sábado, 1 de agosto de 2009

MANDALIQUES - Tatiana Belinky



Limerick, em inglês, é o nome de um poema bem-humorado, feito de cinco versos. Os dois primeiros versos rimam com o último, enquanto o terceiro e quarto versos, mais curtos, rimam entre si. Um dos grandes expoentes nessa arte foi o inglês Edward Lear (1812-1888), mas quem fez com que o limerick se tornasse limerique mesmo, em português, foi Tatiana Belinky.


Uma das personalidades literárias mais conhecidas no Brasil, Tatiana Belinky nasceu em 1919, na Rússia, e chegou ao nosso país com dez anos de idade. Além de traduzir clássicos como Tolstoi e Tchekhov, criou e adaptou para a televisão inúmeras obras de literatura, dentre as quais se destaca a série O Sítio do Pica-pau Amarelo. É autora de mais de cem livros.


Sou um infeliz baderneiro.

Só quero fugir bem ligeiro:

Me mandam pra Marte

Ou pra qualquer parte

- Não sei para onde ir primeiro!



Comigo até a dona Marta

Brigou:- Eu de ti já estou farta!

Me deixa em paz

E suma, rapaz:

- Vai para o raio que o parta!


Eu acho o Janjão meio insano!

Com suas orelhas de abano

Em cima da hora

Mandou-me embora

Urrando: - Vai carregar piano!


As coisas comigo são chatas:

Até três simpáticas gatas

Mostraram-se bravas.

Mandaram-me às favas:

- Babaca! Vai plantar batatas!


Não sei se eu fico ou se chispo,

Não sei se me visto ou me dispo,

Quando o delegado,

Um tanto entediado,

Me diz: - Vai se queixar pro bispo!


Só espero um dia que chegue

Que eu possa montar no meu jegue

E todos aqueles

Mandões, todos eles,

Mandar: - Pro diabo que os carregue!


quinta-feira, 30 de julho de 2009

FÉRIAS



As crianças

tamborilam

pernas e dedos

para criar mais e mais

brincadeiras nas férias...

O tempo passa rápido

e os jogos indecisos

não espantam

o calendário e a ordem

que prende as horas.

Logo tem que voltar pra escola

com o tema de casa em dia

e o dia continua a ter

vinte e quatro horas.


terça-feira, 28 de julho de 2009

CANTIGAMENTE - Léo Cunha




PERGUNTA DE CRIANÇA

Intriga de adulto
não intriga criança.

- O que é que ele faz?
- Onde é que ele mora?
- Quem é seu pai?

Criança só quer saber o que conta:
- Que tamanho ele tem?

TECO - desenho de Guilherme Barroso



Poeta

inspirado

naqueles

que apanham

o instante

na hora exata

do tropeço

e do saco de batatas

esparramado no chão.

Teco não é poeta

de memória

pra fazer chorar.

Teco é contador de histórias

que o povo quer ouvir e contar!


sábado, 25 de julho de 2009

JARDINS



JARDINS – baseado numa crônica de Rubem Alves


Para Bachelard, "o universo tem, para além de todas as misérias, um destino de felicidade. O homem deve reencontrar o paraíso". Será que Deus, diante da escuridão e da confusão que era o universo, não sonhou com o paraíso (o seu jardim), repleto de cheiros de flores e ervas? Dizem os textos sagrados que as coisas que rodeavam Deus deixavam-no triste. "Foi então que ele sonhou com um jardim e compreendeu que era aquilo que o deixaria feliz, se existisse. E se pôs a trabalhar para plantar um paraíso. Terminado o trabalho, o Criador descansou, e se entregou ao puro prazer. Viu que tudo era muito bom (...) e resolveu que lugar melhor para se morar que um jardim não existe. E lá ficou, tomando prazer especial em passar em meio às plantas, à hora da brisa quente da tarde" (Rubem Alves).


Sonho com um jardim, e esse é um sonho apenas meu, resultado das lembranças plantadas dentro de mim, parentes das minhas saudades. Tudo isso para ressuscitar "o encanto dos jardins passados, de felicidades perdidas, de alegrias já idas". Todos sonhamos com um jardim. "Em cada corpo, um Paraíso que espera..."


Nos sonhos fundamentais da humanidade não havia todo o artificialismo que hoje impera. Os metais, a eletrônica, não podem roubar de nosso imaginário as florestas, as fontes, os campos, as praias, as montanhas. E também nosso mundo interior não pode se tornar metálico, sideral, vazio...
Disse o místico medieval Angelus Silésius:

Se, no teu centro um Paraíso não puderes encontrar, não existe chance alguma de, um dia, nele entrar.


