Canalizaram a água
da cachoeira
man-sa-men-te
formou-se um lago
fez bem e estragos
o que sei,
que agora guardo
são margens e leito
o meu abrigo.
Em meio aos mandamentos
do mundo
faço o dever de casa
Pela manhã
obedeço a Deus
e no final do dia
recolho na poupança
meus pecados.
segunda-feira, 15 de novembro de 2010
sábado, 13 de novembro de 2010
DESPEDIDA
Enfim, despedimo-nos
da infância.
Depois do parque
do circo e da praça
doamos a fantasia
aos irmãos mais novos.
Agora
nos emprenstam
vergonha
se ficamos nus.
Passam os dias
e todos aguardam
para que prendamos a rebeldia
nos porões do coração.
Mas a liberdade, alucinada,
acena por detrás dos muros...
Repetem, repetem,
os mais velhos:
- Vamos olhar pra frente
e viver a nossa idade!
Enquanto isso
nossos desejos mais profundos
brincam de esconde-esconde
nos labirintos da saudade!
quinta-feira, 11 de novembro de 2010
Pejuçara - Escobar Nogueira
O jornal publicou os finalistas do 16º prêmio Açorianos de literatura. Corro os olhos para ver quais os indicados, em quais categorias. Detenho-me em Poesia.
Não é que o Escobar Nogueira, com o livro Pejuçara, é um dos indicados ao prêmio?
Conheci o Escobar em fevereiro de 2010. Conversei com ele no dia em que ele fez uma palestra para os professores municipais, na abertura do ano letivo, no município de Ijuí/RS.
Extrovertido, simpático, como o é um professor de cursinho pŕe-vestibular. Após a palestra ganhei seu livro, autografado, de presente. Cheguei em casa, coloquei o livro na estante, mas não dediquei o tempo suficiente, que ele merecia, para desfrutar de sua companhia.
A questão que me faço, agora, é: por que damos valor às coisas só depois que elas se tornam conhecidas/reconhecidas?
Hoje, após saber de sua indicação ao prêmio, lí o livro com afobação. Vou ter muito tempo, nessa época do ano, para lê-lo e relê-lo, bem devagar, como toda poesia merece.SLOW CITIES
Eu,
o cachorro,
o trator,
tudo vai devagar.
Como não lembrar
do poema do Drummond?
Itabira,
Pejuçara,
cidadezinha qualquer,
onde não é preciso correr
pra viver,
nem pra morrer.
terça-feira, 9 de novembro de 2010
Sina
Obedientes
ao mundo
as pombas
ciscam.
Amanhã
o mundo pode
ruir...
Tudo precisa ser feito:
arrumar o ninho
por ovos, chocar...
O destino ordenou
para ter pressa
que a vida vale
o entardecer.
Observo a sina
atrás da cortina
da janela
choca-me a corrida
desigual:
sou pombo
que não tem asas
para fugir.
domingo, 7 de novembro de 2010
Gata
Ela é toda
ardilosa
com sorrisos
e guizos
caninos
molares
me paralisam
ela é dona
do pedaço
que mandou
meus sonhos
pro espaço
o espaço
confunde
na porcentagem:
100% felicidade
ou 100% realidade?!
sexta-feira, 5 de novembro de 2010
Pai não entende nada - L. F. Verissimo
-Um biquíni novo?
-É, pai.
-Você comprou um no ano passado!
-Não serve mais, pai. Eu cresci.
-Como não serve? No ano passado você tinha 14 anos, este ano tem 15. Não cresceu tento assim.
-Não serve, pai.
-Está bem. Toma o dinheiro. Compra um biquíni maior.
-maior não, pai. Menor.
Aquele pai, também, não entendia nada.
segunda-feira, 1 de novembro de 2010
GODOFREDO
Sou refém do Godofredo
um celular cheio de dengos
que vibra fora de hora
aloprando os meus medos!
