quinta-feira, 18 de maio de 2017

Correção ortográfica


O gerente de vendas recebeu o seguinte fax de um dos seus novos vendedores:

Seo Gomis, o criente de belzonte pidiu mais cuatrucenta pessa. Faz favor toma as providenssa. Abrasso, Nirso

Aproximadamente uma hora depois recebeu outro.

Seo Gomis, Os relatorio di venda vai xega atrazado proque to fexando umas venda. Temo que manda treiz miu pessa. Amanha to xegando. Abrasso, Nirso
No dia seguinte:

Seo Gomis, num xeguei pucausa de que vendi maiz deis miu em Beraba. To indo pra Brazilha.

No outro:

Seo Gomis, Brazilha fexo 20 miu. Vo pra Frolinoplis e de lá pra Sum Paulo no vinhão das cete hora.

E assim foi o mês inteiro. O gerente, muito preocupado com a imagem da empresa, levou ao presidente as mensagens que recebeu do vendedor. O presidente, um homem muito preocupado com o desenvolvimento da empresa e com a cultura dos funcionários, escutou atentamente o gerente e disse: — Deixa comigo que eu tomarei as providências necessárias. E Tomou. Redigiu de próprio punho um aviso que afixou no mural da empresa, juntamente com os faxes do vendedor:

"A parti de oje nois tudo vamo fazê feito o Nirso. Si priocupá menos em iscrevê serto mod a vendê maiz. Acinado, O Prezidenti".


(Autoria desconhecida)

O escritor, uma lâmpada que ilumina a escuridão


No trecho abaixo Érico Veríssimo relata, em suas memórias, um episódio da adolescência que teve influência significativa em sua carreira de escritor.

Lembro-me de que certa noite - eu teria uns catorze anos, quando muito - encarregaram-me de segurar uma lâmpada elétrica à cabeceira da mesa de operações, enquanto um médico fazia os primeiros curativos num pobre-diabo que soldados da Polícia Municipal haviam "carneado". [...] Apesar do horror e da náusea, continuei firme onde estava, talvez pensando assim: se esse caboclo pode aguentar tudo isso sem gemer, por que não hei de poder ficar segurando esta lâmpada para ajudar o doutor a costurar esses talhos e salvar essa vida? [...] 

Desde que, adulto, comecei a escrever romances, tem-me animado até hoje a ideia de que o menos que o escritor pode fazer, numa época de atrocidades e injustiças como a nossa, é acender a sua lâmpada, fazer luz sobre a realidade de seu mundo, evitando que sobre ele caia a escuridão, propícia aos ladrões, aos assassinos e aos tiranos. Sim, segurar a lâmpada, a despeito da náusea e do horror. Se não tivermos uma lâmpada elétrica, acendamos o nosso toco de vela ou, em último caso, risquemos fósforos repetidamente, como um sinal de que não desertamos de nosso posto.

VERÍSSIMO, Érico. Solo de clarineta. Porto Alegre: Globo, 1978. V. 1. (Fragmento).