O poema de Cecília Meireles revela nosso lugar e nosso destino:

No mistério do Sem-Fim, equilibra-se um planeta. E, no planeta, um jardim, e, no jardim, um canteiro: no canteiro, uma violeta, e, sobre ela, o dia inteiro, entre o planeta e o Sem-Fim, a asa de uma borboleta.


Somos a borboleta. E nosso destino, um jardim.

(Alves, Rubem.
O Retorno e Terno - Crônicas).


quinta-feira, 23 de julho de 2009

SAPO ENFEITIÇADO - Elias José



O sapo saiu sem rumo, com fome e com muita preguiça. Olhando a lua, viu voando a mais bela e miuda borboleta amarela. Parecia uma estrelinha ou uma flor voando. O sapo abriu a boca e ficou na boba espera. Na hora do bote pra engolir a borboleta, ficou parado, pasmo. De perto, a borboleta amarela era mais miuda, mais frágil e mais bela. Como destruir tanta beleza só pra encher a barriga? Era um sapo meio poeta!

quarta-feira, 22 de julho de 2009

O SOM DO CORAÇÃO



Assisti ao filme O som do coração. Quer dizer, voltei a assistir. Havia passado para meus alunos do Ensino Médio, no ano passado. Lembro que havíamos debatido, após, sobre o mesmo. Dizia para eles, para além do drama do personagens envolvidos - o pai que doa o neto, quando ele nasce, e diz para sua filha, a mãe, de que ele havia morrido. O menino vivendo em orfanato, esperando ser “encontrado” pelos pais... E o jovem pai, que não sabia que tinha um filho, etc. etc. - que se ativessem, também, à mensagem que o filme trazia a respeito do lugar e papel que a música tem, ou pode ter, em nossa vida. O menino, um “prodígio” em música, tem a certeza de que vai encontrar/ser encontrado pelos seus pais através dos sons, que ele harmoniza com sua criação artística.

Nessas horas constatamos, com muita dor, a distância que separa ouvintes/saboreadores de arte de massa (ou massificada), e os gênios, com sua percepção “diferenciada” (termo usado hoje em dia também no futebol, para designar os jogadores acima da média..). Foi o que senti ontem, ao folhear um livro de história da arte, e direcionar meu olhar, por alguns segundos, às pinturas de artistas renascentistas. Há uma beleza nestas obras (seja em pintura, música, poesia, etc.), mas a possibilidade de captá-la eu não vou aprender na escola, na universidade. Nestes lugares serei apenas treinado para ver com um olhar pré-estabelecido, formatado por regras que foram pensadas pelos outros.

A sensibilidade que temos para criar ou para saborear a arte parece que vem de outro lugar, para além da educação que recebemos ao nos inserirmos numa cultura. Será inato? Não sei. A genialidade de alguém se resume na genética? De qualquer maneira, aqui estamos nós, meio zonzos com tantos sons (seja do radio, televisão, internet...), com nossos ouvidos “viciados” pelos ruídos (o que é, e o que não é música?) que teimam em se repetir, iguais para todos, sejam gratuitos ou pagos às lojas.

segunda-feira, 20 de julho de 2009

DIA DO AMIGO



Palavras

carinhosas

foram deixadas

por uma brisa morna

e espantaram o frio.


Muitos abraços e

sorrisos desarmados

neste dia do amigo!


Num dia

em que o inverno

foi dormir cedo,

teve pesadelos

e roncou a noite toda...


Mas agora está quase acordado!


E vai encher de flores,

beijos e risos

o dia todo

- este que é o melhor dia de todos -

porque nos faz lembrar

que podemos todos ser amigos!

sexta-feira, 17 de julho de 2009

O AMOR




O amor achou
uma fresta
pra se exibir
com beijo na testa!

Ah, o amor!
Toda hora
se esconde
e se mostra
mas o que importa
é que nossa garupa
ele não salta!

Vamos deixar de onda:
o amor é irmão
de nossa sombra!

quarta-feira, 15 de julho de 2009

CARTUM






O cartum abaixo mostra os conflitos que surgem quando as regras são questionadas. As regras (que são convenções) são o que menos importa. O que interessa, sim, é sua aceitação pelos envolvidos. O “ideal”, numa comunidade do diálogo, é que todas pessoas tenham condições de argumentar e decidir racionalmente sobre uma questão. Aqui não, já que estão em conflito a mãe seu filho, que é uma criança. O personagem ensina uma importante lição, para nós, adultos: é contestador, e força sua mãe a apresentar argumentos sobre as regras estabelecidas. Por seu lado, a mãe
está conformada com a marcha do mundo e, além disso, acredita que provocar (questionando, que seja bem entendido) uma certa desordem na sociedade vai tornar a pessoa infeliz.


