terça-feira, 19 de janeiro de 2010

O DEUS DE ZILDA ARNS



Ontem à noite estava assistindo a um programa de TV na BAND chamado “É tudo improviso”. Nesse programa atores e platéia contracenam, sem seguir um roteiro prévio - um tema, quais as falas, etc. - e, portanto, não é possível saber o que vai acontecer no final.


Ao assistir esse programa de TV me veio uma certa necessidade de estabelecer uma relação com um livro que estou lendo nesses dias: Jogos para atores e não atores, de Augusto Boal – Civilização Brasileira, 2008. O programa da BAND é interessante porque vai de encontro à seguinte idéia de Augusto Boal: “Todo mundo atua, age, interpreta. Somos todos atores. Até mesmo os atores! Teatro é algo que existe dentro de cada ser humano, e pode ser praticado na solidão de um elevador, em frente a um espelho, no maracanã ou em praça pública por milhares de espectadores. Em qualquer lugar... até mesmo dentro dos teatros.”


O programa da BAND possibilita que o público seja co-autor e co-ator do espetáculo. Isso, com certeza, causa nele um efeito mais interessante do que assistir passivamente a performance dos atores, os quais ensaiaram exaustivamente tal performance. Nesse programa há um encurtamento, ou eliminação da distância entre atores e não-atores.


Mas parece que falta algo, um “quase”, a esse programa, mesmo que ele seja muito mais criativo e inventivo se comparado às novelas e ao Big Brother. O “quase” que lhe falta é o de despertar nos sujeitos uma consciência e um desejo de mudar a realidade. Se por um lado “É tudo improviso” traz a platéia para o meio do palco, por outro ele segue o modelo de outros programas de TV, que é o de ter como alvo o mero entretenimento, ou a diversão pela diversão.


Para Augusto Boal, “o teatro deve ajudar-nos a conhecermos melhor a nós mesmos e o nosso tempo. O nosso desejo é o de melhor conhecer o mundo que habitamos, para que possamos transformá-lo da melhor maneira. O teatro é uma forma de conhecimento e deve ser também um meio de transformar a sociedade. Pode nos ajudar a construir o futuro, em vez de mansamente esperarmos por ele”.


Temos a realidade “real” e temos a realidade ficcional, que a arte (teatro, novela, etc.) nos apresenta. O objetivo de Augusto Boal, através de sua proposta teatral, é de que o teatro seja uma ferramenta que leve o sujeito (ator/não-ator, enfim, todos os sujeitos) a tomar consciência da realidade opressora que o cerca, e a buscar superar essa realidade. Nesse sentido, os temas que vão ser encenados na ficção são temas sociais que escravizam e tiram a liberdade dos sujeitos - como os preconceitos raciais e sexuais, o machismo, etc., tão presentes nas últimas décadas do Século XX e início do XXI.


O que cada vez mais anda em falta é recebermos um abalo (quantos graus?) da realidade. Enquanto a tragédia rola solta nas telas de TV dentro de nossas casas (O Haiti é ou não é aqui??; o terremoto é real, quando visto através de fotos diante da tela do computador?? ), nosso tempo desmancha no ar dada a preocupação com as fofocas (ficcionais ou não), com nossa turminha do orkut, onde nos exibimos com fotos, vídeos e frases “inteligentes” que copiamos dos livros. Compartilhamos tanta coisa e tanto tempo com a nossa tribo, que não sobra tempo para nos engajarmos em missões mais “nobres”, como a da Dr. Zilda Arns e outros (as), que estão espalhados pelo Brasil e pelo resto do mundo, agindo de fato em prol de um mundo melhor.


Parece-me que acompanhar o mundo pela TV ou pela internet (seja ou não na ficção) não produz tal choque de realidade. Ocorre o mesmo com o teatro tradicional (vale também para as novelas, etc.). Nesses, há um distanciamento entre ator e público. E, no final do espetáculo, o público não tem despertada a necessidade de melhorar o mundo, pois os atores (sejam heróis ou heroínas) já o fizeram por ele – pena que apenas no âmbito da ficção.
Da mesma forma que os atores do teatro tradicional, o Deus da maioria da população realiza, de maneira heróica, os nossos desejos, sendo o responsável pelo nosso destino. Dessa forma nós, pobres mortais, não temos nenhuma missão a cumprir. Basta depositar nas mãos de Deus, ou dos atores/heróis, nosso futuro.