quarta-feira, 17 de maio de 2017

Por que existe briga de cão e gato - Luiz Antonio Aguiar


Contam as estrelas que assistiram a tudo, o vento, que corria por lá desde então, e o tempo, que nunca deixou de passar, que muito antigamente existiu uma floresta que era a floresta mais antiga do mundo, onde havia as árvores mais antigas do mundo, bisavós e tataravós de todas as árvores.
Nessa floresta havia um bando de animais. Justamente os animais mais inteligentes que já existiram neste planeta. Mas, naquela época, o que ainda não havia era o homem, no mundo. Corria sim uma profecia: "Mais cedo ou mais tarde, o homem iria surgir no planeta". E os animais estavam preocupados.
- Os humanos vão chegar e nos dominar! - alertou o Cão, um enorme cão negro, pai de todos os cães. - Vão nos fazer de escravos! Acabar com muitas das nossas espécies!
Um murmúrio alarmado  correu a assembleia dos animais, todos comentavam. Quando então o Gato veio dar sua opinião. Era um gato amarelo, imenso, pai de todos os gatos que viriam a existir.
- Eles vão derrubar as árvores, matar a floresta, sujar a água e o ar. Vão destruir a terra!
Desta vez, até as árvores se agitaram. Folhas e pequenos frutos caíram, como se já chorassem pela extinção de tantas vidas. Todo mundo concordava - era preciso fazer alguma coisa para evitar o cumprimento da profecia.
- Há uma maneira! - disse o cão preto, que era também, junto com o gato amarelo, o mais inteligente dos animais. - Já conversei com o Gato e ele concorda.
O pai de todos os gatos soltou um miado para confirmar as palavras do Cão:
- Sim, a profecia anuncia que poderemos impedir que o homem vire essa ameaça... É só não deixar que ele engula o ovo da inteligência.
- E onde está esse tal ovo? - perguntaram o Macaco e muitos outros mais.
- Precisamos procurar. Dizem que é só enxergar a luz que ele solta, e na hora iremos reconhecer. Daí, quem achar traz para cá, e ele ficará para sempre sob a guarda de todos os animais. Só assim salvaremos o planeta.
Ali, na frente dos outros, Cão e Gato trocaram um sorriso amigável, como se estivesse de acordo. Mas, a verdade é que cada qual por seu lado já tramava ficar com o ovo para si, e sozinho virar o rei dos animais.
Todos os bichos da mais antiga das florestas saíram à procura. Mas quem achou o tal ovo, num oco de árvore tão brilhante por dentro como se ali tivesse coisa do outro mundo - um daqueles pedaços de pedra que caem do céu - foi o Macaco. Logo se notava que aquele ovo tinha magia, tão estranho era, embora muito pequenino, quase do tamanho de um ovo de pomba selvagem.
Feliz da vida por acreditar que havia salvo o planeta, o bom Macaco correu para o lugar onde os animais se reuniam, levando o ovo. Quando chegou, lá estavam apenas o Cão e o Gato. Assim que viram o ovo, ambos pularam em cima do Macaco, gritando ao mesmo tempo:
- Eu vou guardar o ovo!
O Macaco, coitado, no meio daquela embolação, tentava proteger o ovo, enquanto por cima dele Cão e Gato brigavam ferozmente. Até que o Macaco soltou um guincho, e a luta parou, todos espantados. O Macaco começou a tossir, parecia sufocado, cada vez mais pálido.
- Ele engoliu o ovo! - ladrou o Cão.
- Mas que macacada! - roncou o Gato.
Muito assustado e confuso, sentindo coisas estranhas pelo corpo, o Macaco saltou em disparada, de cipó em cipó. Por muito tempo, não seria visto na floresta nem se ouviria falar dele outra vez. 
Cão e Gato sofreram diversos ferimentos. Um culpando o outro pelo desastre, ainda se engalfinharam algumas vezes. Cansados, enfim, se separaram, aos grunhidos de que um não perdoaria o outro. "Somo inimigos para sempre!" Só tinham um consolo. Para eles, ficaria tudo na mesma.
"Ora, ovo da inteligência...", resmungou consigo o Gato, "seria preciso uma dúzia deles para fazer esse Macaco emendar dois pensamentos corretamente".
E o Cão... "Que desperdício... O ovo da inteligência vai ficar com uma criatura que jamais vai tirar proveito do que ele pode dar!"
E assim as estrelas continuaram assistindo, o vento escutando, e o tempo a contar as histórias do mundo...

terça-feira, 16 de maio de 2017

Poetas de minha terra - Elisa Iv



Ainda jovem desenvolveu
Distúrbios de carinhos
Acabou internada entre braços e abraços
Dosada com beijos e caricias
Viciada em malicia
Coitada muito jovem teve seu primeiro surto
Saiu gritando pelas ruas, deem-me carinhos!
Me façam elogios
Se deitem comigo
Na metade da vida já não via mais saída
Foi trancada, envolvida
Na mais desgraçada clinica
Onde o chão é feito de camisas
Vestidos, corpos despidos
Sentidos jogados no piso!
O amor esse era o pior quarto
Um verdadeiro cubículo
Onde ela se esfregava, gritava
Respirava o medo
Uma doença que fazia com que ela passasse noites gemendo
Pobre mulher
Sedenta por cortejos
Sempre molhando seus dedos
Nas ruas das paixões era encontrada se lambendo
Uma vida de desespero
Ter sua mente tão vulnerável ao despejo
Sua cura ela imaginava ser o apego
Mas sua loucura era maior
Banhada pelo desejo
Não aguentava duas noites
Logo largava o tratamento
E se jogava no primeiro bueiro
Era tirada de la aos trapos
Enrolada em ramos de afetos
Despida por amores pornográficos
Com a boca cheia de silencio
E a mente perdida em devaneios
Pobre menina
Acabou a vida sendo amante das despedidas
Trancada na lucidez de amar sem saber amar a vida
Sua mente era capaz de aguentar uma companhia
Mas seu distúrbio por prazeres era muito valente
Suportava ser louca
Mas não suportava por muito tempo ser de outra pessoa
Seu fim foi exatamente assim
Sozinha entre paredes frias
Gritando por amores que ela mesmo sabia
Que depois de uma noite abandonaria.

O prazer de ouvir e contar histórias - Carlos Daitschman


A capital paranaense possui inúmeros contadores de histórias. Conheça um pouco dessa arte e também o trabalho de Carlos Daitschman, um dos pioneiros na retomada da arte de narrar, ouvir e dramatizar histórias na cidade.

