Quando nasceu sua filha,
tirou tantas fotos
e compartilhou em tantos grupos
do Whatts,
que mal teve tempo
pra ser feliz.
Quando nasceu sua filha,
tirou tantas fotos
e compartilhou em tantos grupos
do Whatts,
que mal teve tempo
pra ser feliz.
Parece que ando em círculos
e quase sempre escorrego
nuns lugares de luz fosca
e banheiros fétidos.
Me acostumei com garotas
de ventres poderosos,
sedentos de cerveja
e petiscos
e canções populares das rádios FM,
mas não me acostumei
com o coito interrompido.
No boteco, me perseguem
barriguinhas requintadas
e rabos bem vividos,
nada de juízos estéticos,
nada do corpo perfeito.
Elas batalharam o dia,
botaram pra quebrar
limpando as mansões da cidade
e agora me observam,
o animal estranho,
o bicho em extinção,
acuado pelo olhar dessas deusas
e que tem um puta trauma
do coito interrompido.
Eu sei que ando em círculos,
eu sei que bate uma ansiedade
que provoca mijadeiras
de madrugada.
Um bom motivo pra outra dose
é saber que as princesas
não estão nem aí
pras lanternas que iluminarão
nossos caminhos.
Faço brindes quando percebo
que elas não ficam putas
com os noticiários
espalhando o estrume
da política,
nem adoecem com o câncer
do poder
servido em bandejas de prata
pra chinelagem se empanturrar
e lambuzar.
Pra vocês confesso tudo:
o coito interrompido
me fez andar em círculos
e fodeu minha libido,
e com ele me acostumei
a amar essas garotas
de ventres estilosos
e rabos
bem vividos.
(B. B. Palermo)
As pessoas notam que você não está bem,
ficam em silêncio enquanto você faz
uma força danada
pra parecer engraçado.
Você é valente,
aprendeu algo depois de tantos anos
a ponto de não pendurar uma corda
na primeira árvore
que aparecer.
Em outras épocas os ventos previsíveis
até geravam tranquilidade,
mas você sentiu algo novo,
passou a desprezar o seu amor.
Sua mulher sabe o quanto você é frágil,
a ponto de mapear todos os seus pontos fracos
e você nem perceber.
Porres,
escapadas,
encontros virtuais de madrugada,
ela se apropriou da senha do celular,
diálogos escorregadios
e insinuações deprimentes...
Sua história começa a desmoronar,
só você não viu que o barco vazava água,
afetos tornam-se corrosivos
e a tal felicidade bate asas
longe daqui.
Chinaski certo dia me falou:
JÁ VI VELHOS CASAIS JUNTOS
HÁ 50 OU 60 ANOS
QUE MUITO
TEMPO ATRÁS TERIAM
ACEITADO QUALQUER OUTRA
COISA
MAS O DESTINO
O MEDO E AS
CIRCUNSTÂNCIAS
OS AMARRARAM.
(B. B. Palermo)
Caminho pelas ruas desertas e frias
que conversam com a praia.
Cercas, grades, alarmes
e quintais bem cuidados,
só o meu coração tremendo de frio
e morrendo de medo
do mau humor da maré.
Converso com alguns nativos de Texas Beach
e eles mostram suas credenciais:
terrenos para vender,
casas para alugar,
material de pesca,
tijolos, areia, cimento,
pacotes de TV e alarmes,
câmeras de vigilância ao longo das ruas
mostrando o rosto de cada moradia
e reprimindo os desejos mais doidos
das pessoas.
Especializei-me nos tipos de isca
para fisgar o Peixe rei e o Papa-terra.
Descobri os dias favoráveis para identificar cardumes de Tainhas
a partir do comportamento psicodélico dos Golfinhos.
Aprendi a fazer a leitura dos ventos
e das correntes marítimas.
Descobri que sou muito corajoso
ao fazer um duelo
particular
entre a minha ressaca
e a ressaca barulhenta
do mar.
Não deu outra:
Pintou uma estranha meditação
sentado na areia
gelada e úmida
e por pouco não alcancei
o Nirvana.
Toda vez que passeio por Texas Beach
eu consigo me libertar.
Uma voz
me persegue,
e eu sei que é o
eco
do coração metálico
e frio
de um velho
amigo.
"Vamos operar no ódio".
Tensão acumulada,
raiva de molho,
maldades trocando de pele
como sucuris gigantes
no leito fundo do rio.
O ódio nos liberta,
o ódio nos salva,
o ódio nos despreza,
o ódio nos destrói,
o ódio nos conserva
duros e frios,
o ódio nos deixa
em conserva,
salgados,
ácidos,
com longo prazo
de validade.
