sábado, 4 de maio de 2013

Musa




Este poema nasceu de um diálogo no facebook, quando a Sabrina Bertollo postou esta foto no seu perfil. Na ocasião eu disse a ela que seu olhar de MUSA não permitia que silenciasse o "poeta" que vos fala. Então a Sabrina desafiou-me a escrever um poema. Eu, sem vacilar, aceitei a doce "tarefa". Com a permissão da Sabrina para que o publique, aí vai o resultado de minha inspiração.


MEU AMOR

O meu amor
é meteoro 
desgovernado.

É que teu olhar
caleidoscópio
pinga estrelas
nos meus olhos.

Minha paixão
é universo em expansão!
 

terça-feira, 30 de abril de 2013

Feito à mão - Lygia Bojunga

Eu sempre usei livro pra tudo: pra saber ler, pra altear pé de mesa, pra aprender a usar a imaginação, pra enfeitar sala quarto a casa toda, pra ter companhia dia e noite, pra aprender a escrever, pra sentar em cima, pra rir, pra gostar de pensar, pra ter apoio num papo, pra matar pernilongo, pra travesseiro, pra chorar de emoção, pra firmar prateleira, pra jogar na cabeça do outro na hora da raiva, pra me-abraçar-com, pra banquinho do pé, eu sempre usei livro pra tanta coisa, que a coisa que mais me espanta é ver gente vivendo sem livro.

Do livro, Feito à mão. Editora AGIR, 1999.

quarta-feira, 24 de abril de 2013

A paixão de Lúcia Helena - Raul Drewnick



A moça fala, fala não para de falar. A mãe que prepara o almoço mais sorri do que responde. Não precisa ficar atenta para saber o que aconteceu. Os adjetivos, os verbos e os advérbios que a filha usa dizem muito. Mas o seu jeito de suspirar fundo diz muito mais. Ela esta de novo apaixonada. E, como em todas as outras vezes, pré-di-da-mente. É o  que ela diz, enquanto a mãe, sempre sorrindo, fiscaliza o arroz, vira os bifes na frigideira, começa a lavar a alface.
- Mãe, a senhora precisava ver como ele é lindo. Só de olhar para a carinha dele dá vontade de ...hum...abraçar aquela belezura e ficar beijando, beijando. Ah...
A mãe tira a panela de arroz de fogo, dá mais uma virada nos bifes. E a filha ali, falando, falando.
E os olhos dele mãe! Os olhos! Ah... Nem sei como não desmaio quando ele olha pra mim. E como ele olha pra mim! Todo dia, é só eu pôr o pé fora do colégio e chegar à esquina, quem esta sempre lá no ponto de ônibus, me esperando, com aqueles olhos?
A mãe já pôs o arroz e um bife no prato da filha e, e enquanto acaba de temperar a salada, continua sorrindo e ouvindo o que ela diz.
- lembra do Tino, mãe? Claro que você lembra. Aquele. Agente ainda morava lá na outra casa. Então. Este é ainda mais lindo que o Tino. Só que é tímido. Quando eu saio da aula, ele pensa que eu não reparo mas ele vai cortando caminho pelo jardim do colégio e, na hora em que eu chego ao ponto de ônibus lá está ele, o bandido, encostado no muro, me olhando com aqueles olhos. Mas hoje, mãe, se ele não tomar a iniciativa, eu tomo. Juro que tomo. Ou não me chamo mais Lúcia Helena.
A mãe pergunta se a filha não quer salada e ela, finalmente mudando de assunto, diz que não, porque esta a-tra-as-dis-si-ma. Precisa escovar os dentes e ir embora, senão perde a primeira aula.
Quando Lúcia Helena sai, a mãe balança a cabeça. Será que tudo vai começara de novo? E lembra-se das paixões da filha: o Tino, o Thomas, o Tim, o Turquinho. Para quem não chegou ainda aos 16 anos, é uma coleção! Enquanto lava a louça, fica assim, pensando em como se apaixona fácil a sua menina. Depois se condiciona a esquecer tudo aquilo. Lava o chão da cozinha, limpa o fogão, passa o aspirador na sala espana os móveis e quando olha para o relógio, leva um susto. São 6 horas e Lucia Helena, que sempre esta de volta às 5, ainda não chegou. A pobre mãe passa rapidamente de inquieta  a preocupada, de preocupada a aflita e já esta quase desesperada quando afinal ouve a porta se abrir:
-Menina você quer me deixar louca? Isso é hora de chegar? O que aconteceu? Você esqueceu de levar o passe do ônibus?
Lucia Helena entrando na sala responde:
- e a senhora acha que iam me deixar viajar no ônibus com essa fofura ? olha, mãe ele não e mesmo lindo? Agora precisamos tomar cuidado para ele não fugir, como o Tino e o Thomas, nem se atropelado como o Tim e o Turquinho. Ele vai se chamar Tontinho. É um bom nome. A senhora já viu um gatão mais bobinho do que este?
A mãe se aproxima e vê, logo no primeiro exame, que o gato e lindo, mas não pode chamar Tontinho. Tem de ser Tontinha. Como a filha.

