quarta-feira, 12 de agosto de 2015

Doce sonho


Sonhei que competia com crianças, numa disparada frenética. Quem se aproximava da linha de chegada tinha água na boca. É que os troféus eram doces, lindas tortas, sorvetes, sucos e quindins. Quanto mais corria, mais distante do pódio ficava – e minhas pernas flutuavam sem sair do lugar, tamanha era a sede e a fome. Foi tanta aflição, tanta dor, que pra minha sorte fui salvo com o berro do despertador!

(Tiradas do Teco, o poeta sonhador)

domingo, 9 de agosto de 2015

The day after - Antonio Prata



ET - E acabou por quê?
Último Remanescente da Humanidade (URH) – Resumindo bem, a Terra esquentou muito e a gente, tipo, cozinhou.
ET – Ah… Foi meteoro? Vulcão? Gigante Vermelha?
ÚRH – Não, no caso, foi vacilo, mesmo. A gente queimou petróleo, muito petróleo, até o mundo virar uma sauna seca.
ET - E queimaram petróleo pra quê?
ÚRH – Pra se locomover, basicamente. A gente criou umas caixas de metal que queimavam petróleo e te levavam de lá pra cá, sem você ter que cansar as pernas.
ET - E vocês iam de lá pra cá, pra quê? Pra fugir de predadores?
ÚRH – Não, não. Os predadores viraram bolsa e tapete bem antes. A gente queimava petróleo pra ir e voltar do trabalho, da padaria, do posto, onde a galera ia encher a caixa de metal com mais petróleo e fazer uma social na lojinha, tomando Skol latão.
ET - E por que vocês não iam a pé pro trabalho, pra padaria, pro posto, fazer social na lojinha, tomando Skol latão?
ÚRH – Porque todo mundo se aglomerava numas cidades enormes e acabava ficando meio longe do trabalho, da padaria, do posto.
ET – E por que vocês não se dividiam em cidades menores, onde dava pra fazer tudo a pé?
ÚRH – Porque nas cidades enormes tinha mais possibilidade de trabalhar e de ganhar dinheiro pra poder comprar uma caixa de metal maior e mais cara, que gastasse mais petróleo.
ET - E por que alguém quereria isso?
ÚRH - Porque dava status e status era tudo. No trabalho, na padaria, no posto, neguinho via tua caixona de metal, capaz de ir a 240 km/h e dizia: “Pô, ó o cara!”.
ET - Nossa, olhando esses escombros, agora, nem dá pra imaginar que por aqui passavam caixas de metal a 240 km/h.
ÚRH – Não, na verdade, não era assim, não: como eram muitas caixas de metal e todos queriam se locomover ao mesmo tempo, ficava tudo engarrafado. Nos horários de pico a média era de 8 km/h.
ET – Ué, até onde eu sei, com as pernas vocês podiam ir mais rápido que isso, não?
ÚRH – Poder, podia. Mas a gente preferia ir devagarinho na caixa de metal, com os vidros fechados, ar condicionado e insulfilme, de boa, ouvindo notícias sobre o trânsito e tirando meleca do nariz.
ET – Tirando meleca do nariz? Dava algum prazer físico, isso?
ÚRH – Dava um prazer medíocre. E uma culpinha, também. Prazer mesmo dava era o sexo, mas no fim ninguém mais tinha tempo pro sexo, porque tava ou trabalhando que nem louco pra comprar uma caixa de metal, ou parado dentro da caixa de metal, por horas, tentando chegar ao trabalho, onde trabalharia que nem louco pra comprar outra caixa de metal.
ET – Então vocês todos morreram porque gostavam de ficar parados em caixas de metal que queimavam petróleo pra levar vocês de lá pra cá a uma velocidade inferior à das próprias pernas?
ÚRH – É. Por causa disso, das bandejinhas de isopor e de umas pessoas que insistiram até o fim em empurrar folha na calçada com o esguicho.
ET – Oi?
ÚRH – Esquece. Podemos falar de outro assunto? E lá de onde cê vem, é bonito? Fresquinho? Tem praia?
(Antônio Prata é escritor. Publicou livros de contos, entre eles “Meio Intelectual, Meio de Esquerda”. Filho do escritor Mário Prata, escreve aos domingos na Folha de São Paulo).

Carreira solo



Dizem que devo planejar, pra encontrar o caminho certo. No momento, apenas quero inventar minha carreira solo. As bugigangas que carrego, em vez de celular, serão alegres histórias pra inspirar. Príncipe ou mocinho, lúcido ou louco como Quixote, montado no Rocinante. Parceiro de Alice, Emília e Maluquinho, darei rédeas pra aventuras, charadas e adivinhas. Nos porões, torres, escadas, contracenarei com princesas encantadas, duendes e fadas. Farei acordos políticos com lobos e três porquinhos, bruxas e chapeuzinhos, maças envenenadas e anõezinhos. Um mágico, o mago mais belo, vou namorar nas torres dos castelos. Deus me traga sonhos à vontade, me livre da insanidade de competir com todo mundo, pra exibir medalhas e diplomas na parede. Meus planos A e B não passam de maestro da orquestra. Basta alguma afinação pra vida virar festa! 

(Tiradas do Teco, o poeta sonhador)

segunda-feira, 3 de agosto de 2015

Quero-me-encontrar



Sou do planeta Quero-brilhar e, quando os sonhos são pretensiosos, sonho que sou jogador de futebol. Quando são humildes, sou frentista ou padeiro. Motorista, de janeiro a janeiro. Médico e advogado, de fevereiro a março. Depois que meus sonhos foram roubados, persigo o sonho dos outros. Já não me reconheço diante do espelho. Meu planeta saiu dos trilhos. Hoje sonho que sou astrônomo e vasculho os céus para ver se localizo o planeta Quero-me-encontrar, porque é lá que eu quero morar!

(Tiradas do Teco, o poeta sonhador)

sábado, 1 de agosto de 2015

Metafísica


(São João Batista, de Leonardo da Vinci)

TECO – Parece bobeira perguntar, mas por que você olha tanto pro céu?
ET – Bobeira maior é responder àquilo que você já sabe!
TECO – Por que me ensinaram que, se é possível encontrar respostas pras grandes perguntas, elas virão quando olho pra cima?
ET – Quais perguntas?
TECO – “De onde viemos?”, “Para onde vamos?”
ET- Eu desci do céu, kkkkkk. Mas não sei pra onde vou... Procurar respostas para a morte e a vida após a morte é como procurar agulha num palheiro... É como dormir e não saber se vai acordar... E, se por acaso acordar, viver a surpresa de não saber o que virá pela frente!


(Tiradas do Teco, o Poeta Sonhador)

sexta-feira, 24 de julho de 2015

Sonhos


Perdidos no universo, meus sonhos são pequenos, parecem brinquedos que carrego no bolso. Mas quando anoitece, eles são gigantes que me protegem, e aquecem as avenidas frias do meu coração.
(TIRADAS do Teco, o poeta sonhador.)

quarta-feira, 22 de julho de 2015

Todos os poemas de amor são ridículos


- Tchê, aconteceu... Não consegui evitar...
- Mas o que foi que houve??
- Acho que tô apaixonado...
- Ah, não! Vai começar tuudo de novo! Vai ser duro te aguentar escrevendo aqueles poemas ridículos!!


 (Tiradinhas do Teco, o poeta sonhador)


(do poema Todas as cartas de amor são ridículas, de Álvaro de Campos).

Ele já estava lá

  As pessoas por perto pareciam murchas, daquele jeito, de ideias, uns sonâmbulos, e cansei também de trocar confidências com os cães ...