quarta-feira, 14 de setembro de 2016

Precisamos falar sobre o voo do pavão


Você quer falar sobre pássaros. É que você ficou admirado com o voo do pavão.
Você quer falar sobre carros. Você quer falar de negócios imobiliários. Mas a conversa se distrai e desliza para a notícia do site, de que nossa correta cidade viveu mais um suicídio.
Não é notícia qualquer, como o acidente do carro ou da motocicleta, ou do bandido preso. Mesmo banalizada, não é a notícia de todo setembro, da Chama Crioula acesa, do aumento da cesta básica, da ameaça de geada para o nosso lindo e frágil trigo.
Você quer falar de pássaros. Não do voo, mas sim da troca de plumagem e das lições que podemos tirar de um recomeço.
Você quer falar do olhar daquele menino ou da pré-adolescente. Quando você olha com mais cuidado, além da cor, há alegria, tristeza ou algo indiferente. Não esqueça que ágeis bailarinas fazem suas performances nas retinas.
Você quer falar do ciclista que aproveita o início do crepúsculo depois do dia de trabalho. Da maratona do casal que a cada primavera decide entrar em forma.
Você pode falar dos pacotes que planeja para o final do ano e o verão.
Mais do que tudo, fale, fale, para ter mais leveza do que o voo do pavão.
Fale, fale muito, até pra soltar os nós que te prendem a garganta.
Se, além de falar, aquilo de que falas fizer eco em teus ouvidos, a ponto de te dar alguns sustos e a bússola apontar um recomeço, perceberás então que és mais do que papagaio, superarás a inteligência para viver sentimentos.
Você pode falar de como foi importante a atenção daquela garota. Se para ela não custou nada, para você abriram-se clareiras emocionais. Mesmo que tua palavra te pareceu ridícula, não se dissipou com o vento norte, que anuncia ventanias e trovões.
Fale, fale em diferentes lugares, para além dos teatros da vida onde usamos coleira e estamos amarrados porque dizem que “é assim que deve ser”.
Talvez o pavão seja lindo não porque possa voar, mas por ter uma bela plumagem. Talvez ele nos fale com as cores que exibe e não com o seu voo. Precisamos ficar atentos quando o pavão silencia e decide voar, pois ele pode despencar em direção ao abismo.
Você precisa falar. Mas não esqueça de que, em certos dias de ventos fortes, as pessoas também precisam de teus ouvidos.


(Tiradas do Teco, o poeta sonhador)

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