(B. B. Palermo)
Atravessava a faixa de segurança
na avenida
e ela vinha toda séria
no seu carro esportivo.
Olhos nos olhos, tentei adivinhar
se ela afundaria o pé no acelerador
ou no freio.
Ela me encarou com um semblante
de quem sofre de azia
e má digestão.
Eu sei, meu bem, não sou remédio
para teus sentimentos gástricos.
Meu coração condicionou-se a pulsar
com altas doses de álcool,
e está soterrado em geleiras
surreais.
Todo dia procuro compreender
meus sentimentos,
os quais vêm ao mundo
com ânsia de vômito,
confundo real com imaginário
e me atraco com umas garotas
que posam nuas para fotos
compartilhadas no Whatts.
Tão próximas e tão distantes
da embriaguez imaginativa do Cadelão.
Elas passeiam tranquilas
pelas minhas faixas de segurança,
é um caminho seguro, garanto, embora invisível.
Peitos, bundas e vaginas
circulam pela Internet e me chamam,
como se fossem fogos em dia de quermesse,
eriçando os ideais perversos
da multidão.
Mas isso pouco importa.
Quero falar de meus planos,
quero ouvir amenidades e, por Deus!,
quero encontrar soluções para todas as crises
que o planeta atravessa,
inclusive a crise ambiental.
Gosto de enganar e ser enganado.
Falo falo de meus planos de futuro
e nem percebo que os ouvidos
que me cercam e bebem comigo
não estão nem aí.
Meu desejo de consumo, eu sei,
é evaporar
nessas nuvens
de neblina
da opinião.
(B. B. Palermo)
você acha que apenas o teu lar
virou manicômio
você não sabe porque não conhece
como se dão as relações
entre funcionários de empresas
e outras organizações
fofoquinhas
picuinhas
e explosões de ódio
e egos ensandecidos
você não leu
por isso não conhece
Dostoiévski disse tudo
em seus livros
a respeito
da perversão que corrói
a alma humana
se você quer saber de um jeito mais específico
leia Memórias do subsolo
todas as engrenagens de nosso psiquismo
nosso comportamento paradoxal
ou qualquer outra merda de conceito psicológico
que você quiser usar
estão nesse livro
o fato de amarmos e odiarmos ao mesmo tempo
corando de vergonha Deus
e os padres e os pastores
que também são paradoxais porque humanos
tudo isso se encontra no velho Dostoiévski
sempre atual e incisivo
revelando linda e profundamente
as chagas de nossas
sublimes
corrupções
(B. B. Palermo)
Já não me causa estranheza
ouvir algumas pessoas dizerem
que todo dia pensam em se matar.
Quanto mais livros dos grandes elas leem,
quanto mais ampliam sua consciência das coisas da vida,
menos sentido encontram na porra toda.
O poeta quer fugir desses chatos que tudo questionam
e quer encontrar a energia inspiradora
em meio às pessoas comuns,
aos cães e gatos sarnentos,
aos subnutridos e desdentados
que farejam comida e sexo nos porões.
Vai, Cadelão, afasta-te desses intelectuais tristes
que têm enorme prazer em ser deprimidos.
Não é uma questão de ter um comportamento burguês
ou viver apertado.
Não é uma questão de ter ou não ter casas,
carros, apartamentos em praias.
É algo mais profundo que, de tão
profundo,
chega a ser raso, e rende muita grana
a psicólogos e psiquiatras.
A coisa é divertida,
e tudo desemboca nuns porres
e comprimidos para dormir.
No outro dia a mente volta a martelar
como betoneira potente alimentando
alicerces
e paredes do edifício que sobe.
A mente envia sinais e essas pobres
criaturas
assumem de vez o caos, dizendo que todo dia
pensam em partir dessa, mas eu sei
que são covardes demais para tal.
Há um outro suicídio, mais lento,
das criaturas que mergulham nas águas
turvas
de sua rasa consciência,
que funcionam como barreiras para
evitar
se preocupar com o sentido de suas
pobres vidinhas.
Há, sim, um suicídio mais lento,
uma mistura de prazer e sofrimento,
um sentir-se bem dentro da prisão.
Ele se resume em diariamente injetar Etanol
nas veias.
Um brinde aos que desafiam a vida com
fartas doses,
que correm atrás de Dona Morte com sua
sede,
manifestando ao mesmo tempo
um puta medo de morrer!
(B. B. Palermo)
O ar irresponsável juntou-se à fuligem e estão deixando o mundo em polvorosa. Moços, velhos e crianças se desmontam em tosse e espirros....