segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015

Lero Lero - Cacaso

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Lero lero

Cacaso

Sou brasileiro de estatura mediana
Gosto muito de fulana mas sicrana é quem me quer
Porque no amor quem perde quase sempre ganha
Veja só que coisa estranha, saia dessa se puder
Não guardo mágoa, não blasfemo, não pondero
Não tolerolero lero devo nada pra ninguém
Sou descansado, minha vida eu levo a muque
Do batente pro batuque faço como me convém
Eu sou poeta e não nego a minha raça
Faço versos por pirraça e também por precisão
De pé quebrado, verso branco, rima rica
Negaceio, dou a dica, tenho a minha solução
Sou brasileiro, tatu-peba taturana
Bom de bola, ruim de grana, tabuada sei de cor
Quatro vez sete vinte e oito nove´s fora
Ou a onça me devora ou no fim vou rir melhor
Não entro em rifa, não adoço, não tempero
Não remarco, marco zero, se falei não volto atrás
Por onde passo deixo rastro, deixo fama
Desarrumo toda a trama, desacato Satanás
Sou brasileiro de estatura mediana
Gosto muito de fulana mas sicrana é quem me quer
Porque no amor quem perde quase sempre ganha
Veja só que coisa estranha, saia dessa se puder
Diz um ditado natural da minha terra
Bom cabrito é o que mais berra onde canta o sabiá
Desacredito no azar da minha sina
Tico-tico de rapina, ninguém leva o meu fubá

sábado, 31 de janeiro de 2015

Três pactos de morte - Paulo Henriques Britto



Como se fôssemos pássaros
voamos contra a vidraça.

Dançamos duas valsas sobre a mesa.
Roemos os ângulos dos móveis.

Copulamos em pleno voo, depois
nos atiramos na chama da vela.

E um cheiro forte de borracha queimada
nos acompanha até o paraíso. 


***
1. Antes que fôssemos mumificados por completo, você descobriu uma maneira de apodrecer tão depressa que fosse impossível até mesmo para o mais hábil mumificador do Alto Egito.
2. Nossos resíduos rolaram rio abaixo e foram vistos a trinta e cinco quilômetros do Delta, tentando desesperadamente dissolver-se na salmoura do mar.
3. Estado coloidal.

***
Embora não fôssemos nem um pouco
como duas gazelas se apascentando entre as açucenas,

nem muito menos como um rebanho de cabras
que descesse as colinas de Galaad,

nem por isso merecíamos ser confortados,
em vez de com bálsamos e maçãs,

com meio vidro de formicida cada um
num quarto de hotel barato em Cafarnaum.


(do livro Macau)

quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

Os filhos do sim - Heloisa Seixas



Este conto da Heloisa Seixas vai nos levar a uma reflexão sobre a questão da mudança de comportamento na relação pais e filhos nos últimos tempos (contemporâneos). Tempos pós-repressão. 

A mulher estava sentada lendo um livro, na sala, quando ouviu o grito da filha. Depois, um estrondo de porta batendo. Murmúrios, passos. E a mocinha apareceu na sala, com uma expressão terrível no rosto. Tinha acabado de se pesar na balança do banheiro. Engordara um quilo. “Um quilo!”, dizia, aos gritos, a ponto de a mãe pedir que baixasse a voz, por causa dos vizinhos.

E a menina saiu da sala, com o rosto amarrado. Pouco depois, entrou o filho. Suando, chegava da academia. Tinha, também, um ar atormentado. Entrou, cumprimentou a mãe e desapareceu a caminho do chuveiro, parecendo imensamente cansado. E a mulher ficou outra vez sozinha na sala, pensando. Fechou o livro e levantou-se, caminhando até a janela. Pensava no sofrimento dos jovens de hoje.

