segunda-feira, 6 de outubro de 2025

Pobres

 

Os pobres - dizem - só pensam em grana,
mas o ouro que buscam
é o mesmo que brilha no coração de quem teme a fome.
Talvez sejamos todos mendigos
da própria luz,
pedindo migalhas de sentido
ao grande silêncio do tempo.

Falam que não leem poesia,
mas há verso nas mãos calejadas,
há filosofia no olhar de quem acorda cedo
e enfrenta a tempestade dos dias.
A alma, ainda que adormecida,
pulsará quando o vento disser o seu nome.

Na beira do mar, à entrada da noite,
ouço bandos de pássaros nômades
trazendo recados de outros céus.
Chove no Saara, neva no Nordeste,
e quero-queros dançam valsas sobre a areia,
como se anunciassem um renascimento.

Sou o pão que se reparte,
sou o Maná que desce da nuvem,
mas o som de minha voz
não alcança as janelas fechadas -
moradores da rua
tor-nam-se
sur-dos
de es-pí-ri-to.

E então compreendo:
não há ricos nem pobres,
há apenas os que esquecem
e os que lembram.

Piso fundo na terra
e sinto que o ego é só poeira,
um véu entre nós e o infinito.
E da poeira nasce uma pergunta antiga,
agora suave, como quem reza:
- O que é essencial para você?

(Pensamentos & Poemas Espirituosos)

sexta-feira, 3 de outubro de 2025

O surdinho noiado



Sentei pra meditar e foi uma doideira.

Tentava não pensar, mas vinha seu rosto lindo
em todos os contornos:
olhos, traços da boca divina, sobrancelhas, o cabelão...
Focava de novo em não pensar
e vinha o calor do seu corpo e abraços
disparando choques de 1500 volts
que me levavam a outras dimensões,
algo bem próximo do paraíso.
Sua voz murmurando coisas que só uma feiticeira
sabe dizer pra encantar um garoto carente de amor,
mas que a vida, pela dor dos afetos, ensinou a enfrentar,
sempre fugindo e dizendo não.
“Prefiro estar sozinho, tenho medo de perder quem amo”.
Enamorado, hoje me finjo de surdo para as suas dicas
de como seduzi-la e ser o cara
pra uma garota de classe.
Eu sei, pelo brilho dos seus olhos,
que o feitiço virou contra a feiticeira,
e ela também se enamorou.
E ficamos nessa:
vivemos com intensidade o momento,
e aí me faço de desentendido,
desejando sempre um novo bis,
e dou gargalhadas deliciosas
quando a ouço dizer:
- Você sempre pede pra que eu repita
as coisas mais divinas que eu tenho pra te dizer...
Assim não dá, meu surdinho noiado!

Boneco sem alma