terça-feira, 23 de abril de 2013

Conversa de pai pra filha - Antonio Maria



- Pai, eu tenho um namorado.
Pai, que ouve isso da filha mocinha, pela primeira vez, sente uma dor muito grande. Todo sangue lhe sobe à cabeça, e o chão do mundo roda sob seus pés. Ele pensava, até então, que só a filha dos outros tinha namorado. A sua tem, também. Um namorado presunçosamente homem, sem coração e sem ternura. Um rapazola, banal, que dominará sua filha. Que a beijará no cinema e lhe sentirá o corpo, no enleio da dança. Que lhe fará ciúmes de lágrimas e revolta; pior ainda, de submissão, enganando-a com outras mocinhas. Que, quando sentir os seus ciúmes, com toda certeza, lhe dirá o nome feio e, possivelmente, lhe torcerá o braço. E ela chorará, porque o braço lhe doerá. Mas ela o perdoará no mesmo momento ou, quem sabe, não chegará, sequer, a odiá-lo. E lhe dirá, com o braço doendo ainda: "Gosto de você, mais que de tudo, só de você." Mais que de tudo e mais que dele, o pai, que nunca lhe torceu o braço. Só de você é não gostar dele, o pai. E pensará, o pai, que esse porcaria de rapaz fará a filha mocinha beber whisky, e ela, que é mocinha, ficará tonta, com o estômago às voltas. Mas terá que sorrir. E tudo o que conseguir dela será, somente, para contar aos amigos, com quem permuta as gabolices sobre suas namoradas. Ah! O pai se toma da imensa vontade de abraçar-se à filha mocinha e pedir-lhe que não seja de ninguém. De abraçá-la e rogar a Deus que os mate, aos dois, assim, abraçados, ali mesmo, antes que torça o bracinho da filha. Como é absurda e egoisticamente irracional amor de pai! Mais que ódio de fera. Ele sabe disso e se sente um coitado. Embora sem evitar que todos esses medos, iras e zelos passem por sua cabeça, tem que saber que sua filha é igual à filha dos outros; e, como a filha dos outros, será beijada na boca. Ele, o pai, beijou a filha dos outros. Disse-lhe, com ciúme, o nome feio. E torceu-lhe o braço, até doer. Nunca pensou que sua namorada fosse filha de ninguém. Ele, o pai, humanamente lamentável, lamentavelmente humano. Ele, o pai, tem, agora, que olhar a filha com o maior de todos os carinhos e sorrir-lhe um sorriso completo de bem-querer, para que ela, em nenhum momento, sinta que está sendo perdoada. Protegida, sim. Amada, muito mais. E, quando ela repetir que tem um namorado, dizer-lhe apenas:
- Queira bem a ele, minha filha.

segunda-feira, 22 de abril de 2013

O inferno são os outros


Vejam, até o mamão, de que gosto muito, vem com selo!
Igual qualquer outro produto, carimbado, mamão com chip, com dono, mamão vigiado.
Inocentemente nos cercamos de marcas, câmeras...
"Eu etiqueta", denunciou num poema o Drummond.
Por onde andei nos últimos dias... basta rastrear as câmeras discretamente instaladas nos caminhos onde passo, ou rastrear as ligações do meu celular.
Nesse, meus contatos dão a mostra de minhas intenções (boas e más, as que serão analisadas por Jesus e festejadas pelo demônio, é o que diz o pastor da igreja mais próxima), tudo o que tramei e o que imaginei, se ainda consigo imaginar.
Como somos inocentes em nossa romaria a caminho do matadouro...
E eu saio a vagar por aí, e também me vigio. Sem querer me ponho a pensar sobre como deve ser o paraíso. Porém, o que é o paraíso só o posso saber pela minha imaginação. Assim, ele é a extensão do que eu gostaria que minha vida fosse aqui, nesse espaço/tempo finito. Muitos amigos, muitas histórias, alegria, fartura, solidariedade, muita informação, conhecimento, cultura e arte.
Cabeça no céu, naquilo que ainda não foi, acabo fugindo desse mundo aqui, agora. Não contribuo em nada para dar um norte a essa sociedade, de que participo.
Mamão com selo. E código de barras. E destino selado. E maturação forçada. E precoce. E fora de época...
Ele não sabe, e nós também, que rapidamente esquecemos, que o que vale é o aqui e agora. E que se não fizermos nada, vamos passar em branco, não vamos fazer história.
Ao mamão, pouco importa. Não, para mim. Penso nisso e me deprimo.
Sou carimbado, vigiado, e me conformo em ficar de braços cruzados.
Ah, sempre esperto para apontar um culpado, e dizer, com Sartre, que o inferno são os outros.

O crepúsculo de Van Gogh

As nuvens eram criaturas selvagens e ‒ ao mesmo tempo ‒ gatos, cães, jacarés e lagartos, perfilados no horizonte próximo. piscaram...