terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Bendita - Fabrício Carpinejar



Palavra tem sentimento, muda o destino do casal. Um termo errado nos precipita ao desterro, o termo certo nos conduz ao paraíso. Falar não é um detalhe para as mulheres que nasceram para ouvir. É trocar um adjetivo, que renovamos o alvará do amor. Não podemos, homens, nos dar ao luxo da preguiça. A sedução é trabalho diário e incansável. Cultive o dicionário, colecione vocábulos, sente na gramática.
 
Não diga que ela é autoritária, diga que ela é uma liderança.
 
Não diga que ela é indiscreta, diga que ela é curiosa.
 
Não diga que ela mente, diga que ela possui uma imaginação poderosa.
 
Não diga que ela é estourada, diga que ela é corajosa.
 
Não diga que ela é atrapalhada, diga que ela é perfeccionista.
 
Não diga que ela é irritante, diga que ela é persistente.
 
Não diga que ela é consumista, diga que ela sabe escolher.
 
Não diga que ela é manipuladora, diga que ela é decidida.
 
Não diga que ela é dramática, diga que ela é emotiva.
 
Não diga que ela é vulgar, diga que ela ama a simplicidade.
 
Não diga que ela é imprudente, diga que ela é ousada.
 
Não diga que ela é ciumenta, diga que ela é interessada.
 
Não diga que ela é medrosa, diga que ela é sensível.
 
Não diga que ela cozinha mal, diga que sua comida é rústica.
 
Não diga que ela exagerou ao cortar o cabelo, diga que ela transpira independência.
 
Não diga que ela grita, diga que todos precisam ouvi-la.
 
Não diga que ela é agressiva, diga que ela é lutadora.
 
Não diga que ela é orgulhosa, diga que ela tem personalidade.
 
Não diga que ela é possessiva, diga que ela é cuidadosa.
 
Não diga que ela é mimada, diga que ela é uma princesa.
 
Não diga que ela não tem razão, diga que sua opinião é importante.
 
Não diga que ela sempre se atrasa, diga que admira sua calma.
 
Não diga que ela é confusa, diga que ela é misteriosa.
 
Não diga que ela é ambiciosa, diga que ela é sonhadora.
 
Não diga que ela entendeu errado, diga que você explicou muito rápido.
 
Não diga que ela é fofoqueira, diga que ela é bem informada.
 
Não diga que ela é obcecada, diga que ela não desiste.
 
Não diga que ela é maníaca, diga que ela é organizada.
 
Não diga que ela é gorda, nem tente encontrar um sinônimo, apenas não diga.

(Zero Hora, 26/02/2013)

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

Se eu fosse um padre



Numa época repleta de tragédias, sabemos que as religiões e a espiritualidade são muito importantes para nos confortar. Como seria difícil os pais enterrarem seus filhos, sem a ajuda da fé...
Por outro lado, vemos a proliferação de igrejas, não apenas de concreto, nas vilas de nossas cidades, mas também nos canais de televisão. Sabemos que tudo isso, em boa medida, não passa de um grande "negócio".
Trago aqui o que pensa o poeta, Mario Quintana, a respeito de Deus. Sem deixar de lembrar que ele brinca com as palavras, inventa e, também, vê Deus como um inventor - certamente bem-humorado, em vez de autoritário e castigador.



Se eu fosse um padre, eu, nos meus sermões,
não falaria em Deus nem no Pecado
— muito menos no Anjo Rebelado
e os encantos das suas seduções,

não citaria santos e profetas:
nada das suas celestiais promessas
ou das suas terríveis maldições...
Se eu fosse um padre eu citaria os poetas,

Rezaria seus versos, os mais belos,
desses que desde a infância me embalaram
e quem me dera que alguns fossem meus!

Porque a poesia purifica a alma
...e um belo poema — ainda que de Deus se aparte —
um belo poema sempre leva a Deus!

O mundo anda muito sério, cheio de "verdades" e dogmáticos que se autoproclamam donos da verdade. É que usam o nome de Deus, e de Jesus", com  a pretensão (falaciosa) de serem o seu porta-voz.
Está em falta, cada vez mais,  a imaginação, a criatividade, o faz de conta - que é muito peculiar  na infância.
O que aconteceu com a gente, para renunciarmos às surpresas (e belezas) da arte, da poesia e da vida?
Acho tudo isso uma renúncia à própria vida!

