sábado, 17 de junho de 2023

Babacas

 


A boçalidade 

humana

não tem limites. 

O noticiário alardeia uma carta 

em que o compositor 

Mozart

se queixa de sua sogra. 

O Leilão da carta vale milhões. 

É ridículo constatar 

que a maioria 

dos babacas

que passam o dia vendo 

noticiários na TV

jamais ouviu 

as composições 

do Mozart.


(B.B. Palermo)

sexta-feira, 9 de junho de 2023

Vai com calma, meu brother

 

Vai com calma, meu brother,


um dia rola beijo e promessas de

"eu te amo!" e "te quero pra vida toda!",

no outro dia a tempestade faz estragos

e tua psiquiatra te olha com o jeitinho

de quem conhece os capetas 

que fazem orgias 

nas profundezas do teu ser.

Ela diz que você se embriaga

porque está deprimido,

ou se deprime cada vez que enche a cara.

Vai por mim, não levamos uma vida normal,

nos querem com o rabo entre as pernas,

curvados e cambaleantes pelas ruas

carregando toneladas de sentimento 

de culpa.

Filhos da puta!

Você, eu, o maluco 

do apartamento ao lado,

a diarista, o caixa do supermercado,

todos, todos, estamos fodidos,

não temos pra onde correr.

Médicos,

psiquiatras,

padres,

pastores,

vizinhas desocupadas

e amores 

e paqueras 

e ficantes 

decadentes,

essas criaturas 

que brotam às centenas

das sombras,


elas sempre têm 

razão.


(B. B. Palermo)

sábado, 3 de junho de 2023

Eu passarinho



Baby tem a mais louca 

profissão,

passa as tardes 

ouvindo histéricos,

psicóticos e neuróticos, 

quase todos 

doces e confusos

como eu.

É normal, baby fica 

estressada.

Camarada, opinei:


- Fica fria, meu amor,

é só mais uma sexta,

TUDO PASSA!


Baby riu e, com seu jeito doce 

de anjinho levado, murmurou:


- Até uva passa...


Ladrãozinho,

dos versos de Quintana

desta vez,

eu gritei:


- Uva passa...

EU PASSARINHO!


(B. B. Palermo)

sexta-feira, 26 de maio de 2023

De outro planeta

 

A gente não é bobo, não.
A gente circula
num outro
planeta.
Pra vocês,
monstrinhos,
nós somos do capeta.
Eis uma luz
pra te inspirar
e botar pra foder
a tua
loucura!
(B. B. Palermo)


quinta-feira, 25 de maio de 2023

Loucuras e loucuras

 


Quando os caras atravessam 

as fronteiras do sensato 

e embarcam no ridículo, 

navegam numa certa  loucura.

Mas nesse tipo de paraíso 

vislumbro a morada 

dos medíocres. 

Acho que a loucura sensata

é a que abre as portas 

para sonhos e utopias.

Sensatos,

medíocres 

ou ridículos,

o aconselhável é o esforço 

para não sermos 

sujeitos 

comuns. 


(B. B. Palermo)

sexta-feira, 19 de maio de 2023

Cresça rápido, Palermão!

 


Rapaz, percebo que no Texas

barba, cabelo, unhas e pentelhos

crescem bem rápido!

Só as pimentas e salsinhas,

couve, alface, rúcula e as ervas

andam com o pé no freio,

como se meus dedos

as oprimissem.

Quando minhas conversas à noitinha

na esquina do bar

são INÚTEIS,

apaga-se a lâmpada 

no poste da calçada,

como se meus raciocínios 

produzissem 

curtos-circuitos.

Eu sei que ela manda 

o seguinte recado:


- CRESÇA RÁPIDO, PALERMÃO!


(B. B. Palermo)

segunda-feira, 15 de maio de 2023

Chamam-me

 


O padre

o pai

a mãe

chamam-me

para que os ajude a encontrar

seus filhotes perdidos.

Andarilho rebelde,

jamais contemplarei

como um profeta

estrelas ou nuvens 

à beira dos lagos.

Sou prático, 

um estressado com as 4 cadeiras

em torno da mesa da sala 

com jaqueta, camisas e meias repousando,

umas senhoras vermelhas de plástico, 

disfarçadas de cabides.

Pensamentos distraem-se com o joão-de-barro

catando coisas 

na grama.

Bem que eu poderia construir meu ninho

no alto das torres

como fazem as caturritas.

No domingo, o padre Alfredo 

chamou o rebanho 

pra caridade,

Vamos levar arroz, feijão, papel higiênico, 

leite e café aos necessitados!

Fugi da igreja e fui vender meus poemas,

reivindicava a alegria

de algumas cervejas.

Como sempre

não existo

portanto

não fui notado

pela alta voltagem

da sensibilidade

comunitária.


(B. B. Palermo)

segunda-feira, 8 de maio de 2023

Licor de pitanga



- Pô, Cadelão, nem bem sarou o dedo

estraçalhado pelo anzol 

e já tá subindo numa pitangueira?

- Beiço, tu já provou licor de pitanga?

- Hum... Já bebi de tudo,

inclusive gasolina.

- Véio, imagina o sabor dessas pitangas amadurecidas pela maresia. 

Degusta uma aí, sente o sabor...

- Tu vai adoçar?

