo que circula em Texas Beach
tem comido tanto...
Gente, é um apetite insano,
até as gôndolas dos mercados
contendo papel higiênico
esvaziaram.
Aí eu me locupleto:
Pra onde vai toda
essa merda?
À noite sonho,
deliro,
tenho pesadelos,
e neles estou na praia
portando faixas,
cartazes,
pedindo que fechemos as bocas
e esvaziemos as panças.
(B. B. Palermo)
Cães órfãos,
nessas festas
de Natal e Ano Novo
exibimos nossos
rabos
como se fossemos
presunto
ou cerveja
anunciados
em comerciais
de TV.
(B. B. Palermo)
Ninguém é o Cara! em sua própria morada
Conduzo meu pet,
aplaudo as frases
que dão autoria a Shakespeare, L. F. V.,
Clarice Lispector e Quintana.
Frequento grupos de assistência social,
sou cara do bem,
sou zen, eclético e
metódico,
enfim, faço meu teatro.
Nada disso me define
porque não conheço nem domino meus demônios.
Posso agarrar as muletas de Descartes
gritando aos 4 ventos que se
Penso então sou,
ou lamber o saco do Freud
usando como desculpa
pras cagadas diárias que
O sujeito não é o senhor em sua
morada.
O que importa é que somos especialistas em
Eu finjo,
tu finges,
ele finge,
nós...
(B. B. Palermo)
bêbados gostam de tocar
abraçar
acariciar
uns carentinhos
que adoram cães abandonados
circulando próximos
aos bares
animaizinhos
bem alimentados
com olhar mais leve
e alegre
do que os pobres
que estão vigiando
pátios
(B. B. Palermo)
Parece patético, eu sei,
mas estou sem papel
para aprisionar alguma
assombração
que rondar a mente.
Papel higiênico tem,
papel de parede
no cafofo também tem,
inclusive guardanapos.
Papelões de conhecidos doidos fazendo cócegas
em meus poemas,
nem se fala.
Restou o calendário
de 2022 que a senhoria
pendurou
na parede da sala.
Como o ano está findando,
reservei suas folhas
para rabiscar eventos hilariantes
que vivi
e os papelões que colecionei,
e que um dia saberei se foram
fundamentais
em minha história.
Vontade de rir ou chorar
eu tenho de montão,
muito mais do que os estoques
de folhas em branco que possa
comprar.
(B. B. Palermo)
Pessoas enlouquecidas,
vespas foram expulsas por tochas de fogo,
criaturas gritam exageradas
e até desesperadas
uns bullyings sofridos na infância.
Fãs de inteligências "superiores",
lembram e idolatram Hitler,
e odeiam os que leem livros.
Dizem que Machado de Assis, ao escrever Dom Casmurro, sabia Com certeza! que Bentinho
foi chifrado por Capitu.
Quando cheguei no bar
e o maluco veio em minha direção,
o garçom falou:
Não entre na paranoia dele,
é um louco!
Mas se você quer criar boas histórias,
tipo as do Nelson Rodrigues,
então preste muita atenção.
(B. B. Palermo)
No Instagram, me deparo com uma entrevista de um psiquiatra falando a respeito de uma droga ministrada a pacientes terminais, desenganad...