Dizia pro garoto:
Tu é 30 e poucos anos mais jovem
do que papai,
e tem mais juízo do que ele.
Tudo bem.
Cada um percorre e constrói
o seu próprio caminho,
mesmo que habitemos
o mesmo hospício.
(B. B. Palermo)
Dizia pro garoto:
Tu é 30 e poucos anos mais jovem
do que papai,
e tem mais juízo do que ele.
Tudo bem.
Cada um percorre e constrói
o seu próprio caminho,
mesmo que habitemos
o mesmo hospício.
(B. B. Palermo)
Quando as panturrilhas doem,
o coração não vai bem.
O fígado, ah, esse pobre coitado, deve estar num farelo,
preciso dar uma olhada nele.
O médico falava dos meus órgãos,
como se fosse mecânico falando de carburadores,
vazamento do radiador ou qualquer outra peça desregulada.
Cretinos invadem nossa vida
como se fossem moscas em dias de calor e umidade
e copos de cerveja pela metade
azedando sobre a mesa
de um dia para o outro.
Tantos pitacos,
vontade de fugir,
e não suporto bares vazios,
é terrível encarar a mim mesmo
diante do espelho
do banheiro.
Beira a doentio ouvir velhos papos,
futebol,
política,
negócios...
o mesmo de sempre.
Algo está errado.
Não consigo me afastar desses cretinos previsíveis.
Deve ser a idade ou força do hábito,
que nos leva a perguntar do coração,
rins,
próstata,
fígado e tals...
como se perguntasse da saúde dos cães e gatos e das amantes.
Escrotinhos, eu sei o que se passa:
temos medo de morrer.
(B. B. Palermo)
O povo que circula em Texas Beach
tem comido tanto...
Gente, é um apetite insano,
até as gôndolas dos mercados
contendo papel higiênico
esvaziaram.
Aí eu me locupleto:
Pra onde vai toda
essa merda?
À noite sonho,
deliro,
tenho pesadelos,
e neles estou na praia
portando faixas,
cartazes,
pedindo que fechemos as bocas
e esvaziemos as panças.
(B. B. Palermo)
Cães órfãos,
nessas festas
de Natal e Ano Novo
exibimos nossos
rabos
como se fossemos
presunto
ou cerveja
anunciados
em comerciais
de TV.
(B. B. Palermo)
Ninguém é o Cara! em sua própria morada
Conduzo meu pet,
aplaudo as frases
que dão autoria a Shakespeare, L. F. V.,
Clarice Lispector e Quintana.
Frequento grupos de assistência social,
sou cara do bem,
sou zen, eclético e
metódico,
enfim, faço meu teatro.
Nada disso me define
porque não conheço nem domino meus demônios.
Posso agarrar as muletas de Descartes
gritando aos 4 ventos que se
Penso então sou,
ou lamber o saco do Freud
usando como desculpa
pras cagadas diárias que
O sujeito não é o senhor em sua
morada.
O que importa é que somos especialistas em
Eu finjo,
tu finges,
ele finge,
nós...
(B. B. Palermo)
bêbados gostam de tocar
abraçar
acariciar
uns carentinhos
que adoram cães abandonados
circulando próximos
aos bares
animaizinhos
bem alimentados
com olhar mais leve
e alegre
do que os pobres
que estão vigiando
pátios
(B. B. Palermo)
Parece patético, eu sei,
mas estou sem papel
para aprisionar alguma
assombração
que rondar a mente.
Papel higiênico tem,
papel de parede
no cafofo também tem,
inclusive guardanapos.
Papelões de conhecidos doidos fazendo cócegas
em meus poemas,
nem se fala.
Restou o calendário
de 2022 que a senhoria
pendurou
na parede da sala.
Como o ano está findando,
reservei suas folhas
para rabiscar eventos hilariantes
que vivi
e os papelões que colecionei,
e que um dia saberei se foram
fundamentais
em minha história.
Vontade de rir ou chorar
eu tenho de montão,
muito mais do que os estoques
de folhas em branco que possa
comprar.
(B. B. Palermo)
Pessoas enlouquecidas,
vespas foram expulsas por tochas de fogo,
criaturas gritam exageradas
e até desesperadas
uns bullyings sofridos na infância.
Fãs de inteligências "superiores",
lembram e idolatram Hitler,
e odeiam os que leem livros.
Dizem que Machado de Assis, ao escrever Dom Casmurro, sabia Com certeza! que Bentinho
foi chifrado por Capitu.
Quando cheguei no bar
e o maluco veio em minha direção,
o garçom falou:
Não entre na paranoia dele,
é um louco!
Mas se você quer criar boas histórias,
tipo as do Nelson Rodrigues,
então preste muita atenção.
(B. B. Palermo)
Numa
das artérias principais da cidade,
um
Ford T 1929 (primeiro carro do meu finado pai),
passou
exibindo um Papai Noel magrinho,
constrangido,
vestindo
roupa vermelha.
Foi
sorte haver pouca gente na rua.
Seria
terrível ver o pobre
ser
bombardeado
por
pedras arremessadas
por
patriotas
enlouquecidos.
(B. B. Palermo)
Última
semana por aqui,
estou
me despedindo das coisas.
Olho
pra geladeira e lembro dos latões de cerveja
que
"explodiram" no seu congelador, nas madrugadas,
deixando
um rastro de manchas nas partes internas
de
suas portas.
São
várias as tatuagens do fogão,
manchas
de gordura, panelas quase queimando,
enquanto
o ridículo cochilava embriagado no sofá.
Há
centenas de marcas também na mesa de madeira,
afinal
ela está comigo faz umas 3 décadas.
Nela
eu estudo, eu como e bebo.
A
cama, idem. É incrível como ela sobrevive,
basta
bater uns pregos e apertar os parafusos
da
cabeceira.
O
guarda-roupa é o soberano do quarto,
tem
uma parede só para si,
e
reclama que foi pouco lustrado, teve pouco brilho,
embora
nunca tenha sido atacado pelos cupins.
A lareira me acompanha há umas 2 décadas e meia.
Sem
ela, as noites de inverno seriam terríveis
para
o poeta.
4
estantes guardaram os livros, uns bons,
outros
ruins e outros mais ou menos.
Fiz
questão de colocar os meus, "publicados",
junto
aos livros do Dostoievski, do Hemingway
e
do Bukowski.
O
maluco que agora se despede
nunca
foi internado em clínicas psiquiátricas,
não
lembra se um dia usou drogas,
tem
visão e audição em razoável estado de conservação,
tamanha a sua idade.
Acelera, Cadelão!
(B.
B. Palermo)
Pena que Alice não sabe
que
nos conhecemos
no
País das maravilhas.
Perdeu
a memória
e
diz que em toda a sua vida
foi
uma diarista.
Chora
o aluguel atrasado,
os
crediários e mais um fim de ano
que
se aproxima.
Suas
paixões adolescentes já faz um bom tempo
que
foram esquecidas.
Alice
é plena,
em
seus olhos pulsam oceanos
de
vida.
Alice
não sabe, e isso é uma pena,
que
tem o poder de desatar os nós
em
que me enredei
durante
toda a minha
vida.
(B.
B. Palermo)
As pessoas por perto pareciam murchas, daquele jeito, de ideias, uns sonâmbulos, e cansei também de trocar confidências com os cães ...