A MAMÃE ESTÁ
ME ENSINANDO A
SOLETRAR, MAS
EU NÃO ENTENDIA,
E ELA DISSE QUE
ERA MUITO SIMPLES:
JOEL, G-A-T-O
QUER DIZER
GATO, E EU
DISSE:
POR QUÊ?

E ELA DISSE POR
QUE É ASSIM,
E EU PERGUNTEI
POR QUE ERA
ASSIM, E ELA
DISSE QUE DEUS
QUERIA QUE
FOSSE ASSIM
E EU PERGUNTEI:
POR QUE
W-X-Y-Z
NÃO QUER
DIZER GATO?

E ELA DISSE QUE É POR-
QUE NÃO É ASSIM
E EU DISSE POR QUE NÃO
SE EU QUERO QUE
SEJA ASSIM E ELA
QUE É POR
CAUSA DAS
REGRAS...

EU DISSE QUE AS
REGRAS SÃO BOBAS
E G-A-T-O QUER
DIZER GATO É UMA
REGRA ESTÚPIDA E
ULTRAPASSADA, E
W-X-Y-Z QUER DIZER
GATO É MELHOR E
MAIS MODERNO E ELA
DISSE: NÃO TENTE RE-
FORMAR O MUNDO,
JOEL, OU VOCÊ SERÁ
MUITO INFELIZ!

E EU PERGUNTEI POR QUE
AS REGRAS ANTIGAS
ESTÃO SEMPRE CERTAS
E POR QUE AS REGRAS
NOVAS ESTÃO SEMPRE
ERRADAS, E ELA DISSE:
JÁ FUI PACIENTE DEMAIS
COM VOCÊ, RAPAZINHO,
E AGORA SOLETRE GATO
DE MODO CERTO OU IRÁ
PARA A CAMA UMA SEMANA
SEM VER TV...

E EU DISSE QUEM PRECISA
VER TV, E ELA DISSE: DEIXE
DE SER MALCRIADO, VOCÊ
PRECISA DE TV, E EU DISSE:
NÃO PODEMOS CONVERSAR
COMO DUAS PESSOAS
CIVILIZADAS, E ELA DISSE
QUE EU ARRANJEI ESSAS
IDÉIAS ENGRAÇADAS NA
RUA; FICAREI SEM TV
DURANTE UM MÊS...

E EU
DISSE
QUE
W-X-Y-Z
QUER
DIZER
GATO.

E NINGUÉM
ME
FARÁ
MUDAR
DE
IDÉIA.

A-B-C-D
E-F-G
QUER
DIZER
SOCORRO.

(Feiffer. Entre sensos e pensos. Gráfica Bahiense, 1976).

sábado, 11 de julho de 2009




Não dou conta
dos sussurros
à minha volta.

Os sentidos
de cada ato
se diluem no ar
sem pensamentos
pra apanhar.

Tantas opiniões
bem ditas
sobre novela,
futebol e política
são compartilhadas
pelos sujeitos
diante dos jornais
rádio e TV.

Tudo se anuncia
e escapa
em cada gesto
ou num piscar
de olhos.

sexta-feira, 10 de julho de 2009

MEDOS







Na hora exata
descobrimos
que não verte sangue
cortar as unhas.

Mais que depressa
outros medos
dizem sim.

Um deles
é a teimosia
de que um dia
vamos adivinhar
- e antecipar -
nosso fim.



quinta-feira, 9 de julho de 2009

RECOMPENSA



Ansiamos
pela notícia
bombástica
que vai nos alegrar.

Sustos fogem
num tropel de asas

investimentos
tantos
em sonhos

que um dia vão escalar
outros caminhos.

O menino encontrou
uma moedinha
de dez centavos

estava tão alegre
que nem ligou
se era noite
ou se era dia

abriu um sorriso imenso
pois ganhou na loteria!

terça-feira, 7 de julho de 2009

FUGA



O menino aceitou

dividir a mesa,

e como prova de amizade

ofereceu uma bolinha de gude.


Nesse dia jogava na defesa.


Logo a bolinha rolou

escada abaixo

e desapareceu

na sargeta.

domingo, 5 de julho de 2009

VÊ É UMA CAIXA - Valéria Belém

Alguns séculos antes de Cristo os filósofos afirmavam que era fundamental, dentre outras coisas, a busca pelo conhecimento de si próprio. Tanto naquela época, quanto hoje, pergunta-se, também, sobre a sociedade e o universo, a origem e fim, o todo e o nada. Mas isso pouco vale, se não se consegue saber quem somos – Michael Jackson aí está para mostrar o quanto o homem é complexo, e pode se perder nos labirintos de sua alma.


