sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

PARIR É PRECISO



Mudança de ares, distanciamento. Afastar-se do espelho, beber imagens do mundo exterior, gestos de maestro conduzindo a orquestra de planos, tentativas, faltas, excessos. Ir em frente sem temer a noite, pois nem todos os gatos são bastardos.

Parir é preciso, como disse o amigo João. Antes disso há que ter solo e semente, e muita vontade aliada aos sonhos. Fazer nascer, e não repetir. Ser original, eis o desejo príncipe dos desejos, que seqüestra o sono. Eis a tarefa quixotesca, mas não vamos ligar se os outros recomendam escutar as censuras e medos.

Parir um filho que deposite seu olhar nas coisas simples, percepções que façam rir, chorar, sem ostentação. Livres de incertezas, receios e clichês. Filho que não vai ser o responsável pelo décimo terceiro e férias. Não é direito adquirido, nem averbado e guardado num cofre para ser usufruído amanhã.

Filho que não se acomoda com o pouco que já possui, e se prende às escassas expectativas que realiza mês após mês. Esse filho tecerá em seu coração, no silêncio da noite, planos audaciosos, afastando de seu caminho os medos do fracasso, e vai, sim, atrair imagens de sucesso e prosperidade.

O filho não perderá tempo com vaidades, inveja, arrogância, falsos elogios para não magoar os amigos. Descerá a ladeira no seu primeiro ensaio na bicicleta do irmão mais velho, pouco importa o quanto a aterrissagem vai ralar seus joelhos. Fará o gol mais bonito, mesmo que seu time não ganhe de goleada.

Parir sem pressa, menos dor e mais prazer, se possível. Obter a sensação mais “estranha” e arrancar, da obsessão de chegar ao novo, a visão incomparável, capaz de rasgar ao meio o lençol da noite sonolenta!

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