Alberto Caeiro, heterônomo de Fernando Pessoa, busca com sua poesia uma visão original da natureza, sem o véu da linguagem (sem se apoiar no sobrenatural ou no místico). Para o poeta, "pensar é estar doente dos olhos"; e "conhecer é nunca ter visto pela primeira vez".
quarta-feira, 13 de julho de 2016
Poema do Menino Jesus - Alberto Caeiro
Alberto Caeiro, heterônomo de Fernando Pessoa, busca com sua poesia uma visão original da natureza, sem o véu da linguagem (sem se apoiar no sobrenatural ou no místico). Para o poeta, "pensar é estar doente dos olhos"; e "conhecer é nunca ter visto pela primeira vez".
Memórias do subsolo - Fiódor Dostoiévski
Literatura totalmente filosófica. Nele está a visão de mundo do autor. Quando Nietzsche localizou Memórias do subsolo numa livraria, ele vibrou. Sua filosofia também está contida neste livro.
segunda-feira, 11 de julho de 2016
Acho que Fernando Pessoa sacou o que todos nós, num dia qualquer, vamos sentir.
Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.
E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo,
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.
Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...
Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó príncipes, meus irmãos,
Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?
Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?
Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que venho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.
domingo, 10 de julho de 2016
Na fila do banco
Observo as testas franzidas, olhares tristes e
apreensivos, na fila do banco. Mesmo que resultem angustiadas, as pessoas precisam se
ocupar. Ter dívidas, negócios complicados, sonhos adiados.
Se tiverem muito tempo para o ócio, para ler e
pensar, definharão no tédio, perguntarão pelo sentido da vida. Talvez, então,
acenda a luz da desconfiança, de que não há um sentido. Se assim for, é bem
provável que disparem as estatísticas de suicídios.
Mantenha o povo ocupado. Noventa por cento com muito trabalho e pouco
salário.
Desperte na massa o desejo de alimentar alguns sonhos.
Apresente a ela astrólogos, padres e pastores, pensadores de autoajuda. De
acordo com o sábio mercado, neste mundo tudo pode ser vendido. Como num afago
ou aperto de mão, parecendo fazer um favor, ofereça ao rebanho fartos pacotes,
programas e produtos.
A publicidade deve bater nas mesmas teclas: “Não
desista dos sonhos!” a cada ano adiados, do prêmio na loteria, do troféu do
clube de futebol favorito, de um Ano Novo feliz. De que, com sangue, suor e
lágrimas cada um vai chegar lá.
Quando presto atenção nas testas franzidas e nas carinhas tristes na fila do banco, tenho vontade de chorar. Ou, talvez, isto seja sinal de que preciso identificar meu rebanho e me ocupar.
(Tiradas do Teco, o poeta sonhador)
quinta-feira, 7 de julho de 2016
Esqueça a tocha, pense no poeta
Depois de algumas taças de vinho barato, versos embalam minha cabeça e acordam deus Baco.
Igual a vocês, também não me safo.
Gostaria de ser exibido e bajulado como a Tocha Olímpica.
Ser motivo de tantos elogios, manchetes e cliques, e circular a cada quatro anos pelas esquinas enfeitadas do planeta.
Ela jamais voltará ao país, ao menos enquanto estivermos vivos.
O cometa Halley retorna, mais ou menos, a cada setenta e cinco anos.
A Tocha, talvez, demore muito mais.
Então, curta, vibre, se ela passou perto de você.
Mas é tanto tempo de TV, espaço no jornal, tanta repetição das histórias desse Olimpo, que o poeta prefere se retirar...
Um ímã existencial atrai meu olhar para mendigos, refugiados, favelas e suas mazelas, órfãos nos abrigos e animais abandonados.
O poeta não perdeu sua memória, por isso engole as lágrimas durante o show.
Boa parte da humanidade perambula, cega, muda e surda. A vida esperneia pra se fazer notar.
Muitos isso poderiam ser aquilo.
Igual a vocês, também não me safo.
Gostaria de ser exibido e bajulado como a Tocha Olímpica.
Ser motivo de tantos elogios, manchetes e cliques, e circular a cada quatro anos pelas esquinas enfeitadas do planeta.
Ela jamais voltará ao país, ao menos enquanto estivermos vivos.
O cometa Halley retorna, mais ou menos, a cada setenta e cinco anos.
A Tocha, talvez, demore muito mais.
Então, curta, vibre, se ela passou perto de você.
Mas é tanto tempo de TV, espaço no jornal, tanta repetição das histórias desse Olimpo, que o poeta prefere se retirar...
Um ímã existencial atrai meu olhar para mendigos, refugiados, favelas e suas mazelas, órfãos nos abrigos e animais abandonados.
O poeta não perdeu sua memória, por isso engole as lágrimas durante o show.
Boa parte da humanidade perambula, cega, muda e surda. A vida esperneia pra se fazer notar.
Muitos isso poderiam ser aquilo.
Transforme água em vinho e salve o poeta.
Faça um milagre.
Ou peça pra ele se refugiar.
Nada de flaches e manchetes, fotos e vídeos.
Deixe-o viver sua arte mais sublime: vomitar.
Faça um milagre.
Ou peça pra ele se refugiar.
