domingo, 20 de agosto de 2017

Sobre o amor - Paulo Leminski


   Transar bem todas as ondas
a Papai do Céu pertence,
   fazer as luas redondas
ou me nascer paranaense.
   A nós, gente, só foi dada
essa maldita capacidade,
   transformar amor em nada.

***
   o amor, esse sufoco,
agora há pouco era muito,
   agora, apenas um sopro

   ah, troço de louco,
corações trocando rosas,
   e socos

terça-feira, 8 de agosto de 2017

EIROS - Luis Fernando Verissimo


   "A leitora Elza Marques Martins me escreve uma carta divertida estranhando que 'brasileiro' seja o único adjetivo pátrio terminado em 'eiro', que segundo ela, é um sufixo pouco nobre. Existem suecos, ingleses e brasileiros, como existem médicos, terapeutas e curandeiros. As profissões de lixeiro e coveiro e carcereiro podem ser respeitáveis, mas o 'eiro' é sinal de que elas não tem status. É a diferença entre músico e musicista e roqueirotimbaleiro ou seresteiro. Há o importador e o muambeiro. 'Se você começou como padeiroaçougueiro ou carvoeiro' – escreve Elza – 'as chances são mínimas de acabar como advogado, empresário, grande investidor ou latinfundiário, a não ser que se dê ao trabalho político antes'. Aliás, há políticos e politiqueiros. Continua Elza: 'Eu nunca vou chegar a colunável ou socialite se comecei como faxineira ou copeira. Você pode ser católico, protestante, maometano, budista ou oportunista ou então macumbeiro.' mas a leitora nota que o dono do banco é banqueiro enquanto o funcionário é bancário, o que pode ser um julgamento inconsciente de caráter feito pela língua.
    Elza – que por sinal se considerava harpeira até começar a tocar numa sinfônica e virar harpista – me sugere uma campanha nacional para passarmos a nos chamar de 'brasilinos, brasileses, brasilenses, brasilianos, brasilitanos, brasilitas, brasileus, brasilotos ou brasilões', o que aumentaria muito nossa auto-estima e nossas chances de chegar ao mundo maravilhoso dos americanos, belgas e monegascos."

VERÍSSIMO, Luis Fernando. In: Jornal do Brasil, 7 de out. 1995.

quarta-feira, 2 de agosto de 2017

Lua


Olho para o céu
e vejo
a libertina
lua luana
linda luna e leve
e lembro de amores
livremente 
libertinos...

Céu inspirador
de latidos
grilos
dores
de corno
e cotovelo.

Como disse o poeta,
"confesso que vivi".
Mas que isso dói,
dói e como dói!

(Palermo escritor)

sexta-feira, 28 de julho de 2017

Planeta Gugus - Ricardo Silvestrin


Em Gugus,

as pessoas nascem velhas

e terminam bebês.

Vão desaprendendo e esquecendo

uma coisa a cada mês.

Cabelos brancos

ficam pretos,

carecas ganham tranças.

Com setenta anos,

todo mundo é criança.

quarta-feira, 19 de julho de 2017

Eletrocardiograma - Germana Zanettini


– doutor
por que essa dor?
por que tantos ais?

na verdade
teu coração
não bate

pratica
saltos
ornamentais

O menos vendido - Ricardo Silvestrin


Custa muito
pra se fazer um poeta.
Palavra por palavra,
fonema por fonema.
Às vezes passa um século
e nenhum fica pronto.
Enquanto isso,
quem paga as contas,
vai ao supermercado,
compra o sapato das crianças?
Ler seu poema não custa nada.
Um poeta se faz com sacrifício.
É uma afronta à relação custo-benefício.

terça-feira, 18 de julho de 2017

Lagarteando no sol


O prédio da rua cresce com o servente domando a betoneira. 
Eu aqui, medito, lagarteando no sol. 
Faz bem pra alma ser um inútil!

https://twitter.com/PalermoEscritor

terça-feira, 11 de julho de 2017

Espere baby não desespere - Chacal


Espere baby não desespere
não me venha com propostas tão fora de propósito
não acene com planos mirabolantes mas tão distantes


espere baby não desespere
vamos tomar mais um e falar sobre os mistérios
da lua vaga
dylan na vitrola dedo nas teclas
canto invento enquanto o vento marasma


espere baby não desespere
temos um quarto uma eletrola uma cartola
vamos puxar um coelho um baralho
e um castelo de cartas
vamos viver o tempo esquecido do mago merlin
vamos montar o espelho partido da vida como ela é


espere baby não desespere
a lagoa há de secar
e nós não ficaremos mais a ver navios
e nós não ficaremos mais a roer o fio da vida
e nós não ficaremos mais a temer a asa negra do fim


espere baby não desespere
porque nesse dia soprará o vento da ventura
porque nesse dia chegará a roda da fortuna
porque nesse dia se ouvirá o canto do amor
e meu dedo não mais ferirá o silêncio da noite
com estampidos perdidos

