sexta-feira, 19 de outubro de 2018

Tão banal como uma folha em branco



O letreiro amarelado do bar
e os gritos vindos da mesa de sinuca chamam,
mas uma voz que vem de um resto de consciência
pede pra que volte pra casa.
Tenho medo de voltar.
Moradores do prédio vizinho rosnam,
e a imagem que me vem é uma faca
atravessando corpos na diagonal.
Garotas espalham orgias pela noite
e eu aqui melancólico.
Sei que tudo se reinicia
e sou livre e estou
rabiscando essas neuras.
Posso adotar um pet que me cuide,
posso adotar uma garota que me chame
para o café da manhã.
Livre, porém paralisado. Sim, sei que
posso fazer tantas coisas que ajudem a
suportar as armadilhas.
Pode ser um bom sinal o fato de achar engraçado
casaizinhos devorarem hambúrgeres gigantes.
Sei, sei, isso tudo é banal, inclusive a melancolia

de estar paralisado diante de uma folha em branco.
(B. B. Palermo)

sexta-feira, 12 de outubro de 2018

Caneladas e chutões



Dou uma passada pelas redes sociais e 
observo como está o jogo político.
Criaturas de todas as idades se digladiam à direita e à esquerda, 
a maioria fora de forma com relação às regras da argumentação, 
barrigudas, cansadas, amadoras.
Um festival de voadoras e caneladas e chutões pro alto.
Mas seguem jogando.
Sinto que é quase uma obrigação, 
como se o mundo fosse acabar amanhã.
As pessoas estão com raiva, 
inclusive alguns poetinhas.
Parodiando Bukowski, é a única coisa em que são bons.

(B. B. Palermo)

quinta-feira, 4 de outubro de 2018

Uma calcinha vermelha



No ano em que Elis veio de Curitiba me visitar, eu tinha um fusca azul com umas rodas e um volante e um som que eram a minha cara.
Naqueles dias, enquanto eu cheirava a cachaça, o fuscão cheirava a gasolina.
O pobre do mecânico do bairro tirava o tanque, lavava o tanque, virava o tanque do avesso e nada de encontrar o vazamento.
Assim que chegou, Elis analisou o ambiente do meu lar e disse que umas cortinas nas janelas da sala cairiam bem.
Percebi que ela tinha planos para mim. Isso me deixou em pânico.
Tudo veio abaixo quando ela remexeu o guarda-roupa e encontrou uma calcinha vermelha.
Pegou, de uma gaveta, uma tesoura enferrujada e fez picadinho.
Não consegui esconder certa satisfação com a sua raiva.
 Ela retalhava e gritava:
Cadela! Piranha! Vadia!
Aos seus olhos, CADELÃO era um garoto ingênuo e, por isso, um indefeso aos ataques das vagabundas.
Eu gostava daquele ciúme e me achava.
Falei da loira, suas coxas musculosas, novinha e estudante de psicologia, de lábios carnudos e que mordia minha boca sempre que gozava.
Elis ouvia com atenção e com olheiras e queria saber mais detalhes.
Daí a pouco emputeceu e sumiu o dia inteiro.
Voltou à tardinha e me presenteou com um pijama de seda, trouxe também cortinas pras janelas e umas compras do mercado.
Não quis jantar fora, cozinhou nosso prato preferido: molho de galinha e massa, com muito queijo e alho e pimenta.
Depois de duas taças de vinho, Elis, mais serena, quis saber detalhes de como a piranha loira e musculosa e cadela e novinha transava.
Mais tarde ela disse que ia tomar banho e depois me ensinaria umas coisas.
Fiquei meio nervoso, não queria ser um Cadelão traidor, pensar na loirinha musculosa enquanto Elis cavalgasse.
Rapidinho, suguei três doses de uísque do Paraguai.
Ao sair do banho, Elis não quis saber de conversa e partiu pra aula prática.
Aprofundou-se nos detalhes, repetimos, repetimos a lição.
 Foi a primeira vez que dei uma trepada com alguém rebolando a bunda daquele jeito.
Parecia rainha de escola de samba num ensaio pro carnaval.
Elis era uma especialista. Elis sabia ensinar.
Hoje, contando pra vocês, eu morro de vergonha.        
Eu não sabia trepar.

(B. B. Palermo)

segunda-feira, 1 de outubro de 2018

Pode ser que sim, pode ser que não

Encontros aleatórios                                     
pode ser que sim
pode ser que não
algumas vezes é só beijo
outras vezes a viagem é infinita
e alegra-se um cadelão de alma suja.
Calma, meu brother,
Nenhum sentimento de culpa,
você é um solitário nessas ruas.
As estrelas apostam suas fichas em você.
Do alto, coringas e outras cartas em suas mangas,
você é um cara divertido aos olhos do firmamento.
Aprenda a comunicar-se na hora do rusch.
Seja simples e direto, mostre numa frase o que quer.
Às vezes ganhará, às vezes não.
Nada de romantismo exagerado, vê se aprende meu irmão.
Quando nada funcionar, relaxa e pensa noutra coisa.
Sussurros e gemidos e palavrões, use na dose certa,
ainda mais se um bebê dorme no quarto ao lado
e a porta está aberta.
Não desista do romantismo.
O beijo é muito importante.
Roçar a pele, sentir o cheiro,
não perder de vista o “Império dos sentidos”.
Ginástica sexual é muito pouco,
mas pode ser um bom começo.
Se ela perguntar
“O que você está fazendo?”,
“O que vai fazer daqui a pouco?”,
“Bebendo uma cerveja?”,
é porque ela quer.
Faça o seu melhor.

Se deixar para depois, babau.

(B. B. Palermo)               

sábado, 29 de setembro de 2018

Os movimentos do amor



Quando trouxer uma flor roubada,
não me devolvas uma coroa de espinhos, meu bem.
Mesmo rejeitado, eu tiro de letra,
porque intuo os movimentos do amor,
como disse Drummond:
João amava Teresa que amava Raimundo
que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili
que não amava ninguém.
João foi para os Estados Unidos, Teresa para o convento,
Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,
Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes
que não tinha entrado na história.
Podes desdenhar, rir da minha cara,
contar pra todo mundo o quanto sou ridículo,
mas não esqueça que todos fingimos
que deciframos as vontades do amor.
Desejamos reter o amor e-ter-na-men-te.
Mas a vida segue. O tempo brinca
com nossos sentimentos,
ele executa as mesmas funções da diarista,
que varre e lava e limpa e passa...

(B. B. Palermo)

O PATIFE tá enrolando de novo

Quando fui acertar a conta no bar, pendurada nos últimos dias, o bolicheiro não encontrou, no caderno, o meu nome. Ao repassar a longa l...