Meu poema não reivindica
amores frustrados. Não humaniza estrelas e endeusa a lua cheia. O poema se
engraçou com o novo bar repleto de chinelões mal-encarados, putas e carinhas
drogados que se apavoram com o passado e se embebedam para suportar o amanhã.
O amor magoado proíbe que o
poema sangre que a metáfora lateje e a febre goze. É uma temporada de tempo
abafado, raiva a zero grau.
Mágoas de amor se engraçam no
escândalo e submissão, no homicídio e suicídio raivosos. Só depois se tornam
poemas.
Fazer poesia para se
purificar de amores mal-amados é roubar o emprego do analista.
Mas Cadelão - diz uma Ninfa
enluarada e esperta - o mundo está carente de poetas. Não critiques os
enamorados, os que despertaram e vivem de paixões, e também os que gangrenam
suas dores insuportáveis, não deboches por se dedicarem à poesia. Afinal, são
tão poucos os sensíveis neste mundo frio e cruel.
Sim, garota esperta, você tem
razão. Mario Quintana também o disse:
"Eu acho que todos
deveriam fazer versos. Ainda que saiam maus, não tem importância. É preferível,
para a alma humana, fazer maus versos do que fazer nenhum. O exercício da arte
poética representaria, no caso, como que um esforço de auto-superação. É fato
consabido que esse refinamento de estilo acaba trazendo necessariamente o
refinamento da alma. Sim, todos devem fazer versos. Contanto que não venham
mostrar-me" (Caderno H).
(Diário de B. B. Palermo)