Quando vejo tua foto
o desejo se entusiasma
e me escapa
e traça um mapa
detalhado
dos encontros que teremos
nos lugares
mais secretos...
Pouco importa
se o desejo
vai se esconder
debaixo da cama
ou atrás da porta
ou se vou contar
pra todo mundo...
já que essa paixão
não é comum
(arroz com feijão)
vou soltar rojões
e espalhar pra todos
que encontrar pela frente
- menos aos amigos e parentes!
quarta-feira, 12 de janeiro de 2011
segunda-feira, 10 de janeiro de 2011
Terapia alternativa - Martha Medeiros
Conheci Zeca Baleiro no final de 2010 e, além de confirmar seu talento musical, descobri que ele escreve bem e que inclusive publicou um ótimo livro, Bala na Agulha, em que reúne crônicas postadas em seu blog, e também versos e frases soltas.
Entre suas reflexões sortidas, encontrei um poeminha que diz: "Terapia/faço em casa/ao pé da pia". Alguns anos atrás escrevi um texto em que defendia essa mesma ideia, a de que lavar louça é uma terapia alternativa das mais eficazes: quando estou com a cabeça encardida de pensamentos inúteis, pego esponja e detergente e começo a lavar todos os copos e pratos empilhados na bancada da cozinha.
É como se eu desaguasse ralo abaixo todas as minhas dúvidas e inquietações.
Dou fim à gordura que se acumula na minha massa cinzenta, as ideias vão ficando mais límpidas e, ao término do serviço, a cabecinha fica pronta pra ser usada de novo, tinindo como um cristal.
Caio Fernando Abreu, a quem ando relendo, também escreveu: “Ninguém enlouquece quando tem um tanque de roupa suja pra lavar”. Ou seja, a vida prática pode nos salvar da loucura.
O fato é que ninguém discorda: a ociosidade é mesmo um passaporte para o universo das caraminholas. A falta de um trabalho e de tarefas a cumprir nos transforma em experts em deduções estapafúrdias e em criadores de problemas inexistentes. Uma pia lotada de louça e um tanque transbordando de roupa suja é a metáfora perfeita para a salvação. Foque no que deve fazer e pare de buscar o sentido da vida.
A loucura tem sempre a ver com excesso, inclusive excesso de tempo livre. É muita angústia, muita cobrança, muita indagação, muita procura de cabelo em ovo.
À medida que usamos nosso tempo para atividades que exigem concentração específica no que se está fazendo, como, por exemplo, um projeto para concorrer ao Nobel de pesquisa científica ou lavar louça, o tempo excedente servirá para descansar e deixar que aflorem apenas os pensamentos mais prioritários. Adeus às elocubrações desnecessárias.
Se mesmo quem possui uma rotina atribulada vive em constante hemorragia mental, imagina quem pode ficar a manhã inteira se espreguiçando na cama, não tem supermercado pra fazer, não precisa ficar atento aos horários dos ônibus e com patrão nenhum exigindo eficiência: acaba mesmo pirando na batatinha. É muita inapetência a serviço do Coisa Ruim.
Portanto, ocupe-se. O trabalho não só dignifica, mas economiza nossos neurônios – não os desperdice matutando, matutando, matutando. Quando estiver pensando muita besteira, amarre um avental na cintura e mantenha sua sanidade.
Zero Hora, 9 de janeiro de 2011
domingo, 9 de janeiro de 2011
Três epifanias triviais (I) - Paulo Henriques Britto
Seria trágico se não fosse bobagem.
Seria uma solução se houvesse um problema
possível de resolver. Seria uma imagem
poética se houvesse espaço pra um poema.
Estando as coisas como estão, não é mesmo nada.
O que é uma pena. Pois o gesto em si é belo
como uma ruína, ou uma xícara quebrada.
(Mas não é bem gesto, e sim a intenção de fazê-lo.
É mais a idéia de uma coisa que uma coisa,
apenas um projeto, e a plena convicção
de que mais nada vai acontecer depois,
a consciência de que a pseudo-solução
há de doer a vida inteira na lembrança,
como um castigo injusto imposto a uma criança.)
quinta-feira, 6 de janeiro de 2011
terça-feira, 4 de janeiro de 2011
TEU AMOR PERDEU O LUME
Escultura de Clara Fernandes
Teu amor
perdeu
o lume
e foi derrotado
pelo caos
do ciume...
