quinta-feira, 8 de setembro de 2011

A arte de esquecer




Meu PC está com Alzheimer e eu me pergunto o que (não) fiz para evita-lo.
Tenho um blog que encho de histórias, boa parte contadas pelos outros, porque morro de medo de começar a sofrer desse mal.
A amnésia do meu computador, dizem, é porque ele está com a memória muito cheia. Mas eu não queria descartar o que gravei nele durante esses anos.
De minha parte, morro de medo de cair no esquecimento, por isso devoro textos e autores, como a traça que não quer morrer de fome.
Já estou sofrendo, imaginando o dia que for trocar o PC antigo por um atualizado. Não quero perder o rastro que nele deixei e, ao mesmo tempo, não quero me torturar diante de uma memória (cibernética?) quase ilimitada.
Já tive minha vontade de dilúvio, apagar tudo, começar do zero. Como fez Noé, continuar com o que se tem de melhor. Ou como faz a cozinheira, quando escolhe os grãos de feijão para colocar na panela. Porém, com as lembranças não dá para classificar, separar o joio do trigo. Temos que negociar com a memória a recordação das coisas ruins – por exemplo, as da infância que, mesmo camufladas, podem um dia retornar e nos atormentar.
Recebo uma mensagem por e-mail implorando para que não esqueça do Holocausto. Ainda mais diante de alguns discursos que circulam por aí dizendo que nada disso aconteceu.
Essa realidade me assusta: não estou exercitando, diariamente, a amnésia, ao olhar só para frente, instigado por desejos que não são meus desejos? É. Diariamente somos empurrados, pela sociedade, ao esquecimento.
Para fugir disso, rabisco agendas, tiro fotos de pessoas e lugares, invento frases com pretensão de serem pensamentos. Guardo caixas e caixas de objetos antigos, mesmo camuflados diante dos olhares desconfiados dos outros.
Na "necessidade" de chamar a atenção, perdi a noção do que é perene e do que é efêmero.
Como não há solução, porque é relativo o que permanece e o que é descartável, me divido entre o canto do sabiá nesse começo de primavera, os objetos (descartáveis?) que posso comprar com o salário que ganho, e a possibilidade (necessidade?) de manter viva a idéia de amor que seja mais do que paixão (efêmera?). 
Será que o Vinicius de Morais nos sacaneou quando disse, sobre o amor:

(...)Quem sabe a morte, angústia de quem vive

quem sabe a solidão, fim de quem ama
eu possa me dizer do amor ( que tive ) :
que não seja imortal, posto que é chama
mas que seja infinito enquanto dure.

Ah! Pelo menos do amor nós esperamos a perenidade. Mas o problema não é o amor em si: somos nós, que amamos do jeito que amamos!

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