Já o Deus de Zilda Arns - que morreu no Haiti trabalhando pela causa da vida, a ajuda aos pobres e às crianças – era um Deus solidário. Quem de nós está disposto a contracenar com esse outro Deus, no teatro da vida?

quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

SAIONARA



Tanta tragédia eu vejo ao redor

terremotos, guerras, drogas

fofocas fogos de palha

por todo o lugar

a dor absurda se espalha

seja em Ijuí

seja em Araraquara

mas meus olhos se alegram

sorriem e voltam a sonhar

porque apareceu

no seu horizonte

a Saionara!

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

MARIO QUINTANA



Eu sonho com um poema

cujas palavras sumarentas escorram

como a polpa de um fruto maduro em tua boca,

um poema que te mate de amor

antes mesmo que tu lhe saibas o misterioso sentido:

basta provares o seu gosto...

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

AMADOR

Na praia, tudo nos empurra a deixar pra depois. Aos poucos nos acostumamos ao sossego, como replay em câmera lenta. Pelo menos até uns vinte e poucos de janeiro o ritmo vai ser de tartaruga (sem querer ofender o bicho!) A não ser que alguma inspiração surja no caminho!

Lua crescente lua minguante

lua me leva pra onde for

contra a corrente ou a favor

sou amador sou amador.

A tua boca e o teu beijo

me envenenam pra onde eu for

seja em marte ou seja em Vênus

sou amador sou amador.

Saio pra rua armo barraco

tal qual lunático e agitador

mas quando ganho o teu abraço

viro amador viro amador.

domingo, 3 de janeiro de 2010

Lya Luft - do livro "Perdas & Ganhos"



Não é preciso consenso

nem arte,

nem beleza ou idade:

a vida é sempre dentro

e agora.

(A vida é minha

para ser ousada.)


A vida pode florescer

numa existência inteira.

Mas tem de ser buscada, tem de ser

conquistada.

quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

BEM ANTES DO SUS, PRECISO CUIDAR DO MEU CORAÇÃO


A partir de agora, o Instituto do coração do Hospital de Caridade de Ijuí (HCI) atenderá pelo Sistema Único de Saúde. Serão prestados serviços de Alta Complexidade em Cirurgia Cardiovascular... (...) A estimativa é de que cerca de 1,5 milhão de pessoas sejam beneficiadas com o atendimento. (Zero-hora, 31/12/2009).

Devo continuar judiando meu coraçãozinho para depois, em desespero, depositá-lo ao "deus-dará" nas mãos do SUS?

Tantas vezes o fiz trabalhar dobrado, porque comi e bebi demais.

Tantas vezes o fiz bater acelerado e descompassado, porque tive ódio, inveja, fraqueza e medo. E aí, em vez de dar-lhe folga, devorei copos e pratos cheios de coisas desnecessárias, fazendo-o trabalhar como um escravo.

Nos momentos de correr e caminhar, oportunidade para enrijecer os músculos de meu coração, deixei-me apanhar pela preguiça, e não tive tempo para ouvir a voz da razão e, muito mais, do meu coração.

Não é por acaso que coração simboliza sentimento, emoção. Se alguém te disser, meio rindo, no momento em que você estiver e-xa-ge-ra-da-men-te agressivo, "pra que tanto ódio nesse coraçãozinho!", você tem que responder: "Não meu amigo, não é meu coração que odeia, mas sim minha razão, que é a fonte e depósito de meus pensamentos. Meu coração só quer amar!".

O SUS promete cuidar de meu coração com assistência de alta complexidade, mas eu quero me antecipar a isso, e conhecer a complexidade de meus vasos, os quais permitem o sangue circular pelo meu corpo.

Certo dia fiquei espantado quando li que meus vasos sanguineos, se forem emendados uns nos outros, tem o comprimento tal a ponto de dar duas voltas em nosso planeta. E o meu caro coraçãozinho é quem bombeia sangue para toda essa extensão de mim.

Cuidar do meu coração nada mais é do que cuidar de mim. Porque, se ele parar de bater, o na-da sobre mim se abaterá.

quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

SEM TESÃO NÃO HÁ SOLUÇÃO



Até parece que eu sei

o que ele sentiu

quando a viu.