O que fazer para nos conhecermos melhor? Nos últimos séculos as ciências desbravaram imensos territórios, na busca pelo conhecimento. Um dos territórios investigado foi o da subjetividade, cabendo às psicologias e à psicanálise essa tarefa.




Costuma-se dizer que os outros auxiliam na compreensão de nós mesmos. Seus comentários podem iluminar nossos auto-julgamentos. Bem, desde que tenhamos coragem de nos voltarmos para nós mesmos!



No livro de Valéria Belém, Vê é uma caixa, algumas crianças resolvem fazer uma brincadeira: comparar seus colegas e amigos com objetos. “Vê é uma caixa, Mauro é puro livro, pois está sempre cheio de histórias, e Diná é como um chiclete”. Como reagiu cada um, ao ser comparado com TAL objeto? Vê, passado o susto, decidiu assumir “seu jeitinho caixa de ser”. Foi além: começou a fazer caixas, para dá-las de presente.




Essa atitude desencadeou uma série de eventos afetivos nas pessoas que eram de seu convívio. “Todos a-ma-vam” os presentes que recebiam, inclusive uma mulher mal-humorada, que morava na rua da escola e que tinha um jardim. “Tanto azedume não combinava com flores perfumadas!” (p. 18). Bastou ela receber de presente uma caixa, do formato e do tamanho de uma chave, que seu coração se abriu.




Essa história nos permite questionar a respeito de quantos sentimentos e emoções trancamos na nossa caixa interior, o nosso coração, e que deixamos de dividir, perdendo a oportunidade de fazer novas amigos, seja no trabalho, nas escola ou até nossos vizinhos.




Os livros também são caixas que, ao serem lidos, nos presenteiam com aventuras, dramas, suspense, comédias, tragédias... São “caixinhas de surpresa” que vão abrir, não apenas nosso coração, mas também a nossa mente. “Caixinhas de surpresa” podem ser também as pessoas, pois suas atitudes deixarão de lado a indiferença, alterando a ordem dos acontecimentos, como fez VÊ, na história de Valéria Belém.

quarta-feira, 1 de julho de 2009

RICARDO AZEVEDO - Ninguém sabe o que é um poema.



Com mais de cem livros infantis publicados, Ricardo Azevedo, nascido em São Paulo, considera-se um “bagunceiro da linguagem”. Segundo ele, poetas são sujeitinhos inconvenientes, que gostam de fazer bagunça e mudar tudo de lugar. Bagunçam a verdade, mexem com a inocência das palavras, seu som, seu peso, sua cor e seu ritmo que, muitas vezes, se insinua entre duas sílabas. Dessa forma, contrariam hábitos e convenções, “acordando” a linguagem de uma espécie de sono, enriquecendo-a com novos sentidos.




Esse “bagunceiro” não pretende explicar, mas sim partilhar suas inquietações: sobre violência, amadurecimento pessoal, o mistério que são os outros e a própria poesia.

POEMA DO TEMPO

Tem o importante que sabe que é comum
Tem o comum que se acha importante
Tem o diamante que sabe que é pedra
Tem a pedra que se acha diamante
Enquanto isso, o tempo passa levando


comuns, importantes, pedras e diamantes






Ao lermos em voz alta o poema Eu passei um dia inteiro, percebemos que o texto possui um ritmo, uma cadência que organiza as frases: isso é muito comum em poesia. De acordo com Ricardo Azevedo, esse gênero esteve ligado à música em diferentes circunstâncias históricas.

Eu passei um dia inteiro
pra fazer essa modinha,
você chega e vem dizer
que a modinha não é minha?

A modinha é minha, sim,
quem não sabe, vai saber,
não tem como duvidar,
vou provar por a mais b.

Veja só o jeito dela:
confusa, desajeitada,
coitada, destrambelhada,
capenga, desengonçada.

Basta olhar pra cara dela:
disforme, deselegante,
quadrada, mal-ajambrada,
mixórdia marca barbante.

Rima pobre, manquitola,
arremedo incompetente,
tentativa que não cola,
só amola, infelizmente.

Sem assunto, sem idéia,
banal, batida, bisonha,
lengalenga, logorréia,
sem sentido, nem vergonha.

Tal bobice é um bagulho
é tolice atrapalhada,
é só burrada e barulho,
de poesia não tem nada.

