quinta-feira, 21 de julho de 2022

O gato Américo


 

Perguntei pro meu amigo,

o tutor do gato Américo,

se o bichano era eu.

Fiquei confuso

e também feliz da vida

ao perceber que o gato e eu

temos a mesma cara

e o mesmo nome.

Se um dia rolar encrenca

eu mudo de nome

e geografia.

Serei o pai do Palermo

ou seu irmão gêmeo

morando na

Sicília!


terça-feira, 19 de julho de 2022

Anotações em guardanapos assistindo futebol na TV do bar

 

Ao empinar o copo de cerveja,

o Betão empina junto o dedo mindinho.

Não sabemos se é uma questão de etiqueta, de coordenação

ou se ele está se exibindo pras gurias.

Toda vez que o Cesinha corre pra calçada fumar,

o time faz um gol.

No intervalo, na calçada diante do bar,

se dizemos uma frase de efeito                      

ele canta desafinado uma canção.

A estatística não nos engana:

90% das vezes que o Elson vai pro banheiro mijar,

o time recua as linhas e leva um sufoco do adversário.

O Telmo é multitarefas.

Consegue olhar o jogo na TV,

escutar o jogo de outro time no celular

e ainda servir cerveja pra um bando de malucos barulhentos.

Toda vez que passa um jogo do Grêmio,

o Pedro Byke, numa tranquilidade impaciente,

pergunta se vai passar o jogo do Inter.

Se tem uma coisa que ferve sua adrenalina,

mais do que a performance do Inter

ou uma jogada de craque nos jogos na Afucotri,

é a véspera do resultado do Jogo do Bicho.

Quando o Grêmio está com deficiente poderio ofensivo,

o seu Ivo reclama indignado, do técnico:

"Por que não bota os lebreiros?!"

Como a maioria de nós que está no bar tem muita rodagem,

quando os caras vão a toda hora no banheiro mijar

nos perguntamos se eles têm problema na próstata

ou se é a ceva que é diurética.

O Pedro Borges não debate geometria,

filosofia,

astronomia

ou até metafísica

com tanta desenvoltura no departamento da universidade onde trabalha

como acontece no bar.

E os debates esquentam nos momentos

em que o jogo está mais tenso.

Perguntaram ao João Grandão se o Carleone  

(que tirava um cochilo debruçado na mesa dum cantinho do bar)

tem problemas com álcool, e ele respondeu:

"Claro que não! Só quando falta!".

 

(B. B. Palermo)


domingo, 17 de julho de 2022

É muita emoção, cara!

 Véio, tu tem que assistir

os jogos do Grêmio

no bar do Telmo.

Me aparece cada figuraça

que tu nem imagina.

Meu, tu precisa entrar no clima,

quer dizer, beber uns litrão,

porque estando sóbrio

tu não te diverte.

Lá aparece gremista pra tudo quanto é gosto:

tem os ressentidos,

os que fazem uma misturança e com(fusão)

entre futebol e política,

tem os fãs do técnico atual,

tem os desconfiados

e tem as viúvas do Renato...

e por aí vai...

É muita emoção, cara!

 

(B. B. Palermo)


sábado, 2 de julho de 2022

Uma noite qualquer

 

Você debulha ladainhas

de amenidades

e até me encanto mas

canso

e respiro

compassado

como um craque em meditação

transcendental

e então mais calmo

devolvo amenidades

monossilábicas

e depois de tantas insignificâncias

descobrimos os abraços

e as mãos se entrelaçam

e as turbinas enlouquecem

e o tesão deixa um rastro de quero mais

e isso é tudo

tudo tão banal.

 

(B. B Palermo)


Sujeito comum

 

Você não admite

ser catalogado

como sujeito comum.

Você pretende ser lembrado

como O Cara!,

alguém que por aqui passou

e espalhou diversas sementinhas

que vingaram.

Claro, há uns tropeços previsíveis,

aquela desconfiança de que talvez

essa vida não tenha sentido

algum.

Determinado, você se esforça em acreditar

numa farta colheita,

A RECOMPENSA no paraíso.

E os outros?

Ah, os outros... Os outros que se danem!

Você não embarca nessa

de que estamos todos

dentro de um saco de gatos

levando pancadas

diárias.

Dizem do teu livre arbítrio,

dizem da evolução necessária do teu ser,

mas receio que essa é uma bela ilusão,

uma ideia prostituída e sedutora

que inevitavelmente

nos seduz.

 

(B. B. Palermo)


sexta-feira, 1 de julho de 2022

deus não liga pra isso


a ninfa atravessa a rua

sabendo o poder

que tem

leveza

beleza

juventude

energia transbordando em cada

poro

enquanto isso

as coroas

sentadas no bar

manuseiam celulares

como se fossem chocas

bicando grãos de milho

espalhados pelo chão

 

deus está vendo tudo

deus se diverte pra caralho

deus não liga pra isso

não

 

(B. B. Palermo)


quinta-feira, 30 de junho de 2022

Nem tudo está perdido


Corpos e seus músculos

salientes

me distraem das belezas do mundo.

Minhas retinas se embaralham

como arco-íris camuflados

diante das escolhas

dos irmãos.

Mas nem tudo está perdido:

os fantasmas das sombras projetadas nos muros

pelo casalzinho que passa diante do bar

me são familiares.

