Cheguei no bar do Telmo com uns trocos
que surrupiei do caixa eletrônico,
Cheguei no bar do Telmo com uns trocos
que surrupiei do caixa eletrônico,
sou trocador de ônibus.
tenho 35 anos e quero me casar.
ter mulher, filhos, um lar.
meu nome é bundamental.
uma tarde, o coletivo parou
num ponto da praça seca.
subiu uma moça que era um sonho.
branca, peluda, dentes bons.
e que perfume!
meu nome é bundamental
quando passou na roleta, num ímpeto súbito,
a pedi em casamento.
meu nome é bundamental. genival bundamental
ela olhou pra mim e disse sim.
ali mesmo por cima da roleta
entre os passageiros, um beijo
selou nosso pacto sagrado.
meu nome é genival bundamental.
cuidei de tudo. alianças, igreja, padre, cerimônia.
no dia fatal, meu nome é genival,
eu lá. eu e o padre. ela nada.
uma hora duas nada.
enfim, chega o sacristão com um bilhete.
“querido bundamental
fui feliz enquanto amor entre nós houve.
agora vou ser feliz com um pé de couve.
daquela que um dia foi seu poema,
maria helena.
ps: a vida é curta para ser pequena.”
meu nome é genival. genival bundamental.
vira-latas tiram selfies nas esquinas
galos dançam no terreiro
cigarras lamentam a vida
formigas corcundas agradecem a deus
sapos saem da penumbra e berram:
- "meu time é o melhor!"
- "não é!" - "é!" - "não é!"
e assim se passam os dias
nesta fauna facebookiana
(B. B. Palermo)
Você pensa demais, Cadelão.
E viaja também.
E sonha umas coisas que vou te contar.
Diz que participou do exército de Napoleão.
Esteve no quarto do Kafka, no dia em que o maluco
acordou
metamorfoseado numa barata.
Você viaja um baseado.
Foi um negro americano esquizofrênico
analisado por Jung.
Se apaixonou pela mãe de Pedro II.
Você diz que esteve em todos os carnavais do Rio.
Você morreu em todas as páscoas e, claro,
ressuscitou.
Você bateu um papo cabeça com Alice,
aquela do País das maravilhas.
Você visitou as Sete Quedas do Leminski,
conversou com ele no dia
em que nasceu o seu poema.
Você diz pra todo mundo que já foi bispo,
padre, psicólogo, cafetão.
Você construiu andaimes que te levaram ao céu,
mais do que a Torre de Babel.
Você entrou nos quadros de Van Gogh
e viveu as paisagens que o gênio pintou.
Você jura que foi criador de porcos, alfaiate,
um pobre mosquito que caiu nas armadilhas
de uma aranha apaixonada.
Você conhece todas as obras, vistas e admiradas,
de todos os museus do planeta.
Você sonha umas coisas que vou te contar, Cadelão.
(B. B. Palermo)
A folha permanece em branco,
espelhando o vazio
de minha alma.
Rabisco então meia dúzia de traços e um círculo,
e eis que vislumbro a cabeça,
olhos, boca e nariz
de um boneco.
Ainda não se fez humano.
Não percebi se está triste ou sorrindo.
Sua dor, saudade, ódio ou amor futuros
dependem dos traços vorazes
que sonho gravar no papel.
Essa espera é solitária demais,
e nem você
nem ninguém
podem fazer
nada.
(Pensamentos & poemas espirituosos)
Poesia em apoio às famílias e em memória às vítimas da tragédia da boate Kiss.
Algumas coisas
entristecem
e amordaçam.
O povo adora
frequentar
igrejas e farmácias.
E como ficam o teatro,
cinemas e livrarias?
Só fica a saudade
do que já foi um dia.
Tudo tem seu lugar, você me diz.
Tudo está fora do lugar, eu te digo.
Como qualquer outra doença,
a cegueira não devia
ser considerada
normal.
(Pensamentos & Poemas Espirituosos)
Um dos mais poderosos exercícios de crescimento interior consiste em prestar atenção a coisas que fazemos automaticamente - como respirar, piscar os olhos ou reparar nas coisas à nossa volta.
Quando fazemos isto, permitimos que nosso cérebro
trabalhe com mais liberdade - sem a interferência de nossos desejos. Certos
problemas que pareciam insolúveis terminam sendo resolvidos, certas obras que
julgávamos insuperáveis terminaram se dissipando sem esforço.
Diz o mestre:
Quando você precisar enfrentar uma situação difícil,
procure usar esta técnica. Exige um pouquinho de disciplina - mas os resultados
são surpreendentes.
Depois de certa idade,
não confio no plano A.
Até simpatizo com o plano B.
Plano C, por que não?
Depois de certa idade,
o que vier vem bem.
Certa experiência adquirida
mostra que todas as alternativas
podem estar corretas,
ou que nenhuma está.
Não suporto a visão calculista
de que em tudo na vida
há causas e consequências.
Você simplesmente vai lá e faz.
Só quero estar sossegado
no meu canto
inventando histórias,
rindo das apostas ridículas
que fiz
e dos tombos
que caí...
(B. B. Palermo)
Um senhor vinha pala calçada,
aproximou-se e tive calafrios:
ele era eu.
Nuvens no céu desenharam
criaturas de nossa fauna:
cães, gatos, jacarés e lagartos
com suas formas desfiguradas.
Entardecia e as cores estavam vivas
e imploravam pelas tintas, pincéis
e o cavalete de Van Gogh.
O senhor eu mesmo tinha barriga acentuada,
cabelos brancos e pretos misturados,
e pareciam crescer
despreocupados.
Enfim chegou o crepúsculo,
luz e trevas duelando.
Olhava para o senhor e me via,
nenhuma dor ou alegria.
Ele eu mesmo carregava uma sacola
e uma mala,
poderia estar indo à escola
para aprender o que se perdera.
Poderia estar voltando
de uma tarde de bons negócios.
Poderia estar saindo de casa,
livre de um matrimônio
de 30 anos.
O senhor é meu espelho,
dossiês revelando
meus sucessos,
fracassos,
fiascos.
Tenho medo de sair de casa.
Sinto calafrios
ao ver esses fantasmas
rondando por aí
feito corvos.
(B. B. Palermo)
Você prosperou,
as riquezas do mundo estão a seus pés.
Acesso à medicina e seus remédios,
educação, tecnologia de ponta,
conforto.
Você dirige um carro que vale mais de cem mil.
Nada justifica esse semblante preocupado,
fumando um cigarro atrás do outro.
Relaxe, observe a obra de arte
que é a dança das águas
beijando as pedras,
nesses córregos cristalinos
correndo pelos campos,
vales e montanhas.
Pare de vez em quando,
fique em silêncio
contemplando o universo.
Devia estar radiante por desfrutar e compartilhar
toda essa aura com seres tão diferentes
e semelhantes a você.
Nossas posses,
nossos pulmões,
nosso coração safenado,
nossos rins e fígado, etc., etc.,
fotos, memórias e diários da infância...
Todos eles e tudo o mais
que tu imaginar
um dia qualquer
ficarão para trás.
(Pensamentos & poemas espirituosos)
Quando fui acertar a conta no bar, pendurada nos últimos dias, o bolicheiro não encontrou, no caderno, o meu nome. Ao repassar a longa l...