Vou parando por aqui,
já chega de picuinha.
Quero ver quem vai dizer
que a modinha não é minha!

Ao ser perguntado sobre “o que é a poesia”, Ricardo Azevedo diz que o ser humano é um ser que pergunta, e a poesia tem a ver com isso. “Para responder a suas constantes indagações, o homem inventou as religiões, as ciências, as filosofias e também as artes. Vejo a poesia e a própria literatura, ou seja, as artes feitas com palavras, como formas de perguntar, interpretar, discutir e de compartilhar, por meio da ficção, assuntos que emocionam, encantam ou perturbam a todos nós”.

sexta-feira, 26 de junho de 2009

ADELIA PRADO - BAGAGEM



SENSORIAL


Obturação, é da amarela que eu ponho.

Pimenta e cravo,

mastigo à boca nua e me regalo.

Amor, tem que falar meu bem,

me dar caixa de musica de presente,

conhecer vários tons pra uma palavra só.

Espírito, se for de Deus, eu adoro,

se for de homem eu testo

com meus seis instrumentos.

fico gostando ou perdôo.

Procuro sol, porque sou bicho do corpo.

Sombra terei depois, a mais fria.

quinta-feira, 25 de junho de 2009

LÓGICA - Sidónio Muralha



Eis uma fábula que nos faz pensar a respeito

da exploração do animal ( e do homem) pelo homem,

além de nos chamar a atenção

para o ritmo de vida na sociedade atual.


A preguiça lentamente,

lentamente a balançar,

parece dizer à gente:


- ora essa! ora essa!


Sou eu que vou devagar

ou você que vai depressa?

domingo, 21 de junho de 2009

POSTAR COMENTÁRIOS



Devido a problemas técnicos, não foi possível ativar a função "comentários". Porém, ao clicar no título de cada postagem, torna-se possível adicionar um comentário. Considero que a interação autor/leitor é fundamental, inclusive com relação à "cara" que este blog "deve" ter no presente e no futuro. Por isso, aguardo retorno de todos vocês. Abraço do Américo!

OS SONHOS DE DICÃO



Se um homem atravessasse o paraíso em um sonho e lhe dessem uma flor como prova de que havia estado ali, e se ao despertar encontrasse essa flor em sua mão... então o quê? (S. T. Coleridge.
IN: Jorge Luis Borges. Livro dos sonhos).

Todo homem acordado habita um mundo comum; porém cada um pensa que habita seu próprio mundo quando dorme (sonha); acordado, conversa com o mundo da natureza; dormindo, com seu mundo particular... (Joseph Addison. Op. Cit. P. 60).

Há poetas que disseram que a vida dos homens é a sombra de um sonho e há filósofos que sugeriram que a realidade é uma alucinação. (Giovanni Papini. Op. Cit. P. 64).

Os sonhos desejam coisas estranhas! E eles são nossos sonhos! Então, se desejam coisas estranhas, nós também desejamos coisas estranhas... Todos ouvimos a sua voz. O problema é que os sonhos nos visitam quando menos esperamos! E estamos sozinhos na hora de escutar o que eles querem nos dizer!... Apesar de muitos afirmarem que sabem com certeza o que eles nos vem dizer. Os sonhos, ah!... Os sonhos... vai chegar o dia em que desvendaremos cada um de seus segredos!...

Dicão sonha muito. É que nos sonhos sua Voz Interior vem-lhe falar. Desde os tempos antigos até hoje, muitos adultos dizem que sabem o que é a voz interior...Mas uns não concordam com os outros... Alguns acham que a voz interior é Deus falando com a gente. Outros dizem que são energias, forças, que sempre existiram no universo... Outros dizem que é a nossa própria voz, que fica nos pregando peças e não nos deixa saber quem é... Pode ser nossa própria memória, aquele baú onde guardamos as lembranças do que vivemos no passado e que foi tão bom que não queremos nunca mais esquecer, e que foi ensinado pelos mais velhos, como nossos pais, avós e bisavós...


Também dizem que os sonhos revelam o que aconteceu em distantes lugares do mundo. Ou são previsões do que ainda vai acontecer.


Já que dizem tanta coisa, o melhor é não esquentar a cabeça...


O que importa é que, por ser um grande dorminhoco, Dicão recebe com freqüência a visita de sua voz interior... E é por isso que ele dorme tanto!... Dizem seus amigos que ele dorme demais!... Alguns acham que ele toma umas porcarias para dormir e sonhar!...

