terça-feira, 11 de junho de 2013

ELE & ELA - Chacal




ela quer ir ao cinema
ele já viu esse filme
ela quer um vestidinho
ele o que vai por baixo

ela pensa no futuro
ele entoca o bagulho
ela acredita no amor
ele reclama do calor

ela descabela com o desprezo
ele se penteia com arrogância
ela diz que ele sonha acordado
ele sonha com ela no escuro

ela acha ele tarado
ele coloca ela de lado
ela diz que ele é um número
ele prefere ela de quatro

ela morre de ciúmes
ele não vê nenhum motivo
ela mostra a foto do flagrante
ele diz que com ele é semelhante

ela diz que corta os pulsos
ele apresenta uma gilete
ela chora
ele é duro


O amor acontece - Adriana Falcão



Alguém diz algo e o amor acontece.
Alguém diz um absurdo e o amor acontece.
Alguém não diz nada e o amor acontece.
Alguém toma uma atitude e o amor acontece.
Alguém canta o amor e ele acontece.
Ninguém esta esperando e o amor acontece.
Numa manhã meio nublada de uma data sem importância,
em pleno sol de domingo, no dia da padroeira,
embaixo de um temporal, em qualquer estação do ano,
não importa a ocasião, é no coração que o amor acontece.
Na plateia do cinema, acontece vez por outra: 
uma cena desperta uma emoção, que desperta outra,
que desperta outra, e lá vem o amor provar que 
"a vida é amiga da arte".
Após um beijo casual, no fim de uma noite que
parecia não ter futuro, duas mãos se entrelaçam com 
firmeza, e os corações se aquecem no aconchego
do amor que acontece.
Numa madrugada fria, debaixo de um cobertor,
acontece o amor.
Acontece com a pessoa certa ou com a pessoa errada,
será que o amor descre do erro? 
Acontece de acontecer de um lado só, provocando
 dor, mas se acontece de 
dois lados, como pode ser tão bom? 
Acontece de várias formas,
sejá em encontro escondido, seja em jantar esporádico, seja
em vestido de noiva, seja em casa separadas, seja em
cidades distantes, e às vezes se transforma, modificando crenças
e planos. 
Seja como for, assim penso, vale a peno comemorar o acontecido.
Acontece de durar um dia, uma noite, uma semana,
um mês, um ano, uma década, uma vida, sem certificado de garantia, nem
 prazo de validade, ele e seus perigos, como um equilibrista no frio.
de repente, muitas vezes, o amor vai e desacontece sem que ninguém 
saiba o motivo, mas isso já é uma outra história.


Inspirado na crônica O amor acaba, de Paulo Mendes Campos.

Inspirado na crônica "o amor acaba".
Inspirado na crônica O amor acaba, de Paulo Mendes Campos.

