quarta-feira, 29 de abril de 2015

Afinal, o que é inteligência? - Isaac Asimov


Quando eu estava no exército, fiz um teste de aptidão, solicitado a todos os soldados, e consegui 160 pontos.
A média era 100.
Ninguém na base tinha visto uma nota dessas e durante duas horas eu fui o assunto principal.
(Não significou nada – no dia seguinte eu ainda era um soldado raso da KP – Kitchen Police)
Durante toda minha vida consegui notas como essa, o que sempre me deu uma ideia de que eu era realmente muito inteligente. E eu imaginava que as outras pessoas também achavam isso.
Porém, na verdade, será que essas notas não significam apenas que eu sou muito bom para responder um tipo específico de perguntas acadêmicas, consideradas pertinentes pelas pessoas que formularam esses testes de inteligência, e que provavelmente têm uma habilidade intelectual parecida com a minha?
Por exemplo, eu conhecia um mecânico que jamais conseguiria passar em um teste desses, acho que não chegaria a fazer 80 pontos. Portanto, sempre me considerei muito mais inteligente que ele.
Mas, quando acontecia alguma coisa com o meu carro e eu precisava de alguém para dar um jeito rápido, era ele que eu procurava. Observava como ele investigava a situação enquanto fazia seus pronunciamentos sábios e profundos, como se fossem oráculos divinos.
No fim, ele sempre consertava meu carro.
Então imagine se esses testes de inteligência fossem preparados pelo meu mecânico.
Ou por um carpinteiro, ou um fazendeiro, ou qualquer outro que não fosse um acadêmico.
Em qualquer desses testes eu comprovaria minha total ignorância e estupidez. Na verdade, seria mesmo considerado um ignorante, um estúpido.
Em um mundo onde eu não pudesse me valer do meu treinamento acadêmico ou do meu talento com as palavras e tivesse que fazer algum trabalho com as minhas mãos ou desembaraçar alguma coisa complicada eu me daria muito mal.
A minha inteligência, portanto, não é algo absoluto mas sim algo imposto como tal, por uma pequena parcela da sociedade em que vivo.
Vamos considerar o meu mecânico, mais uma vez.
Ele adorava contar piadas.
Certa vez ele levantou sua cabeça por cima do capô do meu carro e me perguntou:
“Doutor, um surdo-mudo entrou numa loja de construção para comprar uns pregos. Ele colocou dois dedos no balcão como se estivesse segurando um prego invisível e com a outra mão, imitou umas marteladas. O balconista trouxe então um martelo. Ele balançou a cabeça de um lado para o outro negativamente e apontou para os dedos no balcão. Dessa vez o balconista trouxe vários pregos, ele escolheu o tamanho que queria e foi embora. O cliente seguinte era um cego. Ele queria comprar uma tesoura. Como o senhor acha que ele fez?”
Eu levantei minha mão e “cortei o ar” com dois dedos, como uma tesoura.
“Mas você é muito burro mesmo! Ele simplesmente abriu a boca e usou a voz para pedir”
Enquanto meu mecânico gargalhava, ele ainda falou:
“Tô fazendo essa pegadinha com todos os clientes hoje.”
“E muitos caíram?” perguntei esperançoso.
“Alguns. Mas com você eu tinha certeza absoluta que ia funcionar”.
“Ah é? Por quê?”
“Porque você tem muito estudo doutor, sabia que não seria muito esperto”
E algo dentro de mim dizia que ele tinha alguma razão nisso tudo.

segunda-feira, 27 de abril de 2015

Jiboias virtuais


- Você viu no livro O pequeno príncipe um desenho de um chapéu?
- Nada disso. É o desenho de uma jiboia que engoliu um elefante!
- Então você viu uma coisa e eu vi outra...
- Hum... Olhamos de paradigmas diferentes.
- Percebes como não existe verdade única? A realidade ( e a verdade) está atrelada à perspectiva de quem olha.

- Hoje em dia damos o nome de jiboia para outra coisa.
- Como assim?
- Jiboias são aquelas pessoas que "engolem" tudo o que é postado no facebook.

(Tiradas do Teco Poeta Sonhador)

terça-feira, 21 de abril de 2015

Quebra-cabeça



Toda vez que penso em você, te levo pra passear nos meus sentimentos. Mas tua imagem escapa, ou diz "não, não quero". Pra suportar o vazio, guardei uma fotografia, em silêncio. Só que, de tanto meu olhar te perseguir, teu rosto perdeu a resolução. Quebro a cabeça com lembranças, sons, ruídos, mas você diz "não, não quero, não quero", até zunirem meus ouvidos.  Pirei quando caiu a ficha do que vivo neste momento: teu rosto é a peça que falta no quebra-cabeças dos meus sentimentos!