Uma vez Dicão reclamou com seus amigos de que as histórias são sempre contadas quando as pessoas estão acordadas. Por que não escutar as histórias das pessoas quando dormem? Foi aí que ele lembrou a todos que, quando dormimos, sonhamos. E os sonhos contam histórias muito importantes. Foi assim que Dicão narrou seus sonhos, e as mensagens que ele achou que transmitiam. Ele disse que não precisou da ajuda da cartomante para decifra-los!...
Um dia sonhou que caminhava pelas ruas. Era uma manhã movimentada de sábado, e ele vestia roupas brancas. Procurava as pessoas honestas. Encontrou sua Voz Interior, que lhe disse que as pessoas honestas vestiam roupas brancas.


Pelas ruas da cidade muitas pessoas vestiam roupas pretas. Essas pessoas fugiam dele, porque achavam que ele era um fantasma...


Dicão carregava uma pá, para desenterrar a honestidade, que se escondeu nas profundezas da terra. Com a pá, jogava terra nas pessoas que ele dizia serem desonestas. Quanto mais terra jogava, mais brancas as pessoas ficavam, até se purificarem, como ele...
Quando acordou, tremia de frio. As cobertas haviam caído no chão do quarto, e ele estava com muita sede.


No dia seguinte, aquele sonho martelava na sua cabeça. O que poderia significar? Pensou, pensou, e achou que a Voz Interior mandava a seguinte mensagem: tinha a missão de sair por aí para mostrar às pessoas que é legal elas serem boas com os outros e consigo próprias. E que a cor branca significa honestidade, que é o que as pessoas esperam umas das outras, pois vivem juntas, no mesmo planeta.

quinta-feira, 18 de junho de 2009

EROS




Ao acordar
pela manhã
me perguntei
a quem me atreveria
amar.

Sem demora
a memória
apontou-me
quatro elementos:


terra
água
fogo


e ar.

Em seguida
a lua levada

lavou meus olhos,
enfeitou-se
de nova
cheia
crescente
e minguante.

Foi o bastante
para que as correntes
de sol e chuva
me levassem
a planetas
galáxias e
continentes.

E um eclipse, como uma garrafa
a vagar por anos e anos nos oceanos,
trouxe a mensagem do grande deus:
“És parte
migalha
milagre
de um todo
que sempre foi
e sempre será:
EROS”!

segunda-feira, 15 de junho de 2009

QUAL A PALAVRA? Roseana Murray



Nas estradas mais antigas,

trilhas, atalhos,

nas montanhas altas, escarpadas,

nas vilas, nas cidades,

nos oceanos, cachoeiras,

em todos os rios

e fios de água,

em todas as ruas

e becos,

nos recantos escuros

e claros,

em cada pedaço

de mundo

grande ou pequeno,

uma palavra estandarte

costura a Terra no céu,

costura os homens na Terra,

inventa a vida.


Nos gestos de todo dia,

na mesa posta, no olhar,

no sorriso, na carícia,

uma palavra vem antes de todas,

é a chave da lua e do sol.


Lua perdida

nos quatro cantos

do mundo,

assombrando os sonhos.


Às vezes adormecida

no rastro vermelho

do sol.


Uma palavra é argila,

trigo e floresta.

É água macia

de lavar as mãos

e os corações.

Fio primeiro de todos os panos,

nessa palavra as palavras se banham.


Essa palavra tão pequena

e grande,

pássaro palpitante,

palavra viva em carne viva.


Palavra de mudar o mundo,

de fazer pão e telhado,

de abrir os cadeados,

as porteiras trancadas

do universo,

as águas azuis

que dormem no fundo

de cada homem.


Palavra escrita na palma

da mão de cada gente,

junto com as misteriosas

linhas da vida.

Junto com a trama

secreta

do destino.


É preciso soletrar

suas letras,

soprar bem alto

seu nome sonoro,

como poeira mágica,

como pólen, seiva

ou luz.


Nas chamas do dia,

nos ventos da noite,

pelos mares, oceanos,

desdobrar sua magia,

como se desdobram

as velas guardadas

de um barco.


Por todos os vales,

riachos, montanhas,

acordar seu nome,

soar seus sinos,

espalhar seu brilho.


Acordar seu nome

como o sol

acorda seus pássaros

e a noite os seus mistérios.


Para que os homens

de todas as terras,

de todas as línguas,

de todas as cores,

de todos os povos,

para que todos os homens

dancem junto com a terra

a dança silenciosa dos astros.


A dança secreta

dos astros,

desde sempre dançada,

infinitamente.