Foi algo do tipo:


Seu cheiro me atrai e enlouquece

e quanto mais me aproximar

mais vou querer e tentar

e tentar e querer...


Até quando esse jogo vai durar, não sei.

O tempo do tesão tem sua própria duração.

domingo, 27 de dezembro de 2009

SOSSEGO


Caramba, nem nas férias temos sossego.
Responder e-mails, cortar a grama, limpar o quintal porque os vizinhos, a toda hora, nos lembram disso com suas indiretas: " -Olha que pode aparecer cobra venenosa!".
Encontrar um lugar decente para os recortes de textos de jornais, livros e cds espalhados pelos cantos.
O pior é que nem nas férias nos livramos dos lapsos. "- Cadê o bilhetinho que continha número do telefone celular e e-mail daquele contato que poderá mudar nosso destino?"
E as compras do mercado, essas ficarão comprometidas, se não levarmos um bilhetinho no bolso, nem que seja para comprar meia dúzia de coisas. Se não anotamos o que vamos comprar, carregamos pra casa um monte de supérfluos. E, o que é pior, vamos entupindo os armários com sacos plásticos, e entupindo nossa consciência com sentimento de culpa.

Mas não tem nada, não. Um dia ainda aprendo a meditar, pra deixar a mente orbitar no seu devido lugar!

sábado, 26 de dezembro de 2009

AVISO IMPORTANTE - Luis Fernando Verissimo



O uso excessivo do telefone celular

frita o seu cérebro como uma fornalha.

Não é verdade mas espalha, espalha.


(Da série "Poesia numa Hora Dessas?")

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

UM VIOLINISTA NO TELHADO



A tradição, com suas regras e princípios, garante o conjunto de crenças que vão nortear as decisões de cada indivíduo. A tradição vai amortecer nossas quedas e tropeços, e vai auxiliar na hora de justificarmos nossas misérias.

Por outro lado somos, ao mesmo tempo, rebeldes e frágeis, e podemos sucumbir (uns mais, outros menos) à contracorrente que vem da rebeldia - aquela força tentadora em direção à mudança.

No filme Um violinista no telhado, seu personagem principal é um pai, de cinco filhas, que está no meio desse fogo cruzado entre o velho e o novo. E ele vive o dilema de maneira intensa. Embora rude, sabe que os livros, a cultura, o conhecimento adquirido pelos mais velhos, têm grande valor.

E por isso, a todo momento, questiona a Deus, grande representante da tradição judaica, o porquê da condição de pobreza, dele e de sua família. É analfabeto, porém não deseja que suas filhas também o sejam. Sua esposa é simples, batalhadora, enfim, é uma síntese das "boas" atitudes que estão em comum acordo com os apelos de sua cultura.

Mas ele deseja que a esposa conquiste uma melhor condição do que aquela. O mesmo vale para suas filhas. Vale ressaltar que as filhas não se deixam limitar pelas rédeas dessa tradição (machista). Ainda mais quando chega à aldeia um jovem rapaz com mais estudo do que os que ali moram. Ele mostra para elas (desempenhando o papel de, até certo modo, preceptor) uma outra visão de mundo, a da luta de classes, da exploração e alienação social.

Enfim, o pai, que elegemos como sendo o personagem principal, encontra-se numa situação semelhante à do violinista no telhado: suas atitudes e condição, o lugar onde está, tudo isso é perigoso, pois a toda hora pode escorregar e se machucar. Mas iso só ocorre porque está vivo. Vivo e ativo.

O nascimento, que é uma afirmação sui gêneris do novo, representa esse lugar de risco, mas de abertura para novas possibilidades, que podem resultar em ruptura com aquilo que é nocivo para nós e para com os que convivem conosco.

Que nesse natal, o nascimento não seja apenas o daquele menino que todos conhecemos pelo nome de Jesus. Que o natal sirva também para o nosso nascimento.

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

O amor derreteu-se
como um sorvete
no calor do verão
e ajudou a moça a despir
pernas cochas e ombros.

O PATIFE tá enrolando de novo

Quando fui acertar a conta no bar, pendurada nos últimos dias, o bolicheiro não encontrou, no caderno, o meu nome. Ao repassar a longa l...