(TIRADAS do Teco, o poeta sonhador)

segunda-feira, 20 de abril de 2015

Mi, bi, tri - Arnaldo Antunes



q u a n t o s   m i,   b i,  t r i


lhões  de  murros  no  muro


s e r ã o    n e c e s s á r i o s


a t é  q u e,  a o  t o c á – l o,


m e u      p u n h o      p o s s 


a                                         a


t  r  a  v  e  s  s  á   –   l  o  ?


(Do livro n.d.a. São Paulo: Iluminuras, 2010, p. 51) 

sexta-feira, 17 de abril de 2015

Levaram os seis filhotes - Affonso Romano de Sant'Anna



Levaram os seis filhotes dessa cachorrinha
que chora 
geme de desespero
procura suas crias pelos cantos da casa
sob a mesa
no jardim
na lareira
e pede socorro com seus olhos
exigindo explicação.
Perplexo a contemplo:
- não sabemos de nada.
Um mistério, uma pulsão de vida
nos trespassa
e a perda, e a morte
nos horrorizam e nos esmagam
numa impotente solidão.

(Do livro Sísifo desce a montanha)

quarta-feira, 15 de abril de 2015

Ontem já era


Foi-se a infância. 
Depois da escola, torturamos 
os irmãos mais novos. 
Temos vergonha se estamos nuns. 
Mas os brinquedos, desesperados, 
gritam da sua utilidade. 
Ontem já era. 
Sedutoras, gatinhas temporonas 
brincam de esconde-esconde 
nas ruas e becos da cidade.

(Tiradas do Teco, o poeta sonhador)


quarta-feira, 8 de abril de 2015

Diálogo entre um pré-adolescente e um ET



- Deus existe?
- Sim.
- Mas aonde??
- Nos lugares onde é bem-vindo. 
- Sinto Deus quando escuto a música das esferas celestes, do sol e da lua, dos rios e das montanhas...
- Como age Deus?
- Acho que as coisas de Deus são um mistério... Nessa vida moderna, em que temos pressa para ter, ter e ter, ficamos perdidos e esquecemos a alma no meio do caminho.

- O que chama a atenção de Deus? Riqueza? Poder?
- Acho que é algo simples, como um brinquedo que desperta a atenção de uma criança...

- Pra você, o que é a verdade?
- Hum... Acho que é não prejudicar os outros.
- A verdade é sempre a mesma?
O ET responde com uma pergunta: 
- O mundo não está sempre em movimento?

- O que você gostaria de fazer agora?
- Sei lá... Alguma coisa fora do comum...
- Dançar no meio da rua?!
- Brincar na chuva?!
- Abraçar um desconhecido?!
- Olhar o pôr-do-sol?!

(Inspirado na leitura do livro Maktub, de Paulo Coelho)

sexta-feira, 20 de março de 2015

“Silenciosa algazarra” – a vertente crítica de Ana Maria Machado


“Silenciosa algazarra” – a vertente crítica de Ana Maria Machado
(Neide Medeiros Santos – Crítica literária FNLIJ/PB) 

Crítica sempre faz falta. Um artista precisa se acostumar a ver seu trabalho ser comentado pelos outros, virar objeto de discussão de leituras alheias. (Ana Maria Machado. Silenciosa Algazarra, p.269) 