- Claro, mas não com açúcar. 

Vai ser mel, do Zé do Mel. Conhece?

- Ouvi falar. 

- Cara, as abelhas do Zé só beijam flores de eucaliptos e maracujás. 

- Legal. Mas vê se não usa canha marca diabo.

Aliás, tu acha que consegue deixar curtindo por pelo menos uns 30 dias?

- Bah, cara, vai ser o meu maior desafio 

pra 2023.


(B. B. Palermo)

quinta-feira, 27 de abril de 2023

O cara do anzol

 


Ontem à noite demorei pra dormir.

A respiração seguia o ritmo do dedo latejando,

antecipando o pesadelo:

no mar, estava sendo fisgado por gigantesco anzol, 

peixes aguardavam na praia

pra me esfolarem e fritarem 

num panelão de óleo fervente.

A causa do pesadelo, só pode, foi que desde domingo testemunhei uns caras pescando dúzias e dúzias de peixes enormes, tudo com linhas de mão. 

Como vinha cheio de tédio dos últimos dias de abril, não vi outra saída senão pescar.

Ontem de tarde, depois de uma sesteada 

de mais de uma hora, preparei meu equipamento.

Como tinha observado daqueles pescadores, 

eu devia arremessar o troço a uma distância mínima de uns 80 metros, 

afastado das ondas próximas da praia. 

Claro que não dominava técnica nenhuma. 

Arremessei do meu jeito,

e foi um bom arremesso,  

mas um dos anzóis ficou cravado no dedo mindinho da mão esquerda. 


Na UPA, formou-se fila de enfermeiras e auxiliares.

Tentavam lembrar da última vez que um imbecil 

conseguiu se autofisgar. 

O  médico cravou a agulha 

pra anestesiar a região

e eu berrei:

"Aiaiai... caralho!" "Pqp... como dói!".

Disse a enfermeira:

"Senhor Palermo, já imaginou a dor que o peixe sente ao ser fisgado?".

E o médico:

"Querido, nada de álcool por 3 dias.

Agora é anti-inflamatório e antitetânica".

E brincou, mostrando-me o que restou do anzol:

"Tu não quer levar essa joia?

Use como piercing na orelha ou no nariz!".

Sussurei:

"Enrola num guardanapo, vou levar".


Entrada da noite, fui ao bar mostrar o machucado 

e justificar minha ausência pelos próximos 3 dias.

Amigos malvados, encorajados pelas doses de vodca 

e uísque baratos, praguejaram:

"Arranca fora esse curativo, Cadelão!

Faz como eu fazia nas minhas pescarias desde piá: mija em cima!

Deixa de ser cagão, pescador de meia-tigela!"


(B. B. Palermo)

segunda-feira, 24 de abril de 2023

Quando eu era louquinho

 


Você-é-tudo-e-nada

ao-mesmo-tempo.

Num dia, revolucionário,

faz picadinho da tábua de valores,

mas logo se vê juntando os cacos de vidro

de mais um prato que quebrou.

Durante semanas brotam

cacos-espalhados-pelo-chão.


Hoje foi viagem total.

Um livro meu tem a possibilidade 

de ser adaptado para o teatro,

e nessa le-va-da fui até o quarto borrifar perfume,

queria chegar logo ao bar pra beber umas

e brindar com os amigos 

os-momentos-quem-sabe-possíveis-de-se-eternizarem.

Tanto delírio me levou a derrubar e espatifar

o frasco no chão.


Comentário de uma amiga psicanalista:

Diz muito o fato de você deixar as coisas caírem

e virarem fragmentos-de-histórias.

Em poucos anos de terapia

você compreenderá. 


Quando eu era louquinho

cortava a realidade feito meteoro.

Hoje as coisas que toco

quebram com mais e mais facilidade.

O perfume não era importado.

Era apenas imitação.

Mas no final das contas

ficou um pouco do perfume

em-cada-poema-e-nas-minhas-mãos.


(B. B. Palermo)

domingo, 16 de abril de 2023

Rebelião dos bichos

 


O Zé lia seus poemas para mim

enquanto a bicharada se empoleirava 

nas mesas próximas do bar,

declamando suas qualidades culinárias. 

Gritavam todos ao mesmo tempo,

ninguém dava ouvidos a ninguém 

- como desenvolviam suas panquecas, 

seus camarões ao molho e etcétera e tals.

Zé pegava carona

numas sinfonias de Beethoven e Bach,

senti que desejava alcançar os olhos 

de Deus.

No meio do bombardeio, 

eu tentava entender onde o poeta iniciava, 

desenvolvia e fechava suas narrativas.

Ele carregava uma pasta 

com uns 1.100 poemas.

Não suportou emprestá-los 

para que eu os degustasse com calma, em casa,

longe da rebelião dos bichos.


Será que um dia a galera vai ter alguma sensibilidade 

e vai conseguir sentir o sabor 

de uma obra de arte?

Imagino como foi com o pobre do Van Gogh, 

pintando seus quadros 

em meio a uns bárbaros 

totalmente insensíveis 

ao desabrochar 

da criação. 


(B. B. Palermo)

O PATIFE tá enrolando de novo

Quando fui acertar a conta no bar, pendurada nos últimos dias, o bolicheiro não encontrou, no caderno, o meu nome. Ao repassar a longa l...