segunda-feira, 10 de julho de 2017

Fome - Knut Hamsun


Knut Hamsun nasceu em 1859, na região central da Noruega, chamada Grundbrandsdalen. Era o quarto filho de Peder Pedersen, um alfaiate – segundo consta – habilidoso. Com apenas três anos de idade, a família se mudou para a cidade de Hamarøi, aproximadamente a cento e cinquenta quilômetros ao norte do Círculo Polar Ártico. Peder fora trabalhar para o cunhado porque este lhe cobrara o dinheiro que pegara emprestado com ele e não tinha como pagar-lhe, a não ser com serviços. Naquela cidade havia uma biblioteca e Knut logo se identificou com os livros. Era uma criança solitária, pois o tio não permitia as brincadeiras com as crianças do lugar. O menino quase não teve educação formal, frequentando esporadicamente a escola. Entretanto, aos dezoito anos, escreveu seu primeiro livro, Den Gaadelfulde (O Enigmático)[1]. O nome que ele usava era Knut Pedersen Hamsund. Já em 1884, publicou um artigo sobre o escritor norte-americano Mark Twain e o seu nome saiu com um erro gráfico, faltando o “d” final em Hamsund. Nosso escritor acolheu o erro e passou a assinar seus trabalhos como Knut Hamsun.
Fome foi a obra que trouxe fama e reconhecimento a Hamsun. Curta, com cento e poucas páginas, a obra é densa, complexa e atormentada. Sentem-se ecos de Dostoiévski. É uma narrativa de fundo psicológico, embora não de análise psicológica de personagens; o autor não extrai de seu próprio texto nenhuma tentativa de explicação, de teorização. Simplesmente, o atormentado protagonista anônimo de Fome tem, às vezes, delírios completos, atitudes inesperadas.

O enredo é mínimo: o protagonista é um miserável, passa fome quase o tempo todo da narrativa; é também um escritor e certa vez consegue obter  o valor de 10 coroas pela publicação de um artigo seu num jornal local. Toda a ação se passa na cidade de Cristiânia, atual Oslo, capital da Noruega. Dadas suas condições financeiras, vive entre a ameaça de um despejo e outro, não tendo o mínimo conforto. Seu maior amigo é o lápis com que escreve. Vive sozinho, é um tipo taciturno.

Com uma trama simples como essa, lógico esperar que alguma outra coisa justifique a obra em questão. Ela também não prima pela criação de muitos personagens; há apenas o protagonista, um homem abordado por ele na rua, uma moça. Os outros são figurantes, pessoas com quem ele lida e dos quais depois se esquece. Não obstante, a profundidade psíquica na construção do miserável faminto poucas vezes foi conseguida por um autor.

O miserável vive um dilema terrível. Padece de fome, mas esta fome é o que impulsiona sua necessidade de escrever. Portanto, se ele saciá-la, não escreverá. E ele tem a atividade como muito importante para ele. Per Johns, em seu texto Hamsun e O Seu Paradoxal Individualismo Escandinavo, nos diz na página 29 do livro Knut Hamsun no Brasil:

“Perambula pelas ruas, praças e parques de Cristiânia, a capital da Noruega antes de se chamar Oslo, sempre à beira da morte por inanição corporal, à procura do que não pode ser encontrado neste mundo imperfeito. E não abre mão de uma estranha generosidade, apesar e além de sua própria fome fisiológica, a que se acrescenta uma insólita honestidade ou respeito pelo outro ao devolver o que não lhe pertence, caído em suas mãos por engano alheio.”

estranhamento, categoria literária tão cara à corrente de crítica literária conhecida por formalistas russos – um comportamento, ideias, sequência que nos levam a um incômodo pelo inusitado, por exemplo, Gregor Samsa ter se transformado em um inseto em A Metamorfose – está realmente presente na obra de Hamsun.

Do blog http://cleubermarques.blogspot.com.br/2016/01/fome-de-knut-hamsun.html
Trecho do livro

Continuei, implacável, a tagarelar, com o penoso sentimento de que a aborrecia, de que nenhuma de minhas palavras atingia o alvo, e apesar de tudo não parava. No fundo, posso perfeitamente ter a alma um tanto delicada, sem por isso ser um louco; há naturezas que se alimentam de bagatelas, e que são destruídas simplesmente por uma palavra dura. Insinuei que eu era uma dessas naturezas. O fato é que a pobreza aguçara em mim certas faculdades, a ponto de causar-me profundos dissabores, sim, posso lhe garantir, profundos dissabores - ai de mim! Por outro lado, isso tem suas vantagens: até me ajuda, em certas situações. O pobre inteligente é um observador bem mais fino que o rico inteligente. O pobre olha em redor, a cada passo; examina, desconfiado, cada palavra das pessoas que vai encontrando; cada passo que ele próprio dá impõe a seu espírito e a seu coração uma tarefa, um dever. Tem ouvido fino, é impressionável, experiente, leva queimaduras na alma...
Falei muito nessas queimaduras de minha alma. Quanto mais falava, porém, tanto mais ela se mostrava inquieta; e torcendo as mãos, repetia, desesperada: "Meu Deus!" Meu Deus!".

quarta-feira, 28 de junho de 2017

Diferentes apostas



Ela quer uma flor, ele quer futebol. Ela adora lingerie, ele adora tirar. Ele aposta na mega, ela aposta no amor.

(Palermo Escritor)

Pílulas diárias de fofoca

  – Em Canela, ninguém cumprimenta ninguém! Em Capão, todo mundo diz “bom dia!”, “tudo bem?”. Aqui tu anda de bermuda e chinelos e ningu...