segunda-feira, 10 de junho de 2013

O amor acaba - Paulo Mendes Campos

"O amor acaba. Numa esquina, por exemplo, num domingo de lua nova, depois de teatro e silêncio; acaba em cafés engordurados, diferentes dos parques de ouro onde começou a pulsar; de repente, ao meio do cigarro que ele atira de raiva contra um automóvel ou que ela esmaga no cinzeiro repleto, polvilhando de cinzas o escarlate das unhas; na acidez da aurora tropical, depois duma noite votada à alegria póstuma, que não veio; e acaba o amor no desenlace das mãos no cinema, como tentáculos saciados, e elas se movimentam no escuro como dois polvos de solidão; como se as mãos soubessem antes que o amor tinha acabado; na insônia dos braços luminosos do relógio; e acaba o amor nas sorveterias diante do colorido iceberg, entre frisos de alumínio e espelhos monótonos; e no olhar do cavaleiro errante que passou pela pensão; às vezes acaba o amor nos braços torturados de Jesus, filho crucificado de todas as mulheres; mecanicamente, no elevador, como se lhe faltasse energia; no andar diferente da irmã dentro de casa o amor pode acabar; na epifania da pretensão ridícula dos bigodes; nas ligas, nas cintas, nos brincos e nas silabadas femininas; quando a alma se habitua às províncias empoeiradas da Ásia, onde o amor pode ser outra coisa, o amor pode acabar; na compulsão da simplicidade simplesmente; no sábado, depois de três goles mornos de gim à beira da piscina; no filho tantas vezes semeado, às vezes vingado por alguns dias, mas que não floresceu, abrindo parágrafos de ódio inexplicável entre o pólen e o gineceu de duas flores; em apartamentos refrigerados, atapetados, aturdidos de delicadezas, onde há mais encanto que desejo; e o amor acaba na poeira que vertem os crepúsculos, caindo imperceptível no beijo de ir e vir; em salas esmaltadas com sangue, suor e desespero; nos roteiros do tédio para o tédio, na barca, no trem, no ônibus, ida e volta de nada para nada; em cavernas de sala e quarto conjugados o amor se eriça e acaba; no inferno o amor não começa; na usura o amor se dissolve; em Brasília o amor pode virar pó; no Rio, frivolidade; em Belo Horizonte, remorso; em São Paulo, dinheiro; uma carta que chegou depois, o amor acaba; uma carta que chegou antes, e o amor acaba; na descontrolada fantasia da libido; às vezes acaba na mesma música que começou, com o mesmo drinque, diante dos mesmos cisnes; e muitas vezes acaba em ouro e diamante, dispersado entre astros; e acaba nas encruzilhadas de Paris, Londres, Nova Iorque; no coração que se dilata e quebra, e o médico sentencia imprestável para o amor; e acaba no longo périplo, tocando em todos os portos, até se desfazer em mares gelados; e acaba depois que se viu a bruma que veste o mundo; na janela que se abre, na janela que se fecha; às vezes não acaba e é simplesmente esquecido como um espelho de bolsa, que continua reverberando sem razão até que alguém, humilde, o carregue consigo; às vezes o amor acaba como se fora melhor nunca ter existido; mas pode acabar com doçura e esperança; uma palavra, muda ou articulada, e acaba o amor; na verdade; o álcool; de manhã, de tarde, de noite; na floração excessiva da primavera; no abuso do verão; na dissonância do outono; no conforto do inverno; em todos os lugares o amor acaba; a qualquer hora o amor acaba; por qualquer motivo o amor acaba; para recomeçar em todos os lugares e a qualquer minuto o amor acaba. "

http://www.youtube.com/watch?v=xLcjXpy5exE

quarta-feira, 5 de junho de 2013

Como era bom - Chacal


O tempo em que Marx explicava o mundo
tudo era luta de classes
como era simples
o tempo em Freud explicava
que édipo era tudo explicava
tudo era clarinho limpinho explicadinho
tudo muito mais asséptico
do que era quando eu nasci
hoje rodado sambado pirado
descobri que é preciso
aprender a nascer todo dia. 

segunda-feira, 3 de junho de 2013

Quero que você me locuplete

Não vi seus olhos ao vivo. Pelas fotos no facebook, eles são azuis. Nada de verdes ou escuros, tímidos de esperança.
Olhos lindos, sem a sombra dos óculos, rosto próximo à lente da máquina fotográfica, prenunciando desejos.
Não segurei suas mãos, nem beijei seus lábios. Quando o paraíso me acolher, o suor vai verter das mãos, meu rosto queimará, se avolumará meu sexo.
Não a vi na rua, indo e vindo. Com mochila, sandálias, óculos de sol. Nem a vi em casa, a se contemplar no espelho. Não vi a cor do seu batom, nem sei de tatuagens e detalhes dos cabelos.
Sei que, se puder, beijarei cada centímetro de sua pele, teus pensamentos vão relaxar no meu peito, para ditar o ritmo do meu coração.
De você, tenho apenas o que imagino.
Segurar suas mãos, beijar pescoço, boca, orelhas, morder seus lábios.
O imaginário antecipa a realidade, para o bem de minha felicidade.
Mãos dadas, passear em parques, praias, cidades distantes. Aventureiros, bem-comportados, no cinema, quermesse, na reunião com os amigos.
Na hora de dormir, em silêncio, refaço as teorias sobre o amor, como a antecipar o que sufoca minha paixão. São amores afobados para roubar a cena, como a roseira que aguarda a primavera.
Amor inesperado e desconhecido.
Amor possível e adoidado.
Amor platônico.
Amor tão tão...
Resumindo:
Quero saber tudo dos seus medos, planos, sonhos, adiados ou refeitos.
Quero tudo aquilo que a um apaixonado compete.
Para que você, inteirinha, me sacuda, desentorte e locuplete!

O crepúsculo de Van Gogh

As nuvens eram criaturas selvagens e ‒ ao mesmo tempo ‒ gatos, cães, jacarés e lagartos, perfilados no horizonte próximo. piscaram...