Decidi criar um pseudônimo. Anotei na agenda algumas
de suas características. Óbvio, para não me repetir, dei-lhe mais qualidades do
que defeitos. Dalton Naseton - este é seu nome provisório - não coloca em primeiro plano bens materiais, nem
se preocupa em agradar os outros. Prefere ter opinião própria. É um sujeito
insatisfeito com a vida agitada que vivemos. Chegou a confidenciar a alguns
amigos que sonha viver uma vida simples, afastado dessa zoeira urbana. Diz que
está mais do que na hora de nos reaproximarmos do ambiente natural, visando uma
harmonia, por menor que seja, com a natureza. Outra qualidade do Dalton é a sua
consciência de que pode e deve fazer algo, mesmo com seus textos, para dar
exemplo e melhorar o mundo em que vivemos.
Imprudente, mencionei esse desejo para alguns amigos
e eles, na mesma hora, criticaram, até zombaram... “Medroso, preguiçoso... não dá conta nem de
si mesmo e ainda quer criar Outro para falar o que tem medo de dizer em público!?”
Tiranos, me compararam aos deputados lá de Brasília, que usam do voto secreto
para escamotear seus conchavos anti-éticos.
Contra-argumentei dizendo que, manuseando os
fantoches de um personagem, eu poderia me expressar de maneira muito mais
solta, no caso, escrever, liberto da minha e também da censura dos outros.
Um dos amigos foi demasiado cruel: “O quê?
Preguiçoso como você é, ainda quer duplicar o teu trabalho?” E, definitivo:
“Seja você mesmo, não coloca mais uma máscara nessa tua cara de pau, e escreva
algo interessante pra nós!”
Dei-lhe razão. Se eu queria escrever umas coisas
legais, por que necessitava da carapuça de um nome desconhecido, em vez de
enfrentar a crítica de cara limpa? Sim. Ninguém vai entender (e meus amigos
demonstraram isso) essa nóia de criar um Robin Hood verbal, meu justiceiro.
Seria perda de tempo explicar que Dalton seria um super-herói, e sua palavra agiria coma bala de borracha no coração dos maus, e um brinquedo nas mãos dos bons e das crianças.
Quem me dera que Dalton fosse igual a uma estátua
viva, tentando nos acordar para outros sentidos do cotidiano, sem nos
importarmos com quem se esconde por trás do personagem...
Aqui estamos, eu e o Dalton, olhando em volta,
escutando a natureza anunciar a primavera, sonhadores, e tentando compreender
por que algumas pessoas são tão cruéis conosco. Decidimos não ligar para as
tagarelices dos outros, nem seguirmos suas verdades. Agora, escutamos o
silêncio.
Nesses anos todos, Dalton esteve hibernando?
Precisava esperar tanto para se manifestar? Hoje ele me faz companhia quando
caminho pela cidade. Sobre a critica dos amigos, prefere silenciar. Respeito
sua decisão. Afinal, como disse Gibran K. Gibran, “a verdade de outra pessoa
não está no que ela te revela, mas naquilo que não pode revelar-te. Portanto,
se quiseres compreendê-la, não escutes o que ela diz, mas, antes, o que não
diz”.
Mudei de ideia. Agora, em vez de escutar a voz de um
outro, mesmo que seja minha própria invenção (ficcional), vou tentar escutar a
mim mesmo, minha consciência. Mas isso é doloroso. Meu tribunal interior,
percebo, é muito mais tirano do que meus amigos!
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