Vivo numa casa
sem flores na sacada
no mais não tenho nada
além dos tiques do Godofredo...
Ele sempre me acorda
até num sonho profundo
com seus fricotes estranhos
de coisa do outro mundo!
Extravia caminhos
elimina meus sonhos
de desejo e esperança
com sotaque de criança!
Sei que posso desligar Godofredo
seja dormindo ou acordado,
mas o que posso fazer
com o tagarela do outro lado?
sexta-feira, 29 de outubro de 2010
DIÁLOGO - Moacyr Scliar
- Pai, Deus existe?
O homem deixou de lado o livro que estava lendo e ficou olhando para o garoto sem dizer nada.
- Pai, eu perguntei se Deus existe.
- Eu ouvi. Estou pensando.
- Precisa pensar? Eu só quero saber se Deus existe ou não - disse o garoto irritado.
- Bom - o homem, cauteloso - para algumas pessoas existe, para outras não.
- Para mim não existe - disse o menino.
- Não existe?
- Não, quer ver? - Olhou para cima: - Deus, eu quero uma bicicleta nova. Agora.
Esperou um pouco - muito pouco - e disse, triunfante mas amargo:
- Viu? Viu como Deus não existe?
- Bem - disse o pai, sentindo o terreno movediço - isto não chega a ser urna prova. As pessoas não conseguem logo o que querem.
- Ah, mas se Deus existe, ele tinha de me dar uma bicicleta. Deus não existe.
O homem não disse nada.
- Deus não existe - insistiu o garoto. - Ouviu? Não existe. Ou então está morto. Deus morreu, pai.
Meu Deus, pensou o pai, o garoto está dizendo aquilo que Nietzsche levou anos para descobrir. O seu bom humor, porém, logo desapareceu: o menino estava chorando. Está cansado, pensou o homem. Tomou-o nos braços, sentou com ele na cadeira de balanço, embalou-o, até que o menino adormeceu. Então colocou-o na cama; mas aí já não tinha vontade de ler; de modo que pôs o pijama e foi dormir também.
Acordou de manhã cedo. O menino estava ao lado da cama do casal, uma expressão de triunfo no rosto:
- Sabe o que sonhei, pai? Sonhei que estava cercado de inimigos que queriam me matar. Aí caiu do céu uma metralhadora, e eu matei todos os inimigos. Todos, pai! Com a metralhadora! Foi Deus quem mandou aquela metralhadora!
O pai suspirou, aliviado. Finalmente, Deus estava dizendo a que vinha.
SCLIAR, Moacyr. Diálogo. In: Para gostar de ler - vol. 18 - crônicas - Ática, 2010.
quinta-feira, 28 de outubro de 2010
DESCOBERTA
Tudo corria bem
obrigado
até notar a flor
amarela
na cabeça dela
claro que fiquei
grilado
uma flor desse tamanho
a enfeitar sua cabeça
castanha
até pensei dizer a ela
meu deslumbramento
com a descoberta
porém desisti
é claro
não queria passar
por sujeito estranho
que ainda não aprendeu
a ser poeta.
terça-feira, 26 de outubro de 2010
Pontos de vista - Marina Colasanti
Quando Nero queria ver
o mundo melhor
olhava-o através de
uma esmeralda.
Quando quero ver melhor
o mundo
eu o olho através
das palavras.
sábado, 23 de outubro de 2010
Anjo da guarda
Escapulário
fez ZÁS!
e escapuliu
do pescoço...
o tempo passou
e ninguém
dele se lembrou.
Esquálido
desnutrido
lamentou
ser um anjo esquecido...
Zangou-se
com você
comigo
todo mundo!
Nem pensou dez segundos
foi logo reverberando:
Anjo da guarda
nunca mais
nunca mais
serei!
Quando desaparecer
que todos se arrependam...
Ninguém nunca mais
vai me encontrar
nos postos de venda!
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