“Silenciosa algazarra: reflexões sobre livros e práticas de leitura (Companhia Das Letras, 2011) é o mais recente livro de Ana Maria Machado na vertente da crítica literária. O livro reúne quatorze ensaios com temas diversos: a censura, a prática da leitura com crianças em hospitais, aspectos da intertextualidade na literatura infantojuvenil, a importância da leitura, entre outros. Esses textos selecionados foram apresentados em congressos, seminários e palestras no Brasil e no exterior. Ainda consta a monografia inédita” Contador que conta um conto faz contato em algum ponto”, texto premiado pelo Instituto Goethe, no concurso comemorativo ao bicentenário dos irmãos Grimm. 
Na monografia que conquistou o prêmio do Instituto Goethe, a escritora discorre, inicialmente, sobre aspectos teóricos dos contos populares e depois compara contos recolhidos pelos irmãos Grimm com as versões brasileiras desses contos apresentadas por Monteiro Lobato no livro “Histórias de tia Nastácia”. 
No ensaio “A importância da leitura”, apresentado no Encontro Nacional “Crer para Ver”, São Paulo (novembro de 2008), Ana Maria Machado remete o leitor a ideias prazerosas sobre o ato de ler. Para Clarice Lispector, era uma “felicidade clandestina”; Jorge Luis Borges imaginava que “o paraíso era uma biblioteca infinita”; Virgínia Woolf confidenciou, numa carta, que “o céu deve ser uma longa leitura contínua, sem que a gente nunca se canse”; Katherine Mansfield garantia que não havia “maior alegria que a de ler”. 
Diante das opiniões de escritores mundialmente consagrados, o que nos diz Ana Maria? 
“A leitura abre horizontes mentais e emocionam de forma fantástica. Faz nossa inteligência crescer e permite que nossa passagem pelo mundo seja mais útil para nós mesmos, nossa família, nossa comunidade, nossa sociedade, toda a espécie humana”. (p.27)
Em “História em hospitais”, a escritora relata a experiência que teve com a leitura de alguns de seus livros para crianças hospitalizadas e dá exemplos com livros de outros autores. Ela cita o livro de Graciliano Ramos – “A terra dos meninos pelados” como um livro capaz de fascinar a garotada que passa pela experiência da calvície devido à quimioterapia. 
A leitura para crianças internadas em hospitais, nas palavras de Ana Maria, “pode lhes revelar formas de enfrentar seus problemas ou simplesmente distraí-las”. (p.63) 
“Nas asas da liberdade” foi fruto de uma palestra realizada em Lima (Peru), no 1º. Congresso Internacional de Literatura Infantil e Juvenil, em 2010. 
Além de problemas relacionados com a censura, a ensaísta apresenta depoimentos pessoais que revelam o espírito de independência que acompanha a escritora desde pequena. 
A revelação que se segue denota como foi o primeiro contato da escritora com a censura: 
“Meu primeiro contato com a censura não foi como criadora, e sim como leitora: na realidade antes de ser leitora, durante a primeira ditadura que vivi, a de Getúlio Vargas, que governou o Brasil de 1930 a 1945. Eu nasci na última semana de 1941.” (p. 197) 
Ana Maria gostava muito das histórias de Monteiro Lobato que eram lidas por seus pais em casa. Naquela época, não sabia que os livros de Lobato sofriam variados graus de repressão e recebia orientação dos pais para que não falasse sobre essas leituras. 
Nos últimos da ditadura Vargas, o pai de Ana Maria, que era jornalista no Rio de Janeiro, escreveu um artigo no jornal que o censor do governo não aprovou. Por conta disso, o jornal foi apreendido e o pai foi preso. Naquela ocasião, Ana Maria estava na companhia do pai e os dois foram levados para o cárcere. As autoridades permitiram que a menina ficasse com o pai por algumas horas, depois o tio foi chamado e levou-a para casa. Contava apenas três anos. 
Algum tempo depois a família se mudou para Buenos Aires, e Ana Maria, que já estava com seis anos, foi matriculada em uma escola. 
Um dia, a professora mandou fazer um desenho sob o título: “Esta es mi bandera”. Como brasileira, a menina desenhou a bandeira brasileira e cunhou a frase: “Esta es mi bandera”. A professora explicou que ela devia desenhar a bandeira argentina. Veio um novo desenho, agora sob o título: “Esta es tu bandera”. Novo protesto da professora e a ordem: desenhe a bandeira da Argentina com o título sugerido. A reação da pequena foi desenhar duas bandeiras e a brasileira maior do que a da Argentina. Por este ato de rebeldia, a menina foi expulsa da sala de aula e o pai chamado à diretoria. Para continuar estudando naquele colégio, o pai pediu a interferência do embaixador brasileiro na Argentina. 
Quando voltou ao Brasil, ainda criança, foi estudar em um colégio religioso. Certa vez, no pátio, foi feita uma fogueira dos livros de Monteiro Lobato. A mãe não deixou que a menina levasse os livros de Lobato que tinha em casa. Curiosa como toda criança, ela perguntou à professora o motivo da queima dos livros e ouviu esta explicação: Lobato era comunista e alguns livros dele falavam mal da religião e desrespeitava a igreja. 
Esses acontecimentos levaram-na a refletir alguns anos mais tarde que “censura não parte somente de governos ditatoriais, ela está associada, também, a fundamentalismos religiosos ou políticos.” (p. 200)
Mas, foi em 1969 que a escritora sentiu os efeitos reais da censura. Eram os anos de chumbo da ditadura militar no Brasil. Foi presa e proibida de dar aulas na universidade. Partiu para o exílio. Na Europa, durante três anos, enviou contos infantis para a revista Recreio. Nascia, assim, a escritora Ana Maria Machado. 
O período da ditadura militar foi muito fértil para os escritores de literatura infantil no Brasil. São palavras da autora: “... a literatura infantil corria em trilhos mais discretos. Era coisa de mulher e de crianças, não era algo que esses generais lessem e ouvissem em toda parte, como a música popular.” (p.204/205). 
É compreensível que, nesse período, Ruth Rocha tenha publicado a história do “Reizinho Mandão” e Ana Maria “Era uma vez um tirano”. Nas entrelinhas, evidenciava-se o protesto contra os governos autoritários, mas eram livros para crianças... 

Citado do blog: http://nastrilhasdaliteratura.blogspot.com.br/2011_07_01_archive.html

Ele já estava lá

  As pessoas por perto pareciam murchas, daquele jeito, de ideias, uns sonâmbulos, e cansei também de trocar confidências com os cães ...