“Que pode uma criatura senão,
entre criaturas, amar?
Amar e esquecer,
amar e malamar,
amar, desamar, amar?
Sempre, e até de olhos vidrados, amar?” (Carlos Drummond de Andrade).
Dona Fabi abriu as portas e janelas do coração e permitiu que Rodolfo voltasse. Hipersensíveis, as mulheres são poetas. Como Drummond. Sem vaidade e arrogância, preocupado com os outros, o poeta entende as mulheres mais do que ninguém.
Na hora da raiva e do ódio, vamos ouvir música, sentir o cheiro das frutas, olhar a chuva e a luz do sol. Eis o conselho do poeta.
Depois de ser expulso de casa, Rodolfo sentiu-se um “nada”. Sofreu o remorso pelo que fez. Impossível não lembrar de “José”:
“... A festa acabou / a luz apagou / o povo sumiu / a noite esfriou (...)”. E agora, Rodolfo? “... Está sem mulher, / está sem discurso, /está sem carinho, / já não pode beber, / já não pode fumar, / cuspir já não pode, / a noite esfriou...”.
Há milhares de anos homens e mulheres convivem. Continuam se achando feitos um para o outro e, ao mesmo tempo, continuam estranhos um ao outro. Se existe guerra entre eles, é a única “em que homens e mulheres dormem regularmente com o inimigo”, disse Quentin Crisp.
O casamento é o ápice de uma relação? Seria mais sereno se não houvesse filhos, sogras, ex-cônjuge e, algumas vezes, um (uma) amante? Hoje, dizem que é perda de tempo preocupar-se com isso. Segundo Nelson Rodrigues, “os pactos de morte desapareceram. Ninguém mais se mata por amor”.
Distante de dona Fabi, Rodolfo sofreu. Viu o quanto equilibrava sua vida. Percebeu como a magoou. Perguntou-se também se tinha aqueles péssimos hábitos que são a queixa generalizada das mulheres a respeito dos homens: esquecer a pasta de dentes sem a tampa, o xampu aberto após o uso, a toalha molhada sobre a cama, a tampa da privada erguida...
Sozinha, Dona Fabi engoliu a crueza da afirmação de Henri Jeanson: “ A vida não é um conto de fadas. É um conto de fatos”. Perguntava-se: “Onde foi que eu errei?”. O casamento declina, expectativas se frustram, vem a rotina... Aquele homem cavalheiro, elegante, carinhoso, se afastou. A esse propósito, afirmou certa vez o Príncipe Philp da Inglaterra: “Ultimamente, quando um indivíduo abre a porta do carro para sua mulher, ou é um carro novo ou uma mulher nova”.
A respeito do perdão e do amor, não devemos perguntar nem explicar. Simplesmente, amamos e perdoamos. Hipersensíveis, já disse, as mulheres (nem todas, claro) são poetas. Dona Fabi acolheu e perdoou seu amor porque, como diz Drummond, “Amor é dado de graça, / é semeado no vento (...) / Amor foge a dicionários / e a regulamentos vários (...). / Amor é primo da morte, / e da morte vencedor, / por mais que o matem (e matam) / a cada instante o amor”.
Neste momento frágil da relação dos meus amigos, penso nos recados e pedidos que fazemos ao Papai Noel. Em vez de pedir, vou rabiscar algumas dicas que possam arejar o frágil casamento de Rodolfo e Dona Fabi.
Por favor, amigos, sei que há uma expectativa, foram tantos e-mails, telefonemas, opiniões e versões. Mas vamos exercitar nossa sensibilidade, e dar um tempo para que o casal possa se re-conhecer.
Rodolfo, você precisa deixar sua assinatura, sua presença, no coração do seu amor. Compartilhe sua rotina, dê elogios, em vez de criticar. Depois de mais um ano de correria, o dinheiro suado para as várias contas, você precisa desacelerar. Estampar, à flor da pele, o sorriso, o bom humor, seus dedos entrelaçados às mãos de dona Fabi. Vá à cozinha, faça o prato de que ela mais gosta, tempere seu beijo com iguarias e confetes.
Dona Fabi, não pergunte, não fale em demasia, amor não se explica, amor se sente. Se você pensar demais, vai espantar o amor. Um abraço, um beijo, uma carícia, dizem muito mais do que palavras.
Nunca conhecemos o suficiente de nosso amor. A qualquer momento pode surgir uma surpresa. Então, façam uma viagem, afastem-se um pouco dos olhares de censura da comunidade...
Sei que ninguém entende de amor mais do que ninguém. Também sei que todos têm medo de amar. Talvez isso aconteça porque confundimos amor com posse. Então, amigos, dediquem-se ao amor do outro sem vê-lo como “coisa” ou propriedade.
Na vida tudo é surpresa. O amor tem seus mistérios. Como diz Guimarães Rosa, "qualquer amor já é um pouquinho de saúde, remédio contra a loucura". Rodolfo encontrou a cura, se empanturrou desse remédio. Abraça a mulher, o filho, o cão, no lar vence todas as dores, aconchego dos seus amores!
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