domingo, 23 de outubro de 2011

Em código - Fernando Sabino


Fui chamado ao telefone. Era o chefe de escritório de meu irmão:
- Recebi de Belo Horizonte um recado dele para o senhor. É uma mensagem meio esquisita, com vários itens, convém tomar nota: o senhor tem um lápis aí?
- Tenho. Pode começar.
- Então lá vai. Primeiro: minha mãe precisa de uma nora.
- Precisa de quê?
- De uma nora.
- Que história é essa?
- Eu estou dizendo ao senhor que é um recado meio esquisito. Posso continuar?
- Continue.
- Segundo: pobre vive de teimoso. Terceiro: não chora, morena, que eu volto.
- Isso é alguma brincadeira.
- Não é não, estou repetindo o que ele escreveu. Tem mais. Quarto: sou amarelo, mas não opilado. Tomou nota?
- Mas não opilado - repeti, tomando nota. - Que diabo ele pretende com isso?
- Não sei não, senhor. Mandou trasmitir o recado, estou transmitindo.
- Mas você há de concordar comigo que é um recado meio esquisito.
- Foi o que eu preveni ao senhor. E tem mais. Quinto: não sou colgate, mas ando na boca de muita gente. Sexto: poeira é minha penicilina. Sétimo: carona, só de saia. Oitavo...
- Chega! - protestei, estupefato. - Não vou ficar aqui tomando nota disso, feito idiota.
- Deve ser carta em código ou coisa parecida - e ele vacilou: - Estou dizendo ao senhor que também não entendi, mas enfim... Posso continuar?
- Continua. Falta muito?
- Não, está acabando: são doze. Oitavo: vou mas volto. Nono: chega à janela, morena. Décimo: quem fala de mim tem mágoa. Décimo primeiro: não sou pipoca, mas também dou meus pulinhos.
- Não tem dúvida, ficou maluco.
- Maluco não digo, mas como o senhor mesmo disse, a gente até fica com ar meio idiota... Está acabando, só falta um. Décimo segundo: Deus, eu e o Rocha:
- Que Rocha?
- Não sei: é capaz de ser a assinatura.
- Meu irmão não se chama Rocha, essa é boa!
- É, mas foi ele que mandou, isso foi.
Desliguei, atônito, fui até refrescar o rosto com água, para poder pensar melhor. Só então me lembrei: haviam-me encomendado uma crônica sobre essas frases que os motoristas costumam pintar, como lema, à frente dos caminhões. Meu irmão, que é engenheiro e viaja sempre pelo interior fiscalizando obras, prometera ajudar-me, recolhendo em suas andanças farto e variado material. E ele viajou, o tempo passou, acabei me esquecendo completamente o trato, na suposição de que o mesmo lhe acontecera.
Agora, o material ali estava, era só fazer a crônica. Deus, eu e o Rocha! Tudo explicado: Rocha era o motorista. Deus era Deus mesmo, e eu, o caminhão.

do livro Para gostar de ler, Vol. 4. Editora Ática.

8 comentários:

  1. o que significaaaaaaaaaaaaaaa não sou colgate mais ando na boca de muita gente alguem me diz socorroooooooooooooooooo aaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa

    ResponderExcluir
  2. "Colgate" significa CREME DENTAL... Então: "Não sou pasta de dente mas ando na boca de muita gente", quer dizer, todo mundo fala de mim... bem ou mal. mas todo mundo fala... Abraços do Américo.

    ResponderExcluir
  3. Qual o assunto núcleo que a crônica quer transmitir para o leitor ?

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. A crônica deveria ser sobre frases de para-choques de caminhão. Eu diria que ele pegou essas frases e articulou numa historinha para causar maior impacto.

      Excluir
  4. Das doses frases ditas pelo autor, qual delas que mostra um problemas social

    ResponderExcluir
  5. Quais as 5 tematicas abordadas????????????????

    ResponderExcluir
  6. 5. Justifique o título da crônica.
    6. Você acha que há intimidade entre o cronista e o chefe
    de escritório doirmão? Justifique.
    7. Qual o sentido de “estupefato”, “opilado”?

    ResponderExcluir

Pílulas diárias de fofoca

  – Em Canela, ninguém cumprimenta ninguém! Em Capão, todo mundo diz “bom dia!”, “tudo bem?”. Aqui tu anda de bermuda e chinelos e ningu...