E para que a terra possa

continuar viva para sempre,

sempre viva rodando para sempre,

rodando para sempre,

rodando para sempre.



sexta-feira, 12 de junho de 2009

O AMOR - em tempos de encontros e desencontros dos namorados





Meio que por acaso, tenho em mãos o poema de Carlos Drummond de Andrade, Poema dos olhos da amada. Tudo bem, não é por acaso, já que estamos vivendo o “dia dos namorados”. Diz o poeta, na primeira estrofe do poema:



Eu te amo porque te amo,
não precisas ser amante,
e nem sempre sabes sê-lo.
Eu te amo porque te amo.
Amor é estado de graça
e com amor não se paga.



A relação amorosa leva-nos a um conhecimento sobre nós mesmos. A pessoa, a quem amamos, coloca nossa identidade em risco porque, ao nos aventurarmos como amantes, nos deparamos com o incerto. O que ganhamos nessa aventura, onde o outro nem sempre corresponde a nossos anseios? Percebemos que existimos. O filósofo Kierkegaard foi quem primeiro relacionou os conceitos de amor e de vida ao conhecimento de quem somos - no sentido socrático do “conhece-te a ti mesmo”.


Ao pensarmos em amor para além das relações mundanas (provisórias, mutáveis), nos deparamos com a tradição dos gregos (e de Santo Agostinho), que pensam o amor pra além do efêmero, cotidiano e visível. Diz Sócrates, no Banquete: “Quem ama e deseja é porque não tem”. A questão que fica, é: o que amamos e desejamos, que tanto nos faz falta? Na visão socrática, amamos algo desconhecido, invisível, mas que não é efêmero nem passageiro. Amamos a sabedoria, que é universal e eterna. A dificuldade está em admitir essa visão filosófica e cristã sobre o amor. Temos dificuldade de considerá-la porque estamos presos à linguagem permeada de lugares-comuns de nosso cotidiano. Daí também a dificuldade em compreender o poema de Drummond:



Amor é dado de graça,
é semeado no vento,
na cachoeira, no eclipse.
Amor foge a dicionários
e a regulamentos vários.

Eu te amo porque não amo
bastante ou demais a mim.
Porque amor não se troca,
não se conjuga nem se ama.
Porque amor é amor a nada,
feliz e forte em si mesmo.



Se o amante busca se assemelhar à sua amada, isto pode ser uma forma de conhecimento de si. O que ele encontra de semelhante é o amor. Diz Agostinho que “encontramos fora de nós o amor que sempre esteve em nós”. “Trata-se de amar os homens humanamente, ou seja, de confiar que em sua essência, e em nenhuma outra coisa no mundo, existe uma infinita capacidade de amar, o que se conhece e o que não se conhece. Pode-se pensar o amor como esse infinito que está sempre a faltar entre duas pessoas. Quando elas se encontram, o amor ganha corpo e o infinito se esvai, até que elas voltem a sentir sua falta”. (Paulo Henrique Fernandes Silveira. Amor sem fim. In: Revista Ciência&vida, ano III, n. 35).


Nessas horas de comemorações, muitas vezes turbinadas pelo “apelo comercial”, fica complicado convidar o leitor a desenvolver idéias requintadas, “pensamentos complexos”, sobre o amor. Discussões mais demoradas e profundas, sobre temas como o amor, não são de nosso hábito. Estamos habituados ao conforto, não ao confronto de idéias. Dia após dia a televisão fornece modelos de amor para que sirvam de nossos guias. Enquanto isso, o conhecimento que recebemos de nossa tradição cultural fica escondido nas estantes das bibliotecas. Mas perder o trem da história e da tradição é uma forma de acomodação, o que é péssimo para nosso intelecto.


Uma questão: se ao amarmos alcançamos um maior conhecimento de nós mesmos, isso pode servir de estímulo para mudar/melhorar nossa visão de mundo? Ficaremos mais autônomos e com maior capacidade na solução de problemas individuais e sociais, inclusive com relação ao amor? Alguns, ao “descobrirem” o amor, afirmam que a vida ficou mais colorida, viver ficou “mais leve”... Seguindo a concepção do filósofo Sócrates, de que o amor “verdadeiro” é o amor ao conhecimento, ao bom e ao belo universais, nos momentos de descoberta e vivência do amor em nosso cotidiano estaremos exercitando nossa inteligência no sentido de ampliar nossa sensibilidade (não no sentido egocêntrico, mais no sentido social/democrático)?



Tendo que parar em algum momento esta reflexão sobre o amor, reconhecemos que, sobre esse tema, é necessário, nalgum momento, recomeçar tudo de novo. A propósito, e para curtir o dia dos namorados com algumas dúvidas na cabeça, que amor é esse que o poeta Drummond evoca no final do poema?