Filhos e filhas daqueles que fizeram a revolução da contracultura – dos hippies, loucos, guerrilheiros – esses jovens poucas vezes ouvem um NÃO na vida. É uma geração para a qual quase nada é proibido. Os pais de agora, que foram jovens nos anos loucos, têm enorme dificuldade em impor disciplina. Deixam os filhos fazer tudo. Chegar tarde, sair durante a semana, trancar-se no quarto e dormir com a namorada ou o namorado – tudo. 

Talvez isso tenha criado um vazio na vida desses rapazes e moças, refletiu a mulher, olhando as luzes da rua. Os jovens de hoje formam uma geração que pode tudo. Com acesso livre a todas as informações, têm, diante de si, enorme variedade de ofertas de consumo.... Biscoitos, por exemplo, pensou a mulher. No tempo dela, só havia dois ou três tipos de biscoito doce. Hoje, em qualquer lojinha de posto de gasolina, há prateleiras inteiras de biscoitos de todos os tipos, recheados ou não, com chocolate amargo ou de leite, com nozes ou passas, tudo. Biscoitos demais. Mas, para quê? Inútil paisagem. Não se pode comer! E quem proíbe? São eles mesmos, os jovens.

Eles mesmos inventam aquilo que não se pode fazer. Precisaram criar suas próprias impossibilidades – talvez pelo excesso de vezes em que ouviram um SIM dos pais. Porque o ser humano precisa do proibido. Então agora é proibido comer, é proibido não ter músculos, é proibido ser feio, é proibido envelhecer. O padrão de beleza vigente é irreal. Parece ter sido criado apenas para fazer sofrer – pois é inalcançável. Qualquer mocinha que não viva à base de alface e água – a não ser as que, por natureza, tenham a sorte de ser excessivamente magras – vai se olhar no espelho e chorar porque não tem aquele aspecto de campo de concentração que se vê nos anúncios de moda (incluindo os olhares, tão tristes). 

É essa a vida dos jovens, hoje – concluiu a mulher, dando de ombros. Coitados. São os filhos do sim.”

segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

Aves desejantes - Paulo Fensterseifer




Amigos, eis uma bonita (e valiosa) contribuição para pensarmos a relação dos humanos com os bichos. O poema foi escrito pelo professor Paulo Fensterseifer, e a ilustração é da professora Andreia Aparecida Czyzewski.


sábado, 24 de janeiro de 2015

Agostar de você



Por que fui cavar, cavar para desenterrar o sapo e beijar a princesa, se anjo não dá moleza? Sonhar com o primeiro beijo, num camping, praia ou passeio. Pra que tanto sofrer e penar, se comigo ela não quer ficar? Pesquisei todos os passos na internet, como ter lampejos para ganhar seu primeiro beijo. Anatomia, biologia e geografia. Mapeei no imaginário pescoço, bochecha, orelha, testei perfumes para ter pra mim sua alegria. Seus nãos são pura adrenalina que me jogam com vontade num bote em alto-mar. Se na primavera agostava só um pouco, no verão agosto muito mais. Embora agosto seja mês de cachorro louco, vou remar, remar até lá, pois é tri-agridoce te agostar!


(TIRADAS do Teco, o poeta sonhador)

quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

Realidade



Mãe e filho precoces. O pai desaparece. É fácil olhar do outro lado da rua e julgar a realidade que, nua, a nossos olhos se transveste. Estou no meio do povo e faço de conta que dou conta de toda a verdade. Meus olhos usam filtros, leis, mordaças, e são cruéis com a realidade. Ajusto, ajusto, até ficar satisfeito com os limites de minha compreensão. Também minha palavra foi forjada por duras ferramentas. A palavra que busco ao poema é outra – sempre - e foge, se distancia, como uma sombra. Ou dá o bote, como uma serpente.


segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

Amor ou humor?