sábado, 23 de fevereiro de 2013

Jogo de palavras - Tulio Milman

Um guri de 14 anos foi ao futebol e não voltou. Aconteceu na Bolívia.
Um guri de 14 anos foi atingido no olho por um sinalizador.
E morreu.
Sentido figurado: essa areia movediça que é, ao mesmo tempo, refúgio e inferno. Ninguém aguenta uma vida literal, onde a distância entre cada palavra e seu significado se resume a uma linha reta. Mas tem hora e lugar para tudo.
Bando de loucos.
Só um louco aponta um sinalizador para uma arquibancada cheia de gente. E loucos, em bando, podem tudo. Porque são loucos. Porque ser louco é bacana. Porque só os loucos fazem parte do bando.
Jogadores, cartolas, jornalistas. Todos reproduzimos e induzimos, olhos vidrados, aos gritos: "Bando de loucos".
Batalha, exército, guerra, inimigo, morte súbita, guerreiro, matador. Termos que deveriam ser banidos para sempre do futebol. Porque a fronteira entre o literal e o figurado se apaga em um ecossistema contaminado pela paixão. É lindo morrer de amor. Na poesia. É lindo matar a saudade. Com um abraço. Num estádio de futebol lotado, ninguém está autorizado a matar. Ou morrer.
Sobe a placa: sai inimigo, entra adversário. Sai matador, entra artilheiro.
O maior jogador de todos os tempos se chama Pelé. Só. Duas sílabas que inspiram sorrisos, magia, poesia. E tem o gol do raio de sol, a folha-seca, a bicicleta, o balãozinho.
Não sei em que momento o futebol se transformou em guerra. Mas sei exatamente em que momento deveríamos depor as armas.
E esse momento já passou faz tempo.

Zero Hora de 23/02/2013 - Informe Especial - Tulio Milman

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Babysol


Como é bom ir dormir
agarradinho ao lençol
que esticou toda a tarde
espreguiçadinho ao sol
viu tudo o que passava
igualzinho a um farol
e de noite me acolheu
com seu cheirinho babysol!

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

De luto




Canção de um dia de vento - Mario Quintana





O vento vinha ventando
pelas cortinas de tule.

As mãos da menina morta
estão varadas de luz.
No colo, juntos, refulgem
coração, âncora e cruz.

Nunca a água foi tão pura...
Quem a teria abençoado?
Nunca o pão de cada dia
teve um gosto mais sagrado.

E o vento vinha ventando
pelas cortinas de tule...

Menos um lugar na mesa,
mais um nome na oração,
da que consigo levara
cruz, âncora e coração

(E o vento vinha ventando...)

Daquela de cujas penas
Só os anjos saberão!

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

Esses cães...

"A verdade é que os bichos, quando imitam as pessoas, perdem toda a dignidade"
(Mario Quintana).

Esses cães que passeiam
por festas e bares
são jovens amantes 
reencarnados
ou são Ets espiões 
fantasiados
que buscam ensinamentos
sobre nossas danças de 
acasalamento.

sábado, 16 de fevereiro de 2013

Saudade animal


Às vezes na minha rua
passa uma música
mais linda do que 
a do caminhão do gás.
É o tropt tropt
cadenciado
dos pisantes dos cavalos...
Nessas horas bate 
uma saudade animal
dos tempos de guri
quando ouvia 
a banda municipal!

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

Receita de espantar a tristeza - Roseana Muray



Faça uma careta
e mande a tristeza
pra longe pro outro lado
do mar ou da lua

vá para o meio da rua
e plante bananeira
faça alguma besteira

depois estique os braços
apanhe a primeira estrela
e procure o melhor amigo
para um longo e apertado abraço.

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

Bomba de gasolina

Na bomba de gasolina
abasteço e corro como louco
verdadeiro animal alado
pra logo voltar e fitar
seu olhar molhado.

Antes, 
minhas idas e vindas
                    diárias
se conformavam
com as chegadas e partidas
do ônibus da rodoviária.

Agora,
eu me perfumo
e abandono a sina de ermitão
só pra chamar sua atenção!

Como ela não tem nada com isso,
ensaio algumas danças
com as asas do pavão
e sonho meu destino
com a barby que se insinua
debaixo do macacão!

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

Quarta-feira de cinzas


O morto

Eu estava dormindo e me acordaram
e me encontrei, assim, num mundo estranho e
                                                            louco...
E quando eu começava a compreendê-lo
um pouco,
já eram horas de dormir de novo!
(Mário Quintana).

A gurizada
bebe e urina
à noite no salão
na esquina
jorrando seu rim
num rio Potiribu.
O rio vai matar a nossa sede
de água pura destilada,
pois é o nosso destino
viver de vida reciclada.

terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

Carnaval


Não suporto a ideia de ser moralista
mas que nenhuma dessas gatas
que bebe todas no carnaval
me apareça grávida amanhã!

Pelo amor de Deus
saibam que do short apertado
cochas bronzeadas
seios estalados
e um rebolado insinuante
repleto de tchan, tchan, tchan
vai acabar em sexo
e algumas gatas barrigudas 
amanhã de manhã...

Hoje não há tristeza
posso rir sem faz de conta
mandar a realidade pro espaço
e seguir o bloco da paixão
mas não deixo que a realidade 
perca de vista 
suas mentiras e verdades
e os tesouros perdidos 
                 da liberade.

É que debaixo de minha cama
tem um bando de ex-amores
que perturbam quem me ama
"E debaixo dessa escrita
tem sangue em vez de tinta
e alguém calado que grita" 
(Affonso Romano de Sant'anna).

O PATIFE tá enrolando de novo

Quando fui acertar a conta no bar, pendurada nos últimos dias, o bolicheiro não encontrou, no caderno, o meu nome. Ao repassar a longa l...