sábado, 21 de agosto de 2021

Olhos que parecem jabuticabas murchas

 

Raposas passeiam sobre o meu telhado

com a leveza de estarem a par

de minhas histórias.

Tive mais sorte na vida

do que soja e milho transgênico.

Fui amado por algumas mulheres,

seus dedos tamborilando meu peito,

descendo e subindo,

calcinhas e cuecas imortalizadas no corredor

que leva da sala até o quarto.

Também fui maltratado pela vida,

empregos,

negócios,

profissão.

Meus olhos estavam desconectados dessas coisas,

como se elas fossem restos de feira.

Autopiedade...

considerar-se uma árvore

sufocada

e podada

desde o início.

Rotas de fuga

que não servem pra nada.

 

Ela me diz:

"Você aí, rolando como pedra,

um velho desleixado,

que foge do banho,

não faz a barba,

veste roupas fora da moda...

Eu tenho mais de 40 anos mas sou linda!

Os homens dizem Nossa, você nem parece ter 40!

Você não percebe o que a passagem do tempo

está fazendo com sua carcaça?

Mulher não gosta de homem jogado!".

 

Dou o troco:

"Ora, ora, quem falando...

Teus olhos eram mais vivos, não?

Agora me parecem jabuticabas murchas.

E essas rugas entre o queixo e o pescoço

banho nenhum vai apagar.

Vejo por aí o faz de conta,

pessoas obedecem a regra geral

e não me sinto em casa

para fazer o mesmo.

Amores entediantes virão

e você vai morrer de medo

de saltar fora,

não vai pressentir a serpente

rondando,

o retorno daquele louco desejo

de suicídio.

Devolva minha inspiração...

assim terei minha roupa ajustada

e meu corpo cheiroso...

e eu te transformo numa deusa

esculpida num altar,

fazendo babarem olhos e bocas

da multidão".

 

(B. B. Palermo)

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