Em alguns momentos “anormais”, em que tudo foge do previsto, aquilo que gostaríamos que acontecesse, buscamos um consolo (ou desculpa). Para dirimir a frustração, dizemos: “Eu tive um pressentimento de que isso ia acontecer”. Nessas horas “rir é o melhor remédio”. Érico Veríssimo afirmou que “em certos momentos o que nos salva nem é o amor, é o humor”.
***
Um adolescente, aluno do Ensino Médio, me contou como faz para gabaritar as provas de Ensino Religioso. Dentre as alternativas para as questões, escolhe sempre respostas que agradam a professora, tais como: “Eu amo Jesus”. “Quando eu crescer, quero ter fé em Deus”. Nada de questionamentos existenciais, do tipo: “De onde vim?”, “Para onde vou?”. Ou perguntas mais radicais, tais como: “Se Deus nos ama, porque permite tanta violência e pobreza no mundo?” E acrescenta:
- Se eu disser o que penso, que é mais ou menos “Foda-se isso! Foda-se aquilo!”, ela vai me mandar sair da sala de aula e ir direto pra coordenação da escola.
Perguntei-lhe, então:
- Você fica angustiado e infeliz, por ter que dizer o que agrada à profe, e te garante passar de ano sem pegar exame?
- Não. Até que não sofro. Tanto é que estou aqui contando e rindo desse fato. Obter nota alta ou não numa disciplina não vai resolver minhas dúvidas sobre crença religiosa.
Aproveitando a deixa, falei-lhe da estreita relação entre liberdade de expressão e responsabilidade, e também de que não há sociedade e (óbvio) escola sem uma certa repressão. Daí a importância de abrirmos espaços para o humor; rir de determinadas situações, usando-as como válvulas de escape para nossas frustrações.
Além do humor, há a possibilidade da ironia. O que não podemos aceitar é a visão simplista de que no mundo existem apenas duas possibilidades: de que ou estamos certos ou estamos errados, e de que os outros, que pensam diferente de nós, são nossos inimigos.
Rir dessas situações. Sim. O que mais nos “salva” nessas horas é a ironia e o humor.
Tudo bem. Há momentos em que temos que escolher entre A ou B, em vez de ficar em cima do muro. Mas no exercício do pensamento, da reflexão, deve haver mais de duas possibilidades.
O Mais importante é não abrir mão da dúvida, de desconfiar de nossas verdades “cômodas”. O pensamento científico, por exemplo, progride porque os cientistas desconfiam, duvidam e testam suas teorias e conhecimentos.

***
A conversa que tive com o adolescente voltou à lembrança nestes dias, com o atentado ao jornal francês. Um dos temas, de novo, é “liberdade de expressão”. O que podemos falar publicamente, assumindo o risco de sermos escolhidos como inimigos dessa ou daquela ideologia – inclusive inimigos da “palavra de Deus” (ou inimigos dos que acreditam e agem “em nome” de determinada divindade).
Parece que caminhamos pra tudo quanto é lado, inclusive para trás. Mas o pior é que aqueles que têm certeza de qual é o verdadeiro caminho a seguir, que nos leva “para frente”, são os fanáticos, e esses são os mais perigosos à vida, pois matam em nome de “verdades” para eles absolutas.

Rindo ou chorando, considero que vivemos numa época em que os passos da humanidade, diferente do andar do caranguejo, são absolutamente imprevisíveis.

sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

TIRADAS...



Somos todos bichinhos de estimação, demarcando territórios e acenando das vitrines e das sacadas dos prédios: 
- Ei, estou aqui! Olhem pra mim!.

(TIRADAS do Teco, o poeta sonhador)

quinta-feira, 8 de janeiro de 2015

Tirar o pé...



Quando confessou ao amigo de que cansou de sonhar, e de que agora vai ser mais realista, este respondeu-lhe:
- Pra caminhar tem que tirar o pé do chão!

Ovelha desgarrada

  Manhã de domingo, Beiço deu as caras: – Velho. Andei pensando. Está na hora do Cadelão parar de cair nas sarjetas próximas a bares para ...