 

Robôs saem das academias

segurando garrafas

toalhas

e mochilas,

movendo-se no ritmo da                

"força,

vontade e

determinação!".

A busca da perfeição

estética,

narcísica e

patética

é a cortina de fumaça que impede que percebam

o poeta

numa mesa de bar

contemplando

e se embriagando

 

com o pôr do sol.

 

(B. B. Palermo)


domingo, 26 de junho de 2022

Hello, garotas reais!


Mordo o sanduiche

enquanto assisto um vídeo

que um amigo enviou

de uma puta gostosa

e nua

rebolando diante de um sofá.

A legenda diz:

"Vendo este sofá!"

Peitos e bunda turbinados,

tatuagens distribuídas pelo corpo

bronzeado.

Toneladas de conteúdo

e eu não preciso pensar nisso.

Apenas curtir.

Mas eu penso, e comparo o vídeo da deusa

com laranjas

e maçãs

e bananas

que repousam imóveis na fruteira

sobre a mesa.

Coisas

coisas

coisas.

Hello, garotas reais,

vinde a mim,

despenteadas

estressadas

com olheiras

e uma puta fome

de amor!

 

(B. B. Palermo)


sábado, 25 de junho de 2022

Aloprações assistindo futebol na mesa de um bar


Cheguei no bar no intervalo do jogo do Grêmio.

Fazia 2 dias que, pela enésima vez,

havia tomado a decisão de mudar de vida:

fazer dieta, ser um quase vegano

e quase minimalista,

e me afastar do copo.

Meus planos eram claros, cartesianamente falando:

usar de minha Razão para alcançar o equilíbrio,

sem ser influenciado por pastores ou padres ou coaches,

eu sei aonde essa cambada quer chegar,

falando de disciplina, ordem e prosperidade.

O Grêmio perdia por 1 a 0 pro CSA,                                         

os malucos continuavam zonzos em campo

e o Cesinha mamava o litrão de Brahma

e corria pra calçada fumar

e rosnar contra o time.

No início do segundo tempo chegou no bar o Alopradovski,

torcedor doente pelo Grêmio e com idade mental

de uns 9, 12 anos.

Nos últimos jogos do time ele escolheu o técnico

como seu inimigo número 1.

Eu me via diante do seguinte dilema:

as pessoas se tornam alopradas porque torcem

pra um time aloprado,

ou é o contrário?

O demente xingava e torcia contra o time,

e todos no bar não compreendiam este absurdo:

como pode o cara torcer contra o time do coração

por não gostar do Roger Machado e ser apaixonado

pelo Renato Portaluppi?

Olhei para o lado, umas garotas devoravam seus lanches

num semblante apavorado, olhei pro Cesinha e visualizei

seu perfil de sujeito sanguíneo prestes a enfartar.

Em silêncio me perguntei se nos próximos anos

conseguiria juntar dinheiro suficiente

para comprar uma passagem só de ida                      

a Marte.


(B. B. Palermo)


terça-feira, 21 de junho de 2022

O Nirvana é ouro


No dia seguinte

o garoto encontrou

sua caneta esfarrapada

no bolso da calça,

junto a uma folha em branco,

toda amassada.         

O sujeito do bar disse pra todo mundo

que ele saíra de madrugada do bar,

flanando pela avenida

como um bailarino

bêbado.

O garoto não liga pras fofocas.

Ele não leva a sério esses malucos,

muitos deles viciados,

que dizem que se redimiram

porque encontraram Jesus,

bíblias debaixo do braço,

escrevendo versículos

e provérbios

nas paredes dos bares.

O garoto sabe que o Nirvana é ouro,

e sabe de onde não vem

e de onde vem

a sua libertação:

nenhuma culpa

das recaídas

e tombos

e fiascos

que costumamos fazer.                                           

Para o garoto,

O voo mais elevado,

num espaço e tempo transcendental,

pode resultar

(por que não?)

de uma queda etílica

ao retornar do bar para casa

numa madrugada

qualquer.

 

(B. B. Palermo)


quinta-feira, 16 de junho de 2022

Babacas ou gênios, não sei


Sonhamos com prazo

de validade

parecido ao dos parafusos,

arruelas e porcas.

Até nos assemelhamos,

produzidos em série,

aos milhões,

expostos nas vitrines.

Seres uniformizados,

nos repetimos em todo lugar,

carne de segunda passando pelo triturador.

Seres em ordem unida,

me fazem lembrar as fileiras

de lápides

esquecidas nos cemitérios.

Sonhamos que somos indestrutíveis,

que duraremos mais do que plástico,

seremos de vidro,

lutando bravamente para não sermos decompostos

pela natureza.

babacas ou gênios, não sei.

Queremos esquecer que somos de

carne,

nossa validade é pura ilusão.

Sonhamos que vamos nos reconciliar com a natureza,

sonhamos que vamos deixar algumas

sementinhas.       

Cético a isso tudo,

encho meu copo,

apanho outra folha em branco

e sigo proseando

 

sozinho.

 

(B. B. Palermo)


Ele já estava lá

  As pessoas por perto pareciam murchas, daquele jeito, de ideias, uns sonâmbulos, e cansei também de trocar confidências com os cães ...