Nada de flaches e manchetes, fotos e vídeos.
Deixe-o viver sua arte mais sublime: vomitar.
(Tiradas do Teco, o poeta sonhador)
quarta-feira, 6 de julho de 2016
Escravos da realidade
Queria um amor que transbordasse.
Amor para acalmar a secura dessas fontes.
Apressado, mergulhei em amores de água rasa
ridículos, como cartas de amor pessoanas.
O amor veio de uma outra melodia.
Alucinado, esse amor rasante me fez escrever,
depois de muitos anos, breves livros de poesia.
O amor roubou meu tempo
tamanha a vontade de eternidade.
Porém, a necessidade do "eu te amo"
deixou-nos escravos da realidade.
domingo, 19 de junho de 2016
Forever
Dizem que o boom da vida
é ter rodas esportivas
e passear a todo som.
Mas a top realidade
anda frágil de amor.
Não acredito no forever
porém há séculos estacionei
no teu olhar.
Óvnis estão chegando
e sua verdade é um mistério,
não sei se vamos nos dar bem.
Parece haver harmonia
em vários sóis
e iremos de cá pra lá
como vamos a um jardim.
A ficção científica é real
mas não consigo viajar
nesse futuro redentor.
Gabaritei astronomia
devorei ufologia
e na minha biologia
flor é semente e flor.
Na retina do meu olho
a paixão botou ferrolho
e não consigo escapar
desse sonho milenar
de que você é meu amor!
(Tiradas do Teco, o poeta sonhador)
sexta-feira, 17 de junho de 2016
segunda-feira, 13 de junho de 2016
Albert Camus
Um adolescente me perguntou sobre Camus. O "cara" foi citado numa música de uma banda que ele gosta. O jovem não sabia a pronúncia... "Se escreve 'Camus'?". Disse-lhe que a pronúncia é em francês, "Cami". Contei um pouco do que sabia desse grande escritor, inclusive uma das suas frases mais citadas...
domingo, 12 de junho de 2016
A doida fez poesia
Cada passo com o salto alto, com a bíblia na mão
direita erguida, a doida foi poeta e não sabia.
Às vezes não sei que faço. Às vezes você não sabe o
que faz. Nem a velhinha, o aposentado, no caixa eletrônico necessitando ajuda
para sacar o pouco dinheiro, às vezes não sabem o que fazem. Nem para onde
devem ir. Às vezes saímos em busca da multidão e não queremos encontrar
ninguém. Às vezes queremos um palco, olhares e ouvidos sintonizados, como aquela
doida na sexta-feira de tarde.
A doida subiu no palanque da praça, diante do prédio
da prefeitura e dos carros e pessoas que circulavam. Fez um
discurso. Compreendi alguns fragmentos: “Chegará o dia...” “Lembrai-vos
dele...”. Usava um vestido longo, coberto por uma capa colorida e calçava salto
alto. Daí a pouco partiu em direção à avenida, a mão direita erguendo um livro,
que parecia ser a bíblia. Agora cantava e sua voz fazia bem aos ouvidos.
Aguardava minha hora no dentista e a performance dessa
mulher, de uns trinta e poucos anos, chamou-me a atenção.
Será que isso tem
algo a ver com a poesia? Considerei que sim, pois ambas fogem dos clichês
cotidianos. A poesia não faz o que costumeiramente fazemos, que é enquadrar uma
cena como essa, definindo-a como normal ou anormal. Talvez a poesia (e a
literatura) sejam primas-irmãs da loucura.
Enquanto a mulher descia pela avenida cantando e com
a mão direita segurando tal livro, diante de uma farmácia um senhor e uma vendedora comentavam:
- Coitada, saiu do prumo.
- É. Tá fora do ponto.
Ao chegar em casa, zonzo com a cena que presenciara,
perguntei a alguns poetas sobre o que é a poesia. Para maiakówsky, a poesia “é
uma viagem ao desconhecido”. Bem,
pensei, faz sentido. Enquanto a doida viaja com naturalidade pelo mundo dos
mistérios, convicta da sua e da nossa redenção, a poesia se espanta ao ver isso
e, com versos, pinta imagens de tal momento. Podemos dizer que a poesia sente-se
em casa quando a realidade gera espanto, isto é, deixa de ser previsível.
Goethe diz que a poesia “fala do infalável”. Sendo
assim, penso que tanto a doida quanto o poeta arriscam-se a mergulhar nas águas
escuras e profundas do mar da linguagem e da realidade.
Para Fernando Pessoa, a poesia é “um fingimento,
deveras”. Poxa, será que a doida não é doida coisa nenhuma? Poderia estar fazendo uma performance
teatral. Bom, de qualquer maneira tal fingimento produz maior espanto,
assombro, do que a vida “normal”, mecanicamente planejada.
Se eu encarar tudo como sendo normal, creio que
jamais serei poeta.
Para finalizar, diz Garcia Lorca que poesia é “lo
impossible hecho possible”. Então é isso. Tanto a louca quanto o poeta vivem
daquele acontecer (cotidiano) que sai do prumo ou do ponto. E se todos nós
muitas vezes não sabemos o que fazemos, o mero espanto convida-nos a ser poetas.
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