“Era uma vez um homem que estava pescando, Maria. Até que apanhou um peixinho! Mas o peixinho era tão pequenininho e inocente, e tinha um azulado tão indescritível nas escamas, que o homem ficou com pena. E retirou cuidadosamente o anzol e pincelou com iodo a garganta do coitadinho. Depois guardou-o no bolso traseiro das calças, para que o animalzinho sarasse no quente. E desde então, ficaram inseparáveis. Aonde o homem ia, o peixinho o acompanhava, a trote, que nem um cachorrinho. Pelas calçadas. Pelos elevadores. Pelo café. Como era tocante vê-los no ‘17’! O homem, grave, de preto, com uma das mãos segurando a xícara de fumegante moca, com a outra lendo o jornal, com a outra fumando, com a outra cuidando do peixinho, enquanto este, silencioso e levemente melancólico, tomava laranjada por um canudinho especial… Ora, um dia o homem e o peixinho passeavam à margem do rio onde o segundo dos dois fora pescado. E eis que os olhos do primeiro se encheram de lágrimas. E disse o homem ao peixinho: ‘Não, não me assiste o direito de te guardar comigo. Por que roubar-te por mais tempo ao carinho do teu pai, da tua mãe, dos teus irmãozinhos, da tua tia solteira? Não, não e não! Volta para o seio da tua família. E viva eu cá na terra sempre triste!’ Dito isso, verteu copioso pranto e, desviando o rosto, atirou o peixinho n’água. E a água fez redemoinho, que foi depois serenando, serenando… até que o peixinho morreu afogado…”

O poema em prosa é do gaúcho Mario Quintana, chamado Velha História, publicado em 1976. É a primeira história de autor que o ator e contador de histórias Carlos Daitschman discursou profissionalmente, quando conseguiu que as pessoas imaginassem a literatura apenas ouvindo-o, sozinho, sem adereço ou objeto para efeito especial. Daitschman é um dos pioneiros da retomada da contação de histórias em Curitiba. Ele começou na década de 90 e hoje, além de trabalhar com grupos e comunidades através da Fundação Cultural de Curitiba, atua no projeto Curitiba Qual é a Sua, junto com Lúcia Sartori, que pretende conhecer as origens dos habitantes locais.
Daitschman é exemplo de como o gosto por literatura faz a diferença na vida das pessoas. Nascido em Curitiba em 1955, foi recém-nascido para Paranaguá e só voltou à capital para estudar, aos 14 anos. Veio morar com a avó, em uma casa antiga onde, por ser tímido, se escondia atrás dos livros. “Minha mãe diz que contava histórias para a gente dormir, mas não me recordo, tenho uma memória terrível de infância; mas sei que existiam livros na estante de casa ao meu alcance, assim como as enciclopédias Barsa e Larousse na mesa do meu pai”, conta. “Havia muito Monteiro Lobato, também A Sabedoria da Índia e da China, e quando já tinha lido todos peguei os de adultos, até um do Henry Miller que sumiu quando descobriram que eu estava lendo.”
O tempo passou, Daitschman pensou em fazer Engenharia Química, mas desistiu pela falta de aptidão com as ciências exatas, e acabou na faculdade de Psicologia. Na época, já possuía certa sensibilidade artística, pois participara de um Festival de Arte no Colégio Estadual, mas o despertar ocorreu quando cursou uma oficina ministrada por Antonio Carlos Kraide. Seguiu-se a carreira de ator e, em 1991, passou num concurso para a Fundação Cultural de Curitiba. Trabalhou em centros culturais da instituição e, em 1995, foi convidado a contar histórias nas bibliotecas. “Sai contando histórias para crianças, depois para adultos. Percebi rapidamente que não era uma brincadeira, que mexia profundamente com as pessoas. Quando fui a hospitais psiquiátricos, a pedido de ex-colegas de faculdade, começaram a acontecer coisas como, por exemplo, pacientes que não entravam em contato verbal começarem a contar histórias e cantar junto quando eu instigava. Então decidi estudar psicologia, antropologia, história das civilizações e hoje sei que não sei nada, mas estou em busca da história essencial, que é a história comum, de todos nós.”
Ele explica as diferenças entre o trabalho do contador e do ator. “O contador de histórias é uma espécie de ator, mas com o personagem você interpreta, tem que fazer o outro acreditar que é aquilo. Para mim, a grande diferença, e só fui descobrir muito depois que comecei, é que um contador nunca é maior que a história que ele conta.” A busca de Daitschman são as histórias populares (de lobisomem, boi tatá) que geralmente não estão escritas, mas fazem parte de tradições folclóricas. “Com o tempo percebi a importância de escutar e saber a história de cada indivíduo. Na verdade, colocamos as pessoas em papéis, só que elas são mais do que a gente define. Os problemas, as emoções, as paixões estão em todos os lugares. O que há são diferenças sociais, econômicas e culturais no sentido de educação formal. Mas posso afirmar que algumas pessoas que me ensinaram muito não sabem nem ler, nem escrever, pois quando você se abre para a escuta, cria-se um vínculo muito forte.” Nas narrativas escolhidas pelo artista, não existe moral pronta. “Não gosto de histórias como ‘era uma vez um menininho que não sabia dizer bom dia’, porque a criança já sabe onde vai dar. Não tenho nada a ensinar, só conto histórias que têm sentido para mim, pois se não há empatia não haverá verdade.”

Do site https://melissacrocetti.wordpress.com/2010/07/15/era-uma-vez/

O PATIFE tá enrolando de novo

Quando fui acertar a conta no bar, pendurada nos últimos dias, o bolicheiro não encontrou, no caderno, o meu nome. Ao repassar a longa l...