Teu amor
é torto
e esquisito
já não me fascina
entrar
nesse labirinto.
Você se perdeu
na hora de montar
o quebra-cabeças
dos pensamentos
já vai tarde demais
pra se libertar
dos meus sentimentos.
sábado, 1 de janeiro de 2011
2011
O tempo para deixar
a roupa suja de molho
e fazer o acerto de contas
pode ser a conta-gotas
ou pode ser num segundo...
como a roupa
que seca no varal
suave ao vento
logo logo fica leve
e se livra dos ressentimentos...
Deixemos evaporar
nossos medos
que sejam nuvens
a povoar oceanos
e que levem consigo
toda a ganância...
Vamos inventar o dia
de um jeito alegre
e sempre que possível
com esperança!
quarta-feira, 29 de dezembro de 2010
COM QUE ROUPA EU VOU...
Depois de revirar no balaio as experiências
que juntei durante o ano
constatei que pensei mais
com o estômago
pensei mais com o bolso
pensei mais com os outros
pensei mais com as manchetes de jornais.
Suo frio a cada campanha na TV,
desde educação para o trânsito
até os "preserve!", "respeite!", "não maltrate!"...
E ao imaginar uma arte
meu superego se inflama
e põe pra trabalhar
meu sentimento de culpa.
Não sei se devo levar a sério
as notícias de catástrofes
ou se devo permanecer indiferente
e me recolher no mundo da literatura...
Enquanto isso a TV
superdimensiona os fatos
para ter mais IBOPE
e me entope com propaganda
de comida industrializada
cerveja e refrigerante...
Tantos ângulos, recortes,
efeitos especiais e montagens
vestem meu caráter
e dizem qual deve ser
minha visão de mundo
e minha disposição
pra encarar isso tudo...
Hoje eu não me pergunto:
"Onde estou?", "para onde vou?"
Vestido desse jeito
tenho até vergonha de perguntar:
"Com que roupa eu vou?"
sábado, 25 de dezembro de 2010
ELA CANSOU...
Ela cansou de tanto pensar.
Então, pra descansar a razão
e despertar os sentidos,
dei-lhe uma flor que roubei
de um desses jardins
de classe média.
Agora ela disse
que o amor apagou
a luz da razão
e fez moradia
na flor de sua pele...
quinta-feira, 23 de dezembro de 2010
O que o vento não levou - Mario Quintana
No fim tu hás de ver que as coisas mais leves são as únicas
que o vento não conseguiu levar:
um estribilho antigo
um carinho no momento preciso
o folhear de um livro de poemas
o cheiro que tinha no dia do próprio vento...
do livro Acordo. Ed. Globo.
que o vento não conseguiu levar:
um estribilho antigo
um carinho no momento preciso
o folhear de um livro de poemas
o cheiro que tinha no dia do próprio vento...
do livro Acordo. Ed. Globo.
terça-feira, 21 de dezembro de 2010
EU E AS PORTAS
Aguardo as férias
para me despedir das portas
e procurar algo novo.
busco oxigênio
para recuperar o tempo
e sugar a essência da vida.
Os homens têm pressa e não me ouvem
por isso eu converso com as portas.
Elas compreendem e não fico só.
As portas me deram as chaves
depois que ficamos amigos
num constante vaivém.
Enquanto as portas se abrem
sem medo do novo
as pessoas se prendem à rotina
pra ter mais segurança.
Ser poeta é perigoso
a mim e aos outros
ainda mais se recitar
em alto e bom som.
As portas pegaram gosto
das minhas histórias
- as pessoas, não.
domingo, 19 de dezembro de 2010
CEIA DE NATAL
Tropecei na perna
de uma mesa
ao ver aquela deusa
na ceia de natal
um vestido vermelho
despertou o apetite
do meu olhar
me apaixonei
sem perceber
que ela podera ser
modelo
de caderno de jornal...
Agora eu me pergunto
se fiquei cego
ou translúcido
se vi uma boneca
um anjo
ou se figurante
de carnaval...
de uma mesa
ao ver aquela deusa
na ceia de natal
um vestido vermelho
despertou o apetite
do meu olhar
me apaixonei
sem perceber
que ela podera ser
modelo
de caderno de jornal...
Agora eu me pergunto
se fiquei cego
ou translúcido
se vi uma boneca
um anjo
ou se figurante
de carnaval...
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