Chegamos os três na
boate, meus dois amigos pareciam os Três Porquinhos e eu estava pra Lobo Mau.
Logo avistei, numa banquinho junto ao balcão, aquele cabelo e aquela pele
morena. Várias gatinhas de minissaia, corpos na feira, e ela numa saia discreta. Nossas mãos se tocaram e um arrepio me percorreu, Meu Deus, encontrei
minha alma gêmea. Alcancei-lhe dez reais e disse Escolha as músicas que você
gosta e ela foi direto em Raul e Legião Urbana e começou a dançar e quando
sentou abriu seu coração e eu escutei durante horas. Ergueu a saia e mostrou a
tatuagem na coxa direita, uma Fênix que ia da virilha até perto do joelho e
acho que isso foi a gota d’água. Cinco horas da manhã a conta disparou e o
Beiço sabia que eu andava duro e então ele passou o cartão.
No carro, Dr. Biza
anunciou que não podia voltar para casa, disse à sua companheira que havia
viajado. Eles comentaram sobre o belo clima que experimentei com Lili e de
imediato me disseram Seu frouxo, como você deixa escapar a oportunidade de fazer
um sexo gostoso? Afinal, não é todo dia que o céu nos presenteia com tamanha
química. Em vez de nos deixar em casa, Dr. Biza disse que iriamos atrás de uma
garrafa d’água e de uns copos descartáveis. Nos dirigimos até um posto de
combustíveis, um dos poucos que ainda estava aberto naquela hora. Diluiu dois
sachês do Pó do amor nos três copos, brindamos a Eros e voltamos pra boate. Em
minutos meu sexo acordou, depois de um tempo hibernando, e queria mostrar suas
qualidades, mas já eram seis e pouco e ela precisava voltar pra casa e levar a filhinha
ao colégio. O Pó do amor deixou meu voluntarioso endiabrado, ele latejava e
protestava, queria libertar-se da cueca e então, horas depois, eu não parei de
mandar mensagens apaixonadas e ela só rindo, rindo e curtindo.
No sábado ela veio à
minha casa. Estava sóbrio e, por isso, temia me decepcionar, ela poderia não
ser tudo aquilo. Assim que desceu do táxi, o cabelão e o salto alto me deixaram
babando. Era tudo aquilo e muito mais. Yes, dessa vez não fui enganado pelo puto
do Dioniso. Trazia na mão uma garrafa de vinho importado, dos bons, e falou o
tempo todo com aquele vocabulário sofisticado e aqueles dentes e boca lindos e
o seu cabelo me atraía feito imã. Meus olhos se iluminaram mais e mais. Pode
ter sido pelo cabelo ou pelo timbre de sua voz ou aquela boca perfeita ou o
lábio inferior generoso ou foi seu gosto musical ou seu vocabulário rico em
expressões, quase sempre ausentes em garotas da noite.
Pediu que não a visse
como prostituta, ela não era, ela estava, e eu disse Sim e então ela descreveu
dúzias de traumas adolescentes e o custo que pagou por ser a negra mais linda
entre primas e amigas e tias e outras garotas. Detalhes do estupro que sofreu de
um tio, aos quinze anos, umedeceram meus olhos e me levaram a sugar várias
latas de cerveja. Mamãe e titias, todas mulheres da noite, e eu pensei no
destino e, que merda, parece que tudo se repete, e falou da personalidade
explosiva e de tantos empregos que jogou fora. Cenas detalhadas de como chegava
aos orgasmos e aí eu cada vez mais sacava que não ia rolar sexo naquela noite.
Ela foi pela terceira vez no banheiro e disse que não iria trabalhar na boate
porque estava meio alta, fez questão de mostrar todo o seu repertório, mesmo
com vinte e poucos anos. Montada naquele corpão, veio com tudo e enroscou a
língua úmida e quente na minha e pressionou seu sexo no meu e eu sussurrei Vou
te lamber todinha, excitadíssima ela implorou Vamos, vamos pro quarto... Lambi
e lambi e ela ergueu a voz Me beija, Cadelão escroto, me beija, daí veio por
cima e quis me escravizar, rápido assumi o controle e passei a fazer uns
movimentos vigorosos naquela posição que me torna o dono do mundo e murmurei
Quem é o pai? Quem é o pai? Logo seus gemidos aumentaram e eu saquei que ela
gostou das técnicas que aprendi ao colocar em prática manuais da vida longa que
tive. Tudo rolou, rolou e foi bom. Cadelão estava fora de forma, mas é como
andar de bicicleta, Cadelão não desaprendeu.
Dias depois
emprestei-lhe uma grana pra fazer mercado e farmácia e na quinta-feira baixou
um temporal que inundou seu barraco, sua cama estava sem os pés e ficou
inutilizada e então consultei uns amigos pra ver quem poderia fazer uma doação.
De novo aquele medo de
me apaixonar e assumir uma garota jovem, mãe de uma criança. É que ela é uma
aquariana muito louca, uma bipolar, que intercala bom humor com gestos e
sentimentos expansivos e ausência no mundo, como quem passa da bebedeira pra
sobriedade ou do torpor do pó cheirado e curtido pra realidade deprimente do
horas depois que aquilo passa. O pior é que ela quis me enquadrar. Sim, o maior
motivo pra me afastar ocorreu depois que ela insistiu pra que eu frequentasse
com ela, todos os domingos, a Igreja
Evangélica Abominação À
Vida Torta.
(B. B. Palermo)