Amor é primo da morte,
e da morte vencedor,
por mais que o matem
(e matam)
a cada instante o amor.

quarta-feira, 10 de junho de 2009

O QUE EU QUERIA DIZER



O que eu queria dizer

ficou rabiscado a lápis

numa folha

dentro da gaveta

do escritório.


Lembro que falava

de abraço e de calor

pra aquecer o coração.


Já não lembro

de outras coisas mais.


Quem sabe

terei mudado

até o próximo feriado

e vou guardar num diário

sujo e rabiscado

as façanhas que virão.

domingo, 7 de junho de 2009

UMA PALAVRA SÓ - Angela-Lago



Mineira de Belo Horizonte, Ângela Lago nasceu em 1945. É autora e ilustradora premiada no Brasil e no exterior, com vasta obra para crianças e adultos. Para o leitor interessado em se aprofundar na sua obra, bem como nas suas idéias sobre a importância dos livros (e tantos outros temas, tais como o lugar e papel da internet nos dias atuais), basta acessar o site www.angela-lago.com.br.
O livro que aqui citamos (e recomendamos aos pais, professores e ao público em geral), Uma palavra só, traz a seguinte resenha da editora Moderna:

Era uma vez um rei mandão — como muitos — que resolveu
castigar qualquer um que falasse uma mentira (mentira pelo
menos no seu ponto de vista). Mas a primeira vítima do castigo
real é seu próprio filho, condenado a nunca mais abrir a boca
para falar, a não ser, única e exclusivamente... a palavra “exclusivamente”.
É assim que o príncipe sai pelo mundo, respondendo
a tudo: “exclusivamente”. Até que um dia ele conhece Eva, uma
contorcionista que o ensina a ler e escrever. Ele percebe então
que, a partir das letras E –X – C –L – U – S – I – V – A – M – E – N –
T – E, ele pode formar muitas outras palavras. Ao começar a
dizê-las, porém, é denunciado e levado à presença do rei, que
decide revogar o castigo e até mesmo entregar-lhe a coroa se ele
conseguir responder naquele seu método “exclusivo”, a três perguntas.
O príncipe consegue, ganha a coroa, e o rei descobre que
o melhor que tem a fazer é ir ter aulas com a contorcionista.

Um dos objetivos dessa história é o de provocar uma reflexão sobre o poder, e a intransigência daqueles que provisoriamente detêm sua posse. Nas relações sociais (onde estão em jogo os mais variados discursos, e os interesses em torno da sua verdade ou falsidade), o poder desempenha um importante papel, marcando as ações dos sujeitos.
Quando se trata da ação humana, os imprevistos fazem a diferença, ainda mais se entram em cena sentimentos grandiosos, como a descoberta do amor. Ao mesmo tempo, a descoberta e posse da palavra permite a comunicação e a ampliação da visão de mundo de seus personagens.


COMENTÁRIOS SOBRE A OBRA (fornecidos pela editora)

Esta história divertida recria os tradicionais contos em que um
rei, prepotente, castiga um inocente e depois é derrotado, quer
pela astúcia, quer pela intervenção de seres mágicos e protetores.
Aqui, zomba-se da prepotência do rei logo no início, com o
ridículo castigo que impõe. A fada protetora aparece na figura
de uma contorcionista de circo, cuja mágica é saber ler e escrever.
E o rei, contrariando as expectativas, não fica furibundo com
a sua derrota: numa atitude muito moderna e original, reconhece
que precisa de aulas com a contorcionista — quem melhor
para ensinar as pessoas a ter jogo de cintura? Outro ponto positivo
deste bem inventado texto é o de brincar com a composição
das palavras, um estímulo prazeroso para a criança que começa a
descobrir os segredos das letras.

quinta-feira, 4 de junho de 2009

POEMAS DE ADEMIR BARBOSA JR. - Do livro O SAPO VOADOR






BANHO


por que castigo

se é a sujeirinha

que mora no umbigo?



BAGUNÇA


mamãe, não castiga!

eu sou a cigarra

você é a formiga


****


o louva-a-Deus

recita: sou apenas

um inseto


****


a lua respinga

nos olhos atentos

do gato escaldado


****

Pra finalisar, por hoje, um HAICAI

de PAULO LEMINSKI:


de colchão em colchão

chego à conclusão

meu lar é no chão

Ovelha desgarrada

  Manhã de domingo, Beiço deu as caras: – Velho. Andei pensando. Está na hora do Cadelão parar de cair nas sarjetas próximas a bares para ...