A primavera começa a dar o ar da graça e a cidade,
mesmo entupida de carros e, talvez por isso, com os
nervos à flor da pele, fica mais colorida. Além das flores, temos as vitrines e a
variedade de anúncios espalhados pela cidade. Há uma linguagem urbana bem
sortida, com uma mistura de português e inglês que, tenho a impressão, quer me
humilhar.
Dia desses vi numa loja esses anúncios e tive a
sensação de que era convidado a estudar inglês. Me senti também um chinelão,
afinal, quando poderei ter um “office de executivo” e uma “home Studio e home black”?
Respiro fundo e constato: como ando por fora!
Imagina o mico se, numa roda de amigos, eu errar a pronúncia desses termos em
inglês, que estão na boca de todo mundo. E o pior, não domino nem um terço da
gramática de minha língua.
Sei, sou um casmurro ao achar estranha a babel de
expressões gritantes nas fachadas das lojas. Não sei bem o que me
pertence. Só sei que sou convidado (ou empurrado) a entrar nessa onda, ou moda,
ou tendência...
Henfil, no livro “A volta do Fradim” (de 1992),
conta a história do personagem Baixim que
recebe um índio, enviado pela FUNAI, para ser integrado à civilização. Para
começar o processo educativo do índio, diz Baixim:
“Pra você se integrar, vai ter primeiro que aprender
a falar português! Preste atenção...”. Então
Baixim descreve um jovem, que passa por perto:
“Aquilo ali é um playboy com um blue-jeans,
T-shirts, óculos Ray-ban, Hollywood king-size filtro, ronsonchiclettes e tênis
reebok!”
E, diante de uma TV:
“A TV mostra um tape, agora um replay, um slide, um
slogan, um jingle...”
Depois:
“Ali naquele shopping Center tem uma drug-store onde
a gang dark bem cool pede hot-dog com ketchup ou então um big Mac bebe
coca-cola ou Pepsi, Milk-shake, ice cream soda, ou mesmo wiskion de the rocks...”
E Baixim dá o seguinte conselho ao índio “iniciante”:
“Quando você tiver mais know how e um big
background, vai tirar Xerox, mandar telex e, se tiver cash, jogar no open
market ou no over night. Um dia entras numa joint venture e faz um holding...”
E, dirigindo-se ao seu aluno:
“Compreende?”
Ao que esse, prontamente, responde:
“Yes, i do!”
Com relação a essa “culinária lingüística”, sei que
não preparo grandes pratos. Apenas um miojo ou um sopa pronta de supermercado.
Quanto aos nuggets, aprendi sua pronúncia correta num barzinho de esquina. Um
sujeito, meio alto por causa de algumas cevas, pediu à garçonete (que por acaso
era a gerente do estabelecimento) para que trouxesse o cardápio. Percorreu com
os olhos a lista de opções e acabou pedindo um “nugétes”. Prontamente foi
corrigido pela dona: “É nâgetts, senhor. NÂGTTES!”
Aí, o sujeito pergunta: “De que é feito esse nugétes?”
Ao que a moça respondeu: “Nâgetts é um misto de chikens com...”
Aí o freguês se saiu com essa:
“Faz assim, como não tô com pressa, me traz uma porção
de galeto com polenta!”.
Eu, pelo que me toca, decidi entregar os pontos. De
agora em diante, em vez de